A passadeira da covid puxa-nos para trás

É preciso equilibrar os auxílios defensivos com os incentivos à economia.

Um dos problemas de viver em pandemia é que parece que estamos numa passadeira que algumas vezes nos leva em frente, mas, na maior parte das vezes, nos atrasa o passo ou mesmo nos puxa para trás. A próxima semana tem em perspectiva uma progressão de novos casos de covid que nos leva a considerar seriamente que o país e o mundo vão passar a andar no sentido contrário ao desejado.

O ano 2020, que já tem ressonâncias malignas, ainda não acabou e os tempos próximos podem bem fazer com que 2021 também não deixe de ser pronunciado com um frémito. Se, durante o Verão, achávamos que já tínhamos batido no fundo, a possibilidade de uma segunda vaga só pode reforçar as projecções da OCDE de que a economia portuguesa possa cair 11,3% em 2020, bem acima da previsão do Governo, que estima 7% de quebra.

O cenário de enorme incerteza para as contas públicas, como admitiu o ministro das Finanças, a dificuldade de se saber qual é o ponto de partida, torna mais frágil o exercício de discussão do plano de recuperação económica que António Costa tem de apresentar até 15 de Outubro. Será sempre importante prosseguir o caminho aberto pelo relatório de Costa Silva, especialmente se isso significar tornar mais claras algumas das opções enunciadas, chegando a consensos sobre metas, num país em que é tão difícil programar políticas públicas. Mas sem saber a profundidade do nosso problema e sem perceber quando poderá chegar da Europa o dinheiro de socorro – que estará sempre dependente de um complicado processo de ratificação de todos os Parlamentos dos países-membros –, os exercícios de futuro serão prejudicados pela incerteza do presente.

O presente vai continuar a pedir medidas de protecção dos sectores mais fragilizados, dos layoffs às moratórias, mas o executivo, em sintonia com a sua vontade de não regressar ao confinamento, vai ter de mudar de táctica. Como na semana passada pedia a OCDE, é preciso equilibrar os auxílios defensivos com os incentivos à economia, o que em muitos casos significa desistir de empresas para incentivar outras mais viáveis.

É o mesmo com as poupanças dos portugueses. O seu crescimento, graças à redução do consumo e às medidas de protecção do Estado, é uma almofada importante numa altura em que os rendimentos estão a cair. Mas, se esse dinheiro não começar a ser injectado na economia, ficam seriamente prejudicadas as possibilidades de uma recuperação mais rápida.

Tudo é ainda mais difícil se, como é previsível, a passadeira da covid nos começar a puxar outra vez para trás. Ficar parado nunca será solução – para contrabalançar o movimento da passadeira precisamos é de correr mais depressa.

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