Luzes, câmara, (in)acção: o silêncio dos técnicos de espectáculos fez-se ouvir no Porto

A Associação Portuguesa de Serviços Técnicos para Eventos (APSTE) organizou na terça-feira, 8 de Setembro, uma manifestação que encheu a Avenida dos Aliados, no Porto, com malas de material técnico. “Fomos os primeiros a fechar e vamos ser os últimos a abrir”, repetem.

Foi um espectáculo mudo que encheu os Aliados, não de pessoas, mas de malas de material técnico. Uma bagagem pesada, que carrega as inquietações e exigências de quem vive na sombra dos espectáculos e eventos culturais. Costumam ficar escondidos por detrás do pano, mas desta vez foram foco das atenções numa instalação visual plantada pela avenida fora, ensurdecendo a cidade com o silêncio de indignação. Na terça-feira, 8 de Setembro, centenas de técnicos de eventos e espectáculos montaram ao final do dia os seus sistemas de som e luz pela primeira vez em muitos meses, numa manifestação em frente à Câmara Municipal do Porto, organizada pela Associação Portuguesa de Serviços Técnicos para Eventos (APSTE), fundada em Junho deste ano face à falta de representatividade de um sector paralisado pela pandemia.

Sentados em cima das suas malas de material espalhadas ao longo da Avenida dos Aliados, os manifestantes adoptaram uma postura pacífica e silenciosa. Não se ouviram gritos reivindicativos ou tambores, nem se ergueram cartazes com mensagens de apelo. Tratou-se de uma manifestação cultural, marcada pelo impacto visual e não pela revolta. Além disso, foi ainda projectada, nas fachadas do edifício da Câmara, uma montagem de imagens, vídeos e frases que reflectem o estado de espírito do sector.

Com o avançar da noite e com as luzes dos holofotes a iluminar os prédios dos Aliados, começaram a ouvir-se mensagens da organização, transmitidas da régie instalada junto à Câmara, para reforçar o cumprimento das normas de higiene e segurança e a explicar, pausadamente, as intenções da manifestação.

Ao P3, alguns técnicos de som e imagem, freelancers e trabalhadores de empresas, muitos dos quais perderam a sua fonte de rendimento devido ao cancelamento de espectáculos, mostraram a sua indignação com o actual estado do sector da Cultura e nomearam o que queriam ver mudar. “Queremos trabalhar”, “que se arranjem alternativas”, “que haja uma igualdade”, “que a área seja legislada”: eis algumas das muitas preocupações enunciadas. “Fomos os primeiros a fechar e vamos ser os últimos a abrir”, repetiram vários trabalhadores, destacando como o sector se mantém estagnado em comparação com os restantes que já retomaram actividades.

Hélder Feliz, natural do Porto, tem 39 anos e é técnico de som freelancer. “Desde meados de Fevereiro que não tenho um único trabalho”, conta. “Acredito até que o Governo fez um bom trabalho no tempo que passou, mas a verdade é que o nosso sector não arrancou como os outros já arrancaram”, prossegue. “Nós, entre Março e Setembro, estivemos parados e é quando fazemos dinheiro para o resto dos meses em que quase não fazemos nada.” O técnico de som portuense realça, ainda, a importância deste ofício nos eventos do país, nomeadamente nas próprias comunicações do Governo que requerem instalação de som.

Segundo um comunicado enviado ao P3, num inquérito lançado pela APSTE às mais de 170 empresas associadas, foi possível perceber que 20% das mesmas já iniciaram processos de despedimento devido ao corte de 80% da facturação. Entre as reivindicações exigidas pela associação que representa as representa estão a criação de um CAE (Código de Actividade Económica) para o sector, a prorrogação do regime de lay-off simplificado, a isenção do pagamento por conta e o acesso ao selo Clean and Safe.

Este foi a segunda acção organizada pela associação, depois da manifestação em Lisboa em Agosto. Esta sexta-feira, dia 11 de Setembro, irá decorrer uma audiência com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, solicitada pela APSTE com carácter de urgência, para tentar conseguir respostas às inquietações daqueles cuja subsistência depende das luzes, da câmara e da acção do mundo do espectáculo. 

Texto editado por Amanda Ribeiro