Dia 103: Mães que ficam em casa vs Mães que “trabalham”

Nesta altura começam as batalhas dissimuladas, ou não, sobre as mães que ficam em casa vs as mães que “trabalham”. Porque é que temos esta necessidade? Para nos sentirmos melhor com as nossas escolhas?

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Mãe,

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O ano lectivo ainda mal começou e já estou cansada de tudo o que tenho de gerir!

Para piorar a situação sinto sempre que nesta altura começam as batalhas dissimuladas, ou não, sobre as mães que ficam em casa vs as mães que “trabalham”! Categorias que, além do mais, vão agora precisar de uma adenda, já que o empreendedorismo e a covid trouxeram uma nova categoria de “trabalhar para fora, mas de casa” que se por vezes une o melhor dos dois mundos, noutras acumula desafios que nunca se imaginaram tão difíceis.

Apesar deste esbater de fronteiras, sinto que ainda há uma grande rivalidade entre estas “opções” (e está entre aspas porque muitas vezes não o são). O problema é que não consigo perceber se é uma rivalidade real ou se é mais um discurso interno que a nossa própria culpa alimenta, criando um “inimigo imaginado”. Um inimigo que supostamente acusa as que ficam em casa de “não fazerem nada todo o dia”, de serem limitadas, pouco interessantes e demasiado obcecadas pelos filhos, e as mães que trabalham fora de preferirem a carreira aos filhos, de serem mães ausentes, ambiciosas e frias. E, no entanto, fora destes ridículos estereótipos estão as mães verdadeiras, que todos os dias superam montanhas de obstáculos, equilibram 30 pratos ao mesmo tempo, dividem-se entre compras, filhos, maridos, pais, sogros, chefes, colegas, professores, trânsito, etc., para criar a melhor vida possível para as suas famílias. E no final do dia é totalmente irrelevante se o grande stress da vida daquela mãe foi fechar uma proposta de marketing, fazer uma limpeza impecável a um escritório, conseguir ajudar a acalmar uma criança em pânico com um projecto que tem de acabar para a escola, ou levar os miúdos a todas as actividades a tempo e horas.

Todas estas mães (e pais) estão a sofrer de uma coisa em comum: doses estúpidas de culpa e a sensação de gestão de um equilíbrio impossível.

Mas, é verdade, que mesmo que a mãe tenha rejeitado totalmente as caracterizações que fiz em cima, os nossos julgamentos e preconceitos sobre as mães que escolheram um trilho de vida diferente do nosso é real e ninguém é imune a ele. Por isso, por vezes, apesar dos nossos melhores esforços, saímos de uma reunião de pais a sentirmo-nos “muito melhores do que aquela mãe”, porque ela estava a leste do que se passa na escola e nós conhecíamos todos os auxiliares pelo nome. Ou, pelo contrário, saímos do parque de estacionamento da escola já ao telefone com uma reunião importantíssima, e impecavelmente vestidas, sentindo alguma condescendência pela mãe que claramente ainda tem a parte de cima do pijama por baixo do casaco (não estou obviamente a falar de mim própria). E o que nos esquecemos é que tanto uma como a outra já têm vidas complicadas o suficiente, para ainda terem de levar com o nosso julgamento por cima.

Mãe, porque é que temos esta necessidade? Para nos sentirmos melhor com as nossas escolhas? Porque queremos ser constantemente perfeitas? Culpam o Instagram, mas cheiram-me que isto já existe há bem mais tempo do que as redes sociais!


Ah Ana,

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A resposta é simples: acreditamos que temos de ser, em simultâneo, as melhores das filhas, as mais competentes das profissionais, amantes (sim, não falas nisso, mas está na lista), e claro, antes de mais e acima de tudo, mães extraordinárias. De preferência tão boas, ou melhores do que as nossas, sem as “falhas” que tanto nos irritaram (ou magoaram). 

E, desesperadas porque é uma missão impossível, precisamos desses momentos em que nos esforçamos por restabelecer a nossa autoconfiança, fazendo comparações de que saímos a ganhar. Por isso é que mesmo em pleno século XXI todos esses estereótipos não desapareceram completamente, e andam dentro de nós, homens incluídos, num emaranhado de contradições. Um estudo revelou que a maioria dos portugueses valorizam mais uma mulher que tem uma profissão para além de mãe/dona de casa, mas quando lhes perguntam se acham que os filhos dessas mulheres estão tão equilibrados e felizes como aqueles que têm uma mãe que se lhes dedica a tempo inteiro, respondem que Não. Absurdo, não é, mas os resultados estão no portal de Opinião Pública, da Fundação Manuel dos Santos, para não achares que é ficção científica.

Mas agora vou recordar-te o antídoto para tudo isto. Libertou-me quando descobri a verdade. Já te esqueceste que o criador da BD da Supermulher era bígamo? Não estou a gozar, vivia com duas mulheres e criavam os filhos em conjunto. Ou seja, aquela mulher acima de todas as mulheres que procuramos imitar não era uma, mas duas! Dahhh.

Tenho a certeza de que esta revelação te vai deixar muito mais aliviada. A ti e a todas as mães que nos lerem. Dispam lá a capa de uma vez por todas. 

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