PSD-Açores pede “coragem” aos açorianos para não terem “medo da mudança”

O PSD açoriano apresentou o programa de governo tendo em vista as eleições regionais de 25 de Outubro. Partido propõe descentralização de competências e redução de impostos para acabar com 24 anos de governação do PS.

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Comício do PSD-Açores no Coliseu Micaelense em 2016 Rui Soares (colaborador)

À entrada, além da medição da temperatura corporal, as funcionárias do Coliseu Micaelense oferecem um pequeno frasco de desinfectante com a palavra “confiança”. Um sinal do que vem a seguir. Confiança: a palavra que serve de slogan de campanha ao PSD-Açores para as próximas eleições regionais de 25 de Outubro. A palavra repetida até à exaustão pelo líder do partido, José Manuel Bolieiro, no discurso de apresentação do programa de governo do PSD dos Açores.

24 anos é muito tempo”, diz José Manuel Bolieiro, quando chega a sua vez de falar, depois do discurso de Luís Maurício, mandatário regional, actual líder parlamentar na Assembleia Regional. Importa que o nosso povo transforme o medo da mudança em coragem e ousadia pelos Açores do futuro”, afirma. Ouvem-se os primeiros aplausos. “Nada do que está bem será abandonado, nem ninguém responsável pelo que está bem será dispensado”, continua.

Ao longo de uma hora, o quarto presidente do PSD-Açores em oito anos realça que o “superior interesse da região” deve ficar “muito acima” da “conservação partidária do poder”. Critica a governação socialista, que não trouxe “bons resultados” e diz que os açorianos não se podem conformar “com as realidades que as estatísticas objectivas e independentes evidenciam no presente”. Em seguida, apresenta os números: os açorianos vivem em média menos três anos que a média nacional (77,3 para 80,6); uma habitação na região vale menos 146 euros por m2 (1046 euros para 1192) do que a média nacional; e existem dez beneficiários do rendimento social de inserção (RSI) por cada 100 residentes nos Açores. “O mesmo caminho para as mesmas opções produz sempre os mesmos resultados”, desabafa.

O palco é o Coliseu Micaelense, em Ponta Delgada. Em pleno período eleitoral, aquela que é a maior sala de espectáculos dos Açores costuma inundar-se de militantes sociais-democratas, de bandeira laranja erguida e a entoar ao alto o nome do partido. Mas, em 2020, o habitual molda-se à pandemia da covid-19.

Longe do milhar de pessoas que enchiam o coliseu noutros tempos, este ano, 110 militantes sociais-democratas (separados duas cadeiras entre si) acorreram à apresentação das propostas do partido para acabar com duas dúzias de anos de governação do PS - de 1996 a 2012 com Carlos César e actualmente com Vasco Cordeiro. Entre os militantes está Mota Amaral, o último presidente do PSD a ganhar eleições regionais. Desde 1996 que o partido só soma derrotas nas eleições açorianas.

Menos Governo “em tudo”

Antes de Bolieiro subir ao placo, falou Luís Maurício, mandatário regional e actual líder parlamentar na Assembleia Regional, para evocar as “provas dadas” de Bolieiro enquanto antigo presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada e defender que “24 anos de governação é uma eternidade em democracia”. 

Só depois o líder social-democrata açoriano apresentou as propostas do partido. A agenda de governação do PSD-Açores para os próximos 10 anos (2020-2030) é norteada por dois grandes motes: desgovernamentalizar e descentralizar. O partido quer retirar competências que estão actualmente na esfera do Governo Regional e atribuir independência às várias entidades sectoriais.

A Autoridade de Saúde Regional (ASR) é um dos exemplos destacados pelo programa ‘laranja’. Segundo o partido, para que a autoridade seja “verdadeiramente independente”, o responsável pelo organismo “não deve integrar a estrutura do governo regional”. Hoje, o responsável da Autoridade de Saúde Regional é por inerência o director regional da Saúde. E o responsável actual pela ASR, Tiago Lopes, é candidato a deputado pelo PS às próximas eleições regionais.

O PSD-Açores quer também a independência do Serviço Regional de Estatística e do Observatório Independente do emprego e formação profissional, órgãos que actualmente estão sob a competência da vice-presidência do executivo. No documento, lê-se que os sociais-democratas pretendem a “profissionalização” do Conselho Económico e Social (criado em 2018) e a criação de uma “comissão de recrutamento e selecção para a administração pública regional” e de uma “entidade gestora do doente em espera” para “garantir o cumprimento” dos tempos máximos de resposta garantidos. “Planear o futuro não se deve fazer pela contínua e excessiva governamentalização em tudo”, destacou Bolieiro.

Além da independência das entidades, a desgovernamentalização proposta pelo PSD passa também por “orientar mais fundos europeus para as pequenas e médias empresas” (que “asseguram 70% do emprego e recebem 20% dos fundos”) e por “aumentar de forma exponencial” a relação entre o poder regional o local através de um “regime de cooperação financeira transparente”. O programa eleitoral do partido quer que os Açores sejam o “primeiro smart arquipélago do mundo”, através da “digitalização de todos os serviços públicos utilizados por cidadãos e empresas nos Açores”.

Bolieiro apontou como objectivo a criação de um “novo enquadramento legislativo de apoio financeiro” para a comunicação social. O PSD-Açores pretende um milhão de euros anuais para a comunicação social privada e uma verba “nunca inferior a 15%” à atribuída à privada para a pública (RTP-Açores).

Estes apoios são uma das quatro “opções reformistas e disruptivas” que abrem o programa político do partido. As outras são: a criação de uma tarifa para fixar em 60 euros o tecto máximo para as passagens aéreas inter-ilhas para residentes (que actualmente custam entre os 80 e os 120 euros); a “redução máxima” do “legalmente admitido” do IVA e do IRC e do IRS para as “famílias” nos “escalões ainda excluídos”; e a promoção do “coaching educativo” nas escolas do arquipélago, onde a taxa de abandono escolar é mais do dobro da média nacional (27%).

PSD-Açores quer também a criação de um “círculo eleitoral próprio para o Parlamento Europeu”, lembrando que actualmente a região não tem nenhum representante europeu – o nome indicado pelos sociais-democratas açorianos, Mota Amaral, só aceitou ir em lugar elegível e André Bradford, eleito pelo PS, faleceu em 2019.

A agenda social-democrata refere ainda que a transportadora aérea SATA deve ser “financeiramente resgatada” e deve contar com uma “gestão profissionalizada”. “Este é o exemplo de alternativa política. Estamos para propor e fazer. O nosso lema não é o do mero protesto, é sim o de realizar”, disse José Manuel Bolieiro no encerramento do discurso. A decisão caberá aos açorianos dentro de menos de um mês.

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