“Cá vai bomba!”: a nova geração de mergulhadores do Douro

Tradição que se perde no tempo, os saltos no rio Douro nunca deixaram de estar na moda. Este Verão, são muitos os grupos de jovens que se reúnem para saltar, reavivando o passado.

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Paulo Pimenta

São 16h30 e o sol brilha sobre o Douro. Atravessando o Passeio Alegre em direcção à casa dos pilotos [da barra], junto à Capela de São Miguel-o-Anjo, encontramos grupos de amigos na galhofa, a arrastar as suas bicicletas até ao paredão. O Pilotos, como é conhecido, é um espaço que surge a preto e branco nos álbuns de recordações de muitos pais e avós, e é agora palco de uma nova geração de mergulhadores. É motivo para dizer que o vintage ​está na moda. 

As sapatilhas e as bicicletas são chutadas para o chão de pedra, despem-se as t-shirts e preparam-se os saltos. Tomás já tem o cabelo a pingar quando fala com o PÚBLICO. Tem 15 anos, é de Matosinhos e é a primeira vez que marca presença no Pilotos: “Um colega convidou-me, quis experimentar”. Já os seus amigos contam que vêm há algum tempo: palavra passa palavra e o Douro passa, uma vez mais, a lugar de convívio e mergulhos. “Os nossos pais também já vinham, mas agora o tempo é outro”, comenta o jovem. 

E, de facto, os tempos são outros. Dantes, não se veria nem uma rapariga por estas redondezas, mas, agora, saltar é mesmo para todos. Francisca também tem 15 anos, é de Matosinhos e diz que “queria fazer uma coisa diferente”: o plano habitual de se encontrar com os amigos no Molhe já não prometia adrenalina suficiente. Por isso, depois de almoço, Francisca e as amigas sentam-se no chão de pedra, a apanhar sol com os seus bikinis, até chegar o momento da coragem, em que as águas se agitam e os cabelos se ensarilham. 

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Entretanto, há sempre grupos novos a chegar. É o caso de Luís, que veio com os seus amigos. Começou a vir por iniciativa do irmão. Os pais e os avós evocam muitas vezes o Pilotos, lugar mítico da sua juventude, e, ultimamente, são muitos os jovens que partilham os seus saltos no Instagram. Luís também quis fazer parte da experiência, agora que o Douro passou a ser cool.

​Para além do Pilotos

O Pilotos não é lugar exclusivo para saltar. Afinal, o Douro percorre todo o Porto. No heliporto da Sky Douro Experience, Joel e os amigos aproveitam a tarde de Verão... para saltar. A maioria destes jovens vive na Baixa da cidade e já criou uma rotina: apanhar o eléctrico para passar a tarde nas águas tremeluzentes, sobre as quais planam as típicas gaivotas portuenses. Deitados no paredão, de tronco nu, acabam uma embalagem de Sunny Delight, numa tarde que parece ter sido catapultada de um ecrã de cinema. 

Sob um sol abrasador de Agosto, Joel conta ainda que, sempre que vem sem amigos saltar, basta juntar-se a um grupo e quebrar o gelo ao perguntar “se a água está fria”. Já foram muitas as amizades feitas nestas circunstâncias, algumas delas vão-se mantendo neste ponto de encontro. Claro que há mais espalhados pela cidade...

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Se avançarmos pelo Douro, seguindo o movimento dos barcos de cruzeiros ou até mesmo das gaivotas nos seus altos voos, rapidamente chegamos ao lugar mágico dos saltos, junto à ponte D. Luís, imortalizadas em Aniki Bobó de Manoel de Oliveira.

Diogo, Martim e Rodrigo têm 11, 12 anos. São os mergulhadores mais novos que o PÚBLICO conheceu. Vêm todos os dias saltar depois de almoço e ficam pela Ribeira até às 18h, 19h. Assistem ao rebuliço dos turistas e fazem-lhes as delícias. Os transeuntes adoram o barulho do splash dos corpos a furarem a água e aplaudem a audácia juvenil. Há dias em que estes três amigos conseguem mesmo fazer dinheiro com os seus saltos. 

Álvaro Gomes com os filhos e os sobrinhos. Paulo Pimenta
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Álvaro Gomes com os filhos e os sobrinhos. Paulo Pimenta

​Dos mais velhos aos mais novos 

Álvaro Gomes está sentado, a contemplar os filhos e os sobrinhos. “Salto aqui desde os quatro, cinco anos”, recorda com nostalgia. Agora é a vez de mais novos, mas Álvaro confessa que ainda há dias em que se atreve pelas águas do Douro, ressuscitando o menino que ainda conserva dentro de si. 

Entretanto, de pé nas grades da ponte, três jovens encorpados preparam-se para um longo salto de cabeça. No cais de Gaia, há turistas com os telemóveis apontados para os corajosos. Há quem torça, com entusiasmo, pelo momento derradeiro. Com a elegância de bailarinos, os três acabam por atirar-se para as águas, depois de uma longa espera que deixou o público em êxtase. As águas lançam-se num alvoroço de espuma, os jovens nadam até ao paredão. Os mais velhos recordam-se então dos tempos áureos em que também saltavam, fazendo do rio Douro a sua casa. 

É verdade, os tempos mudaram, mas não assim tanto. As fotografias não são a preto e branco, agora são instagramáveis. A cultura, apesar de tudo, continua a mesma: fazer novos amigos, aproveitar o sol de Verão, organizar competições de “bombas”... até ao momento em que o sol se põe, atravessando a linha de horizonte. Aí, sob os tons esmaecidos do pôr-do-sol, amigos combinam encontrar-se no dia seguinte. 

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