A émeérrepêpização do PCP

Não é de aceitar que um partido que existe para defender os mais desprotegidos ponha à frente deles esta celebração em tempos de pandemia.

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Pedro Fazeres

A primeira Festa do Avante realizada em 1976 na FIL, na qual foi posta uma bomba, inseriu-se num contexto mais vasto de realizações do mesmo tipo como a Festa do Humanité (PCF), Unitá (PCI), Mundo Obrero (PCE), entre muitos outros.

Foi o PCP que criativamente engendrou na colina da Ajuda estes grandes espetáculos aliados à divulgação de realizações culturais de elevado nível.

Durante mais de vinte anos participei na Organização da Festa pelo lado da participação de quase uma centena de partidos comunistas e de esquerda de todo o mundo, desde Timor Leste aos EUA.

A Festa reuniu quadros da maior qualidade a diversos níveis e gerações de intelectuais desde logo o pintor e escultor, o saudoso Mestre Rogério Ribeiro.

Até o Sr. Prof. Dr. Marcelo lá foi, antes de ser eleito para o cargo que tão beijoqueiramente ocupa.

Com o advento da pandemia as Festas do Humanité e do Mundo Obrero foram canceladas, com toda a lógica.

A Festa tem para o PCP um certo simbolismo, uma espécie de atestado de força que, entendido à maneira da sua direção, seria suficiente para justificar um ano de vida. Trata-se da substituição de uma ação abrangente por um ritual quase sagrado. Ora os rituais tendem a fazer perder o pé à realidade.

Não é de aceitar que um partido que existe para defender os mais desprotegidos ponha à frente deles esta celebração em tempos de pandemia. E afinal o que preside a esta obstinação que os faz ligar aos militantes para irem? O que explica este estranho fenómeno? Será que estes dirigentes do PCP interiorizaram que se a Festa não se fizesse, o PCP deixaria de ser o que era? Mas tal não aconteceu num ano em que caiu um dilúvio de água…

A direção do PCP, imitando o MRPP no estardalhaço verbal, conseguiu colocar em cima da mesa o tema da Festa, mas pelos piores motivos. Quando há anos se unia os portugueses para comprar o terreno, hoje a direção do PCP conseguiu criar um ambiente que dá para tudo para atacar o partido.

É uma perversidade querer meter no mesmo saco do anticomunismo todos os que se pronunciam sobre o evento no sentido de apresentarem as maiores reticências em relação à realização. Há quem o faça exatamente para defender o partido.

A direção do PCP devia ser a primeira a dar o exemplo e cancelar a Festa. Não se trata de saber se é legal ou não, nem a ousadia está nessa vertente. A pandemia existe e não há risco zero e toda a gente sabe que numa Festa há desinibição, copos, abraços  e… Porquê esta decisão? Será que se a seguissem se sentiriam derrotados depois do verbo gasto a incentivar o caminho traçado? Onde está a coragem? Em colocar à frente de todo o Partido a direção do PCP? A coragem seria substituir a ritualização dogmática pela ponderação que tivesse em conta a importância da disseminação do vírus e a presença das gerações mais idosas para um certo equilíbrio da Festa face à juventude.

As chamadas telefónicas a pedir aos militantes para irem são muitas e há militantes que sempre foram e não vão. Muitos não vão por motivos simples – a pandemia existe e o vírus está em todo o lado, incluindo na Quinta da Atalaia, porquê arriscar? Quem duvida que o PCP é capaz de fazer uma grande Festa? A direção do PCP? 

Os dirigentes do PCP sabem que façam o que fizerem têm o seu lugar garantido pelo centralismo democrático, só ele podem propor outra direção. O mal maior é que como nunca era preciso um PCP mais forte e a direção está a torná-lo mais fraco.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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