Educadoras de Serralves explicaram no Parlamento por que reivindicam contratos de trabalho

Técnicos externos da fundação associaram-se às críticas dos educadores de arte. A administração e a Autoridade para as Condições do Trabalho vão ser ouvidas no próximo dia 29.

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Teresa Pacheco Miranda

Três educadoras de Serralves, representando 23 elementos do departamento de Artes do serviço educativo, foram esta quarta-feira de manhã ao Parlamento acusar a fundação portuense de manter na situação de falsos recibos verdes trabalhadores que asseguram, em alguns casos há décadas, uma função permanente e indispensável,  e lamentaram ainda que a administração esteja a promover entrevistas para contratar novos educadores, quando tem 23 em casa “à espera de serem chamados”.

Além destas três educadoras de Artes – Patrícia do Vale, Inês Soares e Raquel Sambado –, que foram ouvidas presencialmente numa audição conjunta das comissões de Cultura e do Trabalho e Segurança Social, pedida pelo BE, interveio ainda por teleconferência um técnico de museografia de Serralves, Ricardo Dias, que falou em nome de vários trabalhadores de diferentes especialidades, num sinal de que este movimento reivindicativo pelo reconhecimento de contratos de trabalho já não se restringe ao serviço educativo.

Estava previsto que a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), que tem neste momento um processo inspectivo a decorrer em Serralves, fosse também ouvida esta quarta-feira, mas a sua audição foi adiada para o próximo dia 29, quando deverá ser também ouvida a administração presidida por Ana Pinho.

A ausência da ACT permitiu aos deputados João Almeida, do CDS, e Germana Rocha, do PSD, recordar que a única posição oficial até agora assumida por aquele organismo sustenta não existirem indícios de situações de irregularidade laboral. Estes dois deputados convergiram ainda na tese de que a coincidência destas denúncias com a situação de pandemia poderia indicar que o que estava em causa não seriam efectivas ilegalidades, e que a quebra de rendimentos destes colaboradores durante o período de inactividade da fundação poderia ser atenuada com a revisão dos apoios excepcionais que o Governo já vem concedendo. 

A 30 de Junho, recorde-se, a ministra da Cultura garantiu no Parlamento que a ACT não apurara quaisquer indícios de falsos recibos verdes em Serralves. Tornou-se então público que decorrera uma acção inspectiva ainda em Abril, e que no início de Maio, sem ouvir qualquer dos trabalhadores cujo vínculo laboral pudesse ser questionável, a ACT concluíra não existirem razões para posteriores procedimentos. Uma actuação que parece contrastar com a que foi seguida na Casa da Música, quando a ACT já assumia publicamente que havia indícios de irregularidades ainda antes de serem tornadas públicas quaisquer conclusões oficiais.

As educadoras que intervieram na audição parlamentar desta quarta-feira congratularam-se pelo facto de a ACT ter mesmo acabado por desencadear uma nova acção inspectiva, e ter já ouvido, desde Julho até hoje, não apenas todos os educadores de arte de Serralves, mas também vários que entretanto abandonaram a equipa. Mas frisam que não entregaram qualquer queixa na ACT e que esta terá reagido às denúncias públicas.

Enquanto se aguarda a audição da ACT, as educadoras expuseram aos deputados as razões pelas quais consideram que a relação laboral que mantêm com Serralves corresponde à generalidade dos critérios que indiciam um contrato de trabalho. Desde logo respondem perante uma hierarquia, no caso a coordenadora do serviço educativo para as Artes, que compõe com uma administrativa e uma produtora todo o quadro de pessoal daquele serviço – todos os restantes 25 elementos da equipa têm vínculos precários. Todos são também obrigados a assegurar que estão disponíveis para trabalhar em Serralves pelo menos três dias por semana, ou um conjunto de seis manhãs ou tardes, e só mediante autorização podem alterar esta agenda, que no entanto não lhes dá garantias de que sejam efectivamente chamados. E só recebem por horas de trabalho presencial.  O facto de trabalharem nas instalações de Serralves, de usarem equipamento da fundação e ostentarem uma identificação com o seu nome e função são outros argumentos avançados pelas educadoras.

Um cenário confirmado pelo técnico de museografia Ricardo Dias, que leu um texto subscrito por cerca de uma dezena de técnicos externos de Serralves cujos nomes enumerou no final. “Trabalhamos em todas as exposições, no Museu, na Casa de Serralves, na Casa Manoel de Oliveira, e até em exposições itinerantes fora de Serralves”, argumentou. “Estamos subordinados a uma chefia, temos um horário das 9h30 às 17h30 controlado por um cartão de funcionário, conduzimos carros de Serralves, temos funções de representação da instituição, mas nunca nos foi proposto nenhum tipo de contrato”, acrescentou.

Na sua última intervenção, a educadora Raquel Sambado lembrou que se tinham passado dois anos desde que o ex-director artístico João Ribas deixara Serralves “fazendo sérias acusações de censura e ingerência da administração” e sugeriu que “o clima de medo que então se vivia na instituição, e que foi amplamente noticiado” ainda subsiste e ajuda a explicar que os trabalhadores externos de Serralves estejam “sozinhos nesta luta”, mesmo que saibam, a título privado, como também afirmou, que contam com o apoio de muitos funcionários do quadro.  

O PÚBLICO tentou ouvir a administração de Serralves, que não quis fazer comentários e confirmou apenas que estará presente na audição parlamentar marcada para o próximo dia 29. 

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