Partidos apontam falhas na preparação do início do ano lectivo

A falta de contratação de docentes e funcionários foi uma das críticas apontadas.

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Nelson Garrido

A deputada bloquista Joana Mortágua fez uma intervenção crítica sobre actuação do Governo na preparação do regresso às aulas, apontando-lhe a falta de recursos, a “falta de clareza” sobre os grupos de risco e o não desdobramento de turmas. O retrato foi partilhado no Parlamento não só pelos partidos à esquerda do PS mas também pelos do outro lado do hemiciclo no período de declarações políticas, esta quarta-feira, dia em que se assinala o início da segunda sessão legislativa

Afirmando que a aposta no ensino presencial gerou “consenso”, a deputada Joana Mortágua acusou o Governo de ter agido tarde e de forma incompleta para passar uma mensagem de confiança nas famílias. “Era possível ter ido mais longe e mais cedo”, afirmou, referindo-se ao desdobramento de turmas, à clareza das regras sobre os grupos de risco e o acompanhamento de alunos em quarentena.

A deputada considerou que o Governo quis poupar, mas que ainda vai a tempo de corrigir. “O Ministério da Educação abdicou de políticas de educação para ser um gestor avarento. O Governo não fez tudo o que podia, ainda é possível contratar funcionários, professores e dar autonomia para as escolas adaptarem estratégias e desdobramento de turmas”, afirmou Joana Mortágua.

Este retrato mereceu a concordância da bancada do PSD. “Concordamos em boa parte do que foi dito. O Governo, o primeiro-ministro e o ministro da Educação não acompanham as acções com o que anunciam”, afirmou Cláudia André, referindo como exemplos a falta de computadores, a não contratação de assistentes profissionais em número suficiente e a ausência de articulação com as autarquias para assegurar o transporte dos alunos.

O PCP, pela voz da deputada Paula Santos, também mostrou preocupação pela falta de contratação de assistentes operacionais, considerando ser esta uma matéria prioritária. A mesma deputada faria depois uma declaração política sobre a importância do Serviço Nacional de Saúde. 

Do lado do PEV, Mariana Silva questionou a intervenção do Governo sobre as crianças com necessidades educativas especiais.

A interpelação do CDS focou-se num ponto: o que acontece aos alunos que terão de ir para casa por estarem infectados ou em quarentena? “Temo que quando começarem a ir para casa não haja continuidade pedagógica e a única solução é a Telescola”, disse Ana Rita Bessa.

Na interpelação à bancada bloquista, o socialista Hugo Estevão Martins tentou contrariar as críticas, deixando uma ideia de início do ano lectivo tranquilo. “Hoje todas as escolas estão preparadas para prevenir e [sabem] como tratar casos de infecção. Isto acontece porque o Governo não andou atrás do prejuízo”, disse, defendendo, no entanto, que “é preciso uma vigilância permanente”. O deputado admitiu que todos querem “mais recursos para a escola pública”, mas assegurou que “há mais professores, mais técnicos” e que o concurso de colocação de professores decorreu “o mais cedo possível”.

PS elogiou política da coesão territorial e recebeu críticas à direita

A declaração política do deputado Luís Testa, do PS, centrou-se no elogio ao reforço da coesão territorial e na valorização do interior tendo também como pano de fundo o plano de recuperação e resiliência em preparação pelo Governo. Se à esquerda, PCP e PEV questionaram sobre a necessidade de valorizar a agricultura familiar foi à direita que o debate aqueceu. A deputada do CDS Cecília Meireles referiu-se às eleições indirectas das Comissões de Coordenação de Desenvolvimento Regional (CCDR) cujos candidatos têm estado a ser escolhidos por PS e PSD. “É a repartição do Estado por clientelas e comissários políticos escolhidos a dedo pelo PS e PSD”, apontou, reforçando: “Isto não é democracia, é a criação de um Portugal clientelar mais próprio de um Portugal do século XIX”.

CDS sobre plano de Costa Silva: “É liberal na imaginação e irreal na concretização”

O deputado do CDS João Gonçalves Pereira aproveitou a sua declaração política para apontar críticas ao plano de recuperação económica encomendado ao consultor António Costa Silva. “É socialista na apresentação, liberal na imaginação e irreal na concretização”, disse, apontando ainda que o plano “está orçamentado” e que se “imaginou-se tudo em grande”, mas que não se fizeram grandes contas”.

João Gonçalves Pereira considerou existir algumas incoerências entre a proclamação de “mais Estado” na recuperação da crise e as propostas concretas do plano. Como exemplo, apontou o financiamento de programas de apoio social de proximidade com parcerias entre os municípios e o terceiro sector bem como a “a abertura da ADSE a todos os activos com emprego”. O deputado disse ainda temer que o plano seja um “enorme vazio” por causa da memória sobre o PS. “Hoje lembrei-me de uma velha regra socialista: “os socialistas quando não querem falar do que não fizeram, lançam grandes debates do que nunca farão”, disse. 

João Cotrim Figueiredo, deputado da Iniciativa Liberal, partilhou do desencanto ao questionar se a visão estratégica não passa de “uma miragem poética condenada a uma prateleira qualquer”. A social-democrata Filipa Roseta apontou a “incapacidade de execução do Governo”.

Na resposta, o PS acusou o CDS de “política de terra queimada”. “Por isso é que se calhar está como está”, disse Carlos Pereira. 

Ventura acusa esquerda de ter “medo de ir a eleições"

O deputado único do Chega, André Ventura, escolheu abordar vários assuntos na sua declaração política desde o plano de Costa Silva (onde viu o “elogio pseudo-fúnebre aos membros do Governo”) à crise económica com “meio milhão de desempregados”. André Ventura sustentou que os partidos à esquerda do PS vão aprovar o próximo Orçamento do Estado. “Vergonha de governo. Quando mais precisamos dele refugia-se em crises políticas mas nem os seus amigos o deixam ir. Não tenham dúvidas: estes de sempre vão estar ao lado de António Costa não porque gostem dele mas porque têm medo de ir a eleições”, afirmou. O deputado anunciou a entrega na mesa de um projecto de revisão constitucional. A sua intervenção não suscitou pedidos de esclarecimentos de outras bancadas.

PSD faz campanha nas eleições regionais dos Açores

Na primeira declaração política da nova sessão legislativa, a bancada do PSD escolheu como tema as eleições regionais dos Açores, marcadas para 25 de Outubro. O deputado António Ventura (eleito por aquela região) acusou o Governo regional de estar “morto” e denunciou um ambiente de medo. “Vive-se um ambiente que asfixia. O Governo semeia o medo para fazer depender as pessoas coloca ilhas contra ilhas, açorianos contra açorianos”, disse, desafiando a uma “mudança política”. A intervenção transformou o debate parlamentar num momento de campanha regional.

PAN propõe criação da “Provedoria das Gerações Futuras”

A líder da bancada do PAN, Inês Sousa Real, propôs no Parlamento a criação de uma “Provedoria das Gerações Futuras” que terá de responder a problemas estruturais das gerações mais jovens, como a precariedade ou o acesso à habitação. “É justamente para assegurar que as políticas de hoje estão alinhadas com as expectativas e respeitam as futuras gerações que o PAN apresentará uma iniciativa tendente a criar a Provedoria das Gerações Futuras, um órgão do Estado ao qual os cidadãos se podem dirigir para defender os seus direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos se e quando sentirem o seu futuro ameaçado”, anunciou. 

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