BE pergunta ao Governo se admite alterar legislação para permitir ampliação de pedreira na Arrábida

A possibilidade de as pedreiras no Parque Natural da Arrábida virem a ser aumentadas, em área, suscitou diversas críticas. ICNF confirma que no actual plano de ordenamento do parque “não há enquadramento” para tal ampliação.

A Secil é "uma ferida" na paisagem da Arrábida, diz Francisco Ferreira da Zero
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A Secil é "uma ferida" na paisagem da Arrábida, diz Francisco Ferreira da Zero Daniel Rocha
A cimenteira explora duas pedreiras no parque natural
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A cimenteira explora duas pedreiras no parque natural Daniel Rocha

O Bloco de Esquerda enviou cinco perguntas ao Ministério do Ambiente e Acção Climática (MAAC) sobre a possibilidade, avançada pelo PÚBLICO, de a Secil tentar aumentar a área de exploração das duas pedreiras que detém no Parque Natural da Arrábida. “O Governo considera a possibilidade de ser alterada a classificação do regime de protecção da área envolvente às pedreiras, para que a área de exploração destas possa ser ampliada?” é uma delas. O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) já veio clarificar que no Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (POPNA) “não há enquadramento” para tal expansão.

Conforme o PÚBLICO revelou esta quarta-feira, a Secil tem um curso um estudo para “a alteração da exploração da pedreira [duas contíguas]” que detém na zona protegida. Apesar de fonte da empresa não se comprometer com a dimensão da ampliação prevista, dizendo mesmo que, no final do estudo, até se pode concluir por uma “redução da área” explorada, a verdade é que, conforme confirmou ao PÚBLICO a Câmara de Setúbal, a empresa está a considerar expandir a área de pedreira para lá dos limites que hoje existem. “A Câmara Municipal de Setúbal tem conhecimento da intenção da Secil de ampliar a área de exploração de pedreiras. Segundo informação da empresa, sabe também que está em curso a realização do estudo de impacto ambiental para o efeito”, explicou, por escrito, fonte do gabinete da presidência, adiantando ainda que tanto o POPNA como o Plano Director Municipal “não consideram o licenciamento de novas explorações de recursos geológicos e/ou a ampliação das existentes no Parque Natural da Arrábida.”

De facto, no artigo 8.º do POPNA, refere-se que está “interdita” a “instalação de novas explorações de recursos geológicos, nomeadamente pedreiras, e a ampliação das existentes por aumento de área licenciada”. Isso mesmo vem agora também relembrar o ICNF, que em resposta enviada esta quinta-feira ao PÚBLICO refere que “não existe actualmente nenhum pedido formal de ampliação das pedreiras existentes, por aumento de área licenciada nestes serviços”, acrescentando que no plano aprovado por resolução do Conselho de Ministros de 23 de Agosto de 2005 “não há enquadramento” para tal alargamento. 

Uma das perguntas que o BE fez chegar ao ministério de João Pedro Matos Fernandes é, precisamente, se o Governo “tem conhecimento da intenção da empresa Secil de ampliar as pedreiras que detém no Parque Natural da Arrábida”. Não se sabe qual será a resposta do MAAC, mas a informação que fonte oficial da Secil prestara ao PÚBLICO é que o processo está ainda muito no início, mas que já “foram encetados contactos preliminares com diversas entidades, nos quais foram apresentadas as linhas gerais do projecto e dos objectivos a atingir”. 

Pedidos formais, conforme refere o ICNF, é que ainda não aconteceram. Também a Direcção-Geral  da Energia e da Geologia esclareceu, já depois de publicada a notícia de quarta-feira, que “a empresa Secil não apresentou, até à data, pedido de licenciamento de ampliação da área de exploração das pedreiras n.ºs 431 Vale de Mós A e 432 Vale de Mós B, em Outão.” Os estudos que definirão a proposta final da Secil, acrescentou a mesma fonte da empresa, ainda devem demorar pelo menos seis meses.

Mas as críticas à possibilidade de a Secil ocupar ainda mais espaço no parque natural não ficaram à espera. O BE defende mesmo que a Secil deve sair do Outão e pergunta ao MAAC se “o Governo considera a possibilidade de encetar diligências no sentido de desmoralizar a indústria cimenteira” da Arrábida, defendendo que a sua presença no parque natural “tem alterado profundamente a paisagem, abrindo crateras enormes e fragmentando os habitats” e pondo “em risco a estrutura e a estabilidade geológica das arribas e das zonas de interesse espeleológico”, entre outros aspectos. 

Também a Zero, que pela voz do seu presidente, Francisco Ferreira, já tinha considerado que a possibilidade de uma ampliação da área das pedreiras da Secil na Arrábida era “demasiado dramática” e que a empresa constitui “uma ferida” na paisagem, veio lembrar, em comunicado, que a cimenteira só existe naquele lugar porque a sua presença (há uma fábrica de cimento em Outão desde 1904) é muito anterior à criação do PNA, em 1976, e que com os níveis de protecção actual jamais seria permitida.  

A associação ambientalista recorda que já foi surpreendente que, em 2007, a Secil tenha conseguido uma licença para explorar as pedreiras numa cota mais profunda do que estava então estabelecido (até 40 metros acima do nível do mar), o que permitiu estimar que a longevidade da extracção se prolongaria para lá de 2040. E, apesar de reconhecer “o enorme esforço de recuperação paisagística” que a cimenteira tem feito no PNA, insta o MAAC a pôr “imediatamente de parte” o que diz ser uma “ameaça que parece assim existir sobre a Serra da Arrábida”.

A Secil disse ao PÚBLICO que decidiu avançar com os estudos em curso por estar a trabalhar “com um plano de pedreira naturalmente datado e que não incorpora o conhecimento actual”. A mesma fonte garantiu: “Temos em curso um estudo de alteração da exploração da pedreira que visa melhorar a configuração final desse espaço, mantendo e incrementando a biodiversidade e o chamado serviço dos ecossistemas. A Secil está empenhada em conceber uma solução que possa beneficiar o plano de exploração actual com menor impacto ambiental, e também assegurar uma configuração final da pedreira que viabilize a melhor utilização dos recursos geológicos e diminua o impacto ambiental global da sua actividade industrial.”

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