Joshua Wong: uma luta de todos os tempos e de todas as idades

A coragem, vontade férrea, persistência e espírito de sacrifício de Joshua e dos seus companheiros inspiraram e mobilizaram Hong Kong a sair maciçamente à rua.

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Jeenah Moon

O livro (Da Falta de) Liberdade de Expressão (Bertrand Editora, 2020) conta-nos na primeira pessoa o percurso de Joshua Wong, o rosto principal do combate travado pelos cidadãos de Hong Kong contra a tenaz repressiva de Pequim. Mais do que uma simples biografia, no entanto, pelas suas páginas perpassam um grito de alerta e um incitamento à acção a todas as pessoas que amam a democracia e a liberdade. É uma ilusão pensar que aquilo que se passa do outro lado do planeta não nos afecta, porque esta é uma luta universal que nos toca a todos. Se deixarmos a autocracia de Pequim engolir a ex-colónia britânica, estaremos a dar o sinal errado aos ditadores que grassam pelo mundo fora.

Joshua não precisou de muitos anos de vida para passar dos videojogos em casa dos progenitores aos calabouços das prisões. É a prova de que nunca se é demasiado novo para travar batalhas em nome da liberdade, independentemente da sua dureza, desproporção de forças ou consequências. A sua juventude, aliás, foi uma vantagem, porque atraiu os estudantes do secundário para a contestação à educação nacional (eufemismo para propaganda do Partido Comunista Chinês desde os bancos da escola primária). Esta entrada precoce na arena política é a melhor garantia de que a luta pela democracia continuará viva nas próximas décadas. Por outro lado, a adesão crescente ao movimento deveu-se também ao vazio deixado pela geração dos seus pais, que aceitou apaticamente a influência crescente de Pequim na política da região. “Se a campanha contra a educação nacional nos ensinou alguma coisa foi que os estudantes têm uma palavra a dizer nos assuntos de adultos. A política já não é um desporto exclusivo para políticos grisalhos”, escreve o activista.

A coragem, vontade férrea, persistência e espírito de sacrifício de Joshua e dos seus companheiros inspiraram e mobilizaram Hong Kong a sair maciçamente à rua. Depois do recuo do governo na implementação da educação nacional, o Movimento dos Guarda-Chuvas, criado em 2014, bateu-se pelo sufrágio universal durante 79 dias, mas sem sucesso. No ano passado, dois milhões de pessoas (num total de sete milhões) contestaram a lei de extradição e conseguiram mais uma vez que o governo cedesse. Entretanto, Joshua passou vários meses preso, experiência descrita no livro através do diário que escreveu. Em vez de o atemorizar, o tempo passado atrás das grades apenas aprofundou a convicção da justiça da sua luta, certificada pelas centenas de cartas de apoio que recebeu. 

O livro termina em Dezembro de 2019. De então para cá, a situação piorou bastante, sobretudo com a aprovação em Junho deste ano da nova Lei de Segurança Nacional. O medo apoderou-se das ruas e quem pode tenta emigrar. Apesar da mensagem final de optimismo e esperança, virei a última página angustiado pela sensação de que a região terá muito poucas hipóteses de sobreviver à repressão de Pequim. É verdade que Joshua demonstrou que “basta” coragem, um megafone e uma banca com panfletos para iniciar um movimento de massas que consiga obter algumas vitórias sobre a ditadura tecnologicamente mais sofisticada da História. No entanto, os habitantes da região não serão suficientes para enfrentar o regime de Xi Jinping. É preciso que o mundo livre se una a este combate e faça da luta pela democracia uma luta de todos os tempos e de todos os dias. E, já agora, de todas as idades, como nos ensinaram os adolescentes de Hong Kong. 

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