Ministro das Finanças quer “aumento com significado” do salário mínimo

João Leão considera que o país já bateu no fundo e que o terceiro semestre apresentou sinais de recuperação, mas lembra que se vivem “tempos de grande incerteza”. O desemprego deve ficar entre 9% e 10% até ao final deste ano.

Foto
"Já batemos no fundo", afirmou o ministro das Finanças, João Leão, acrescentando que o terceiro semestre já apresentou alguns sinais de recuperação LUSA/TIAGO PETINGA

O ministro das Finanças, João Leão, afirmou esta quarta-feira que o Governo tem intenções de “prosseguir com o aumento do salário mínimo” em 2021, mas lembra que “o mundo mudou”, não adiantando, por isso, o valor do aumento previsto. “Em Concertação Social, temos de perceber qual a margem que devemos ter”, referiu, reconhecendo que “deve haver um aumento com significado” do salário mínimo.

Em entrevista à RTP3, esta quarta-feira, João Leão apontou os principais pontos estratégicos para o Orçamento do Estado (OE) de 2021

“Fazer o esforço para que, no próximo ano, a economia recupere o mais possível da queda deste ano. É muito importante manter e contribuir para a recuperação da confiança e das expectativas das famílias. Isso é fundamental”, explicou, sublinhando que o objectivo maior é proteger o rendimento das famílias.

Questionado sobre o que significa a vontade manifestada pelo primeiro-ministro, António Costa, de que este fosse um Orçamento de esquerda, o ministro das Finanças foi peremptório na resposta: “Significa uma estratégia de não acrescentar mais crise à crise.”

“Não tencionamos aumentar os impostos”, afirmou. “A grande prioridade é a recuperação da economia, recuperação do emprego e a protecção de rendimentos de uma forma responsável.”

Ainda sobre os salários o ministro das Finanças lembrou que está previsto um aumento da massa salarial “superior a 2%” na função pública, ligado às progressões de carreiras gerais, para além da “recuperação de tempo das carreiras” em algumas áreas, que terá um impacto de 100 milhões de euros adicionais.

Já batemos no fundo

João Leão afirmou, no início da entrevista, que as maiores quebras da economia provocadas pela pandemia já ocorreram.

“Já batemos no fundo. O segundo trimestre foi o pior trimestre da pandemia, em que a economia caiu 16%”, disse o ministro das Finanças.

João Leão justificou a afirmação com os sinais encorajadores já verificados no terceiro semestre, “que já teve sinais de recuperação”. [Até] um pouco acima do que estávamos à espera [, nomeadamente nos meses de Julho e Agosto]”, acrescentou.

“Os pagamentos por multibanco, o indicador mais avançado que temos, durante a pandemia chegaram a cair cerca de 40%, agora a partir de Julho têm estado estabilizados face ao ano anterior, já recuperaram significativamente.”

Pior ainda não passou” no emprego

Outras áreas também têm demonstrado uma melhoria: “A construção mantém um bom ritmo e temos estado a recuperar significativamente as exportações.”

Além disso, as receitas do IRS, “depois de quedas muito acentuadas desde Abril, tiveram em Agosto um aumento face ao ano anterior” de cerca de 1%, de acordo com João Leão. Contudo, avisa: “Estamos todos conscientes de que há uma queda muito significativa da receita fiscal até ao mês de Julho, em que estava a cair 15% face ao ano anterior.”

Esta evolução da receita e da despesa vai fazer com que o défice, que estava em 0,2% do PIB, passe para cerca de 7% do PIB, uma estimativa feita na altura do orçamento suplementar, mas que João Leão acredita que não será muito diferente.

E as repercussões do novo coronavírus vão continuar a ser sentidas. Ao nível do emprego, João Leão reconhece que “o pior ainda não passou”.

“Ainda vamos ter algum período de desemprego relativamente elevado, que pode chegar a valores de 9%, 10%, quer este ano, quer no próximo, sendo as estimativas para o próximo ano muito incertas.”

O ministro das Finanças enfatiza que se vivem “momentos de grande incerteza”, lembrando que a “evolução da economia vai depender muito da evolução da pandemia”.

“Alguns indicadores ficaram acima das nossas expectativas. Sabemos, no entanto, que são momentos de grande incerteza. A pandemia e toda a Europa está a evoluir num sentido pior do que o esperado. Temos de ter presente que são cenários de grande incerteza e a evolução da economia vai depender muito da evolução da pandemia.”

No entender do executivo, e face ao aumento dos números verificados nos países europeus, incluindo Portugal, “o terceiro trimestre vai ficar melhor do que [o Governo tinha] antecipado e é possível que o quarto trimestre não seja tão bom” – a previsão seria para uma queda ligeira face ao período homólogo de 2019.

A evolução da pandemia em toda a Europa já era “esperada” devido à retoma da actividade e o início do ano escolar. João Leão explica também que as previsões menos extremas para a fase final do ano se devem ao facto de as pessoas conseguirem “viver melhor no contexto da pandemia”, compatibilizando as preocupações sobre o vírus com a retoma da actividade, algo que não aconteceu no segundo semestre.

Não está, por isso, fora de questão a possibilidade de uma “recuperação significativa no próximo ano”, mas o ministro reconhece que, face às primeiras estimativas feitas em Março e Abril, a recuperação vai ser “mais moderada do que se antecipava”.

“No próximo ano vai haver uma recuperação significativa”, com crescimentos que podem ser de cerca de 4%, 5%, mas mantendo ainda assim a economia de 2021 “abaixo dos valores de 2019”.

“Contamos, sempre com a grande incerteza da pandemia, que em 2022 a economia já esteja a recuperar e acima dos valores de 2019”, declarou João Falcão.

Ministro confia que OE vai ser aprovado à esquerda

Até ao mês de Julho já foram executados mais de 1100 milhões de euros relacionados com a pandemia. A grande fatia desta despesa está relacionada com a Segurança Social, com os layoffs e o apoio às famílias, e com a Saúde. “São os dois principais eixos de despesa.”

Sobre o Orçamento do Estado de 2021 o ministro das Finanças disse que as negociações estão a “correr bem”, acreditando que o OE vai ser aprovado.

“É natural que estes orçamentos tenham uma negociação exigente, mas temos conseguido chegar a um bom compromisso nos últimos anos”, referiu João Leão, convencido de que este OE vai contar com os mesmos apoios parlamentares dos últimos cinco anos.

“O OE vai ter uma preocupação acrescida com a situação económica e social a que o país tem de responder”, justificou.

O executivo espera também que o investimento público volte a aumentar em 2021, à semelhança do que se vai verificar este ano. “Este ano e no próximo [os investimentos públicos] vão crescer acima de 20%”, esclareceu João Leão, realçando que este aspecto é muito importante para a retoma económica.

“É crítico nesta fase da pandemia, porque uma parte da actividade económica ainda pode estar distanciada com o distanciamento social, o que não acontece com a construção, que tem maior capacidade de aumentar, mesmo durante a pandemia.”

Na área do investimento privado, João Leão lembrou que já há medidas em vigor para fomentar a actividade das empresas, referindo que o crédito fiscal extraordinário ao investimento incluído no orçamento suplementar, que permite deduzir na colecta do IRC 20% das despesas em activos produtivos e que não ultrapassem os cinco milhões de euros, vai ficar em vigor até ao primeiro semestre de 2021.

Sobre o Novo Banco João Leão não quis comentar a abordagem que está a ser negociada, considerando “extemporâneo” confirmar uma nova transferência para o Fundo de Resolução. O ministro das Finanças considera que as atenções nesta altura convergem para a análise dos resultados da auditoria feita pela Deloitte e que a “prioridade do Novo Banco deve ser valorizar os seus activos com o maior rigor possível”.

Sugerir correcção