Se as vacinas da covid-19 tiverem problemas, farmacêuticas querem que UE as livre de processos

O lobby Vaccines Europe pediu à Comissão Europeia “isenção de responsabilidade civil”, porque os riscos são “inevitáveis”, tendo em conta a “rapidez” com que se tenta produzir uma vacina contra o novo coronavírus.

Ratos, macacos, humanos: os caminhos de uma vacina até ao mercado. A pandemia leva vários países a querer saltar ou acelerar etapas CAROLINA PESCADA

A corrida para desenvolver vacinas contra o novo coronavírus está a fazer-se com tal rapidez que é inevitável que a imunização venha a dar problemas - efeitos secundários ou um elevado grau de ineficácia, por exemplo. Tentando precaver os laboratórios farmacêuticos de processos judiciais e da possibilidade de as empresas que estão a desenvolver as vacinas terem de pagar avultadas indemnizações, o lobby europeu das indústrias farmacêuticas está a pressionar a União Europeia para que os seus membros fiquem livres destes processos.

Segundo o Financial Times, um memorando em circulação entre os membros da Vaccines Europe, grupo especializado em vacinas da Federação Europeia das Indústrias e Associações Farmacêuticas, defende um “sistema de compensação abrangente isento de culpa e não conflitual” e a “isenção de responsabilidade civil” para os problemas que possam surgir. Que serão “inevitáveis” devido à “rapidez e escala do desenvolvimento e implementação” de uma eventual vacina para a covid-19, de acordo com o mesmo documento.

​Algumas pessoas são susceptíveis de sofrer “efeitos adversos” após a vacinação, aponta o memorando. “Mesmo que tais efeitos possam não estar relacionados com as vacinas, essas ocorrências, juntamente com a dimensão do programa de vacinação e a atenção pública dada à covid-19, podem levar a numerosos processos por danos”, lê-se na nota.

“É impossível gerar a mesma quantidade de provas que normalmente estariam disponíveis através de ensaios clínicos extensivos e da experiência dos prestadores de cuidados de saúde”, justifica o memorando.

A Comissão Europeia respondeu ao Financial Times que considera necessário agir o mais depressa possível, salvaguardando, ao mesmo tempo, a segurança das pessoas. Por isso, Bruxelas parece disposta a ceder à exigência das farmacêuticas: a Comissão diz que, de forma a “compensar os riscos tão elevados assumidos pelos fabricantes”, está a preparar disposições para que os 27 Estados-membros indemnizem as empresas por “determinadas responsabilidades” relacionadas com os acordos de compra antecipada.

A União Europeia estabeleceu planos em Julho para comprar 19 vacinas diferentes, embora nenhuma tenha ainda completado a terceira e última fase dos ensaios clínicos - onde se determina a sua eficácia. O seu objectivo é vacinar pelo menos 40% dos 450 milhões de habitantes da União Europeia, ou seja cerca de 200 milhões de pessoas. Portugal terá direito a 6,9 milhões dessas vacinas. É um objectivo duas vezes superior ao da própria Organização Mundial de Saúde, diz a Reuters, que pretende vacinar 20% da população mais vulnerável em todo o mundo através de um plano de encomendas a nível global.

A 14 de Agosto, a Comissão Europeia anunciou que chegou a um acordo com a AstraZeneca para adquirir pelo menos 300 milhões de doses de uma potencial vacina, que está na fase 3 de ensaios clínicos e é desenvolvida pela Universidade de Oxford. Há também acordos estabelecidos com a Sanofi, a Johnson & Johnson e a CureVac.

A Vaccines Europe inclui grupos farmacêuticos como a AstraZeneca, GSK, Janssen (que integra o grupo Johnson & Johnson), Novavax, Pfizer, Sanofi e CureVac.

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