Uma aliança entre o PSD e o Chega seria uma estratégia muito arriscada

Os partidos da direita populista revelam-se ser parceiros de governo pouco fiáveis.

Nas últimas semanas, uma potencial colaboração entre o PSD e o partido Chega de André Ventura foi foco de atenção. Com o Chega a 8% das intenções de voto nas últimas sondagens, à frente do CDS-PP, novas oportunidades de alianças à direita estão a surgir. Enquanto Rui Rio falou de possíveis entendimentos eleitorais “se o partido evoluir para uma posição mais moderada”, o Presidente do governo regional da Madeira Miguel Albuquerque propôs uma “geringonça de direita” que unisse o PSD, CDS-PP, Chega e Iniciativa Liberal como única maneira de derrotar a esquerda.

Portugal encontra-se agora numa situação em que a maioria dos outros países europeus já se encontrou anteriormente: como devem os partidos tradicionais lidar com a direita populista? Nos últimos 30 anos, os partidos populistas de direita transformaram a política europeia, mas até agora nunca tinham conseguido ganhar uma posição significativa no sistema partidário português. Em Itália, Países Baixos, Áustria, Noruega, Dinamarca ou Suíça, não só rivalizam em termos eleitorais com os seus homólogos de direita, como também participaram em coligações de governo em várias ocasiões. O que se pode aprender com a experiência de outros países europeus? O que aconteceu quando partidos da direita moderada decidiram colaborar com a direita populista?

Há três estratégias que os partidos tradicionais podem adoptar face à direita radical: ignorar, combater ou cooperar. Ignorar e combater foram as estratégias dominantes utilizadas até ao início dos anos 2000. Era então considerado tabu envolver-se com partidos considerados inimigos dos valores liberais da democracia, e a estratégia apropriada era formar "cordões sanitários” unindo a esquerda e a direita moderada para excluir estes partidos do poder. Em 2000, este tabu desapareceu quando os conservadores austríacos decidiram entrar no governo com a FPOe de Jörg Haider, um partido fundado por antigos nazis. Desde então, os partidos de direita radical têm sido um elemento regular de coligações governamentais em vários países europeus. Quais foram as consequências destas cooperações? Há duas características destes partidos que os tornam parceiros de coligação pouco fiáveis. 

Primeiro, a natureza do seu apelo populista torna a sua agenda difícil de concretizar num governo de coligação, o que torna o seu apoio instável. Por exemplo, é difícil imaginar como o referendo interno sobre o restabelecimento da pena de morte que Chega vai organizar no próximo fim-de-semana, se resultar num voto a favor, poderia alguma vez ser apoiado por outros partidos. Porque o seu apelo eleitoral é baseado na oposição ao sistema, a cooperação com o sistema tem custos eleitorais especialmente elevados. As tensões entre as promessas populistas aos eleitores e os compromissos que têm de fazer no governo revelam-se frequentemente insustentáveis. Na campanha para as eleições de 2010, o líder do PVV holandês Geert Wilders prometeu que o aumento da idade da reforma seria um assunto em que nunca se comprometeria se fosse para o governo. A primeira coisa que ele disse depois das eleições foi que finalmente, era algo em que ele poderia fazer compromissos. O seu partido apoiou um governo minoritário de liberais e democratas cristãos que puxou uma agenda de austeridade muito impopular entre a base eleitoral do partido. Estas contorções levaram Wilders a retirar o seu apoio ao governo após dois anos, causando a queda do primeiro governo Rutte

O segundo problema é o dos recursos humanos. Por um lado, estes partidos são centrados em líderes onipotentes pouco dispostos a partilhar poder e responsabilidades, deixando poucas oportunidades para a constituição de uma elite partidária competente. Até agora, o Chega tem sido o “one-man show” de André Ventura. Geert Wilders também governa o seu partido com uma mão de ferro - é de facto o único membro oficial do partido. Estruturas centradas num líder passam frequentemente por purgas em que as elites do partido são excluídas ou fundam partidos alternativos se não concordarem com o fundador. Como é difícil para esses partidos integrar desacordos internos, podem ser mais frágeis, o que é perigoso para apoiar maiorias no parlamento. 

Além disso, porque as posições partidárias têm de ser preenchidas por pessoas recrutadas fora das estruturas políticas tradicionais, isso conduz frequentemente a elites partidárias inexperientes ou imprevisíveis que se envolvem em escândalos. Um vídeo do antigo líder da FPö austríaca e vice-chanceler Heinz-Christian Strache discutindo subornos em Ibiza resultou na queda do governo no ano passado.

Existem naturalmente excepções - por exemplo na Suíça ou na Dinamarca - mas por todas estas razões os partidos populistas de direita revelaram-se frequentemente parceiros de coligação pouco fiáveis para outros partidos. Como consequência, muitos partidos de centro-direita que tinham cooperado com eles mudaram de ideias após experiências amargas de cooperação. É o caso dos Liberais de Mark Rutte nos Países Baixos, que se afastaram de Wilders após a sua deserção da coligação e a queda do seu governo em 2012. Após o escândalo do vídeo da FPö, os conservadores austríacos decidiram formar uma coligação com os Verdes após as últimas eleições. Na Alemanha, se a CSU, a prima bávara da CDU de Angela Merkel, tinha começado a cortejar a Alternativa para a Alemanha, regressou agora ao centro apercebendo-se de que estava a perder eleitores à esquerda.

É evidente que o Chega tem as suas características sui generis e o sistema político português é diferente dos países do Norte da Europa. Mas várias dinâmicas observadas noutros locais são visíveis em Portugal, e os partidos da direita deveriam considerar os riscos antes de se comprometer com a direita populista.

 
Sugerir correcção