Aspecto físico, ilhas Caimão e um inspector “conhecido”: o que levou a PJ a Rui Pinto?

Na tarde desta quinta-feira, o inspector José Amador iniciou a história da investigação que levou à detenção de Rui Pinto em Budapeste. Teia de coincidências terá facilitado identificação.

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Rui Gaudencio

Quando ouviu falar de um jovem baixo, com 20 e poucos anos e uma disputa com um banco nas Ilhas Caimão, José Amador, inspector da Polícia Judiciária, congelou. “Na minha cabeça fez-se luz”. O homem que, quatro anos depois, seria um dos responsáveis pela detenção de Rui Pinto em Budapeste, estava a iniciar uma investigação à plataforma Football Leaks e, em simultâneo, a uma queixa apresentada por Nélio Lucas, responsável pelo fundo de investimento Doyen, que estaria alegadamente a ser alvo de extorsão por parte de um indivíduo que se identificava como Artem Lobuzov.

A polícia apressava-se para colocar um nome à pessoa que pedia uma “oferta generosa” – entre 500 mil e um milhão de euros – a Nélio Lucas, em troca da destruição de informação sensível ao fundo, que teria sido ilegalmente obtida. Essa tarefa de identificação de Rui Pinto foi facilitada num encontro marcado entre Nélio Lucas, o então advogado da Doyen, Pedro Henriques, e Aníbal Pinto, que representava o hacker, ainda sob anonimato.

“[O que ajudou a fazer a ligação com Rui Pinto] Foram as descrições físicas e descrições feitas por Aníbal Pinto. Eu tinha antecedentes de investigações que já envolviam esta pessoa. Fez-se luz para mim quanto a quem se estava a falar”, prossegue José Amador.

Ainda muito antes do Football Leaks, Rui Pinto tinha estado envolvido numa disputa com um banco das ilhas Caimão, onde seria suspeito de ter desviado 264 mil euros. O caso terminou sem qualquer acusação e Rui Pinto acabaria por ficar com 17 mil euros obtidos através da invasão ao sistema informático do Caledonian Bank. Na investigação tinha estado presente José Amador. “Este processo estava na directoria do Norte e conhecia quer a matéria como o próprio arguido fisicamente”.

Depois de estabelecer esta ligação, o membro da Unidade Nacional de Combate ao Cibercrime e Criminalidade Tecnológica reparou em mais alguma coincidências, factores que reforçaram a crença de que Rui Pinto era o homem que procuravam.

Nas queixas feitas pela Doyen e Sporting [por acesso ilegítimo], havia uma série de endereços electrónicos [IP] que remetiam à Hungria. Estes IP eram de Budapeste e estavam relacionados com o Football Leaks. Tivemos no outro inquérito [o do banco das ilhas Caimão] a indicação de que Rui Pinto estaria em território húngaro e, portanto, seria uma coincidência estrondosa”, vinca o inspector.

Também na localização deste endereço foram encontradas novos pontos de ligação: na análise feita ao sistema informático do Sporting, foram encontrados acessos que remetiam para o IP da Universidade do Porto, onde Rui Pinto frequentou o curso de História. No caso do banco das Caimão, o desvio também teria sido feito num computador com esta localização digital.

“Porque usaria este endereço de email?”, pergunta a juíza Margarida Alves. Para o inspector, a resposta prende-se com o curto registo guardado pela instituição. “O facto de saber que não seria possível rastrear a localização. A Universidade do Porto apenas guarda os registos durante uma semana”, explica José Amador, admitindo porém que esta estratégia terá facilitado a localização de Rui Pinto.

O gaiense de 31 anos acabaria por ser detido na Hungria em Janeiro de 2019 e extraditado para Portugal em Março do mesmo ano. Mas o encontro entre a Doyen e Aníbal Pinto e esta detenção estão separados por quatro anos, enredo que não conseguiu ser contado esta quinta-feira por José Amador. A sessão foi suspensa poucos minutos após as 17h e o inspector estará de regresso na próxima terça-feira para continuar o seu testemunho sobre as perícias informáticas que permitiram identificar o autor do Football Leaks.

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