Líbano de olhos postos em Fadi Sawan, o juiz que investiga a explosão

Processo de escolha do juiz envolto em polémica, num país abalado pela corrupção e pela interferência política nas questões judiciais. Decisão que sair da investigação de Fadi Sawan não é passível de recurso.

Foto
Porto de Beirute ficou completamente destruído depois da explosão de 4 de Agosto Reuters/Alkis Konstantinidis

Fadi Sawan, o juiz responsável pela investigação à explosão no porto de Beirute, no Líbano, que causou a morte de pelo menos 181 pessoas e deixou mais de 6500 feridas, ordenou esta sexta-feira a detenção de Hanna Fares, directora da autoridade alfandegária, e de Nayla Al-Haj, uma engenheira contratada para realizar trabalhos de manutenção no hangar onde estavam as mais de 2750 toneladas de nitrato de amónio.

Desde que as autoridades libanesas anunciaram a investigação foram emitidos mandados de detenção em nome de seis dos 25 acusados no caso, incluindo o director-geral do porto de Beirute, Hassan Koraytem, e o director-geral da alfândega, Badri Daher, diz a AFP. 

Num país que tem sido fustigado pela corrupção e pelo clientelismo político, vários grupos de defesa dos direitos humanos e familiares das vítimas têm apelado a uma investigação internacional independente, uma reivindicação negada pelas autoridades libanesas, que, no entanto, aceitaram a colaboração de especialistas de outros países, nomeadamente dos Estados Unidos e da França.

Enquanto se apuram responsabilidades, os olhos do Líbano estão postos no juiz Fadi Sawan, de 60 anos, que, conta a Al-Jazeera, foi apenas a terceira escolha da ministra da Justiça, Marie-Claude Najem, para liderar a investigação.

De acordo com a estação televisiva pan-árabe, a primeira escolha recaiu sobre Samer Younes, um juiz considerado independente, mas que acabaria rejeitado pelo Conselho Judicial Superior, um órgão composto por um painel de dez juízes, sem que tivessem sido dadas explicações. A segunda escolha foi Tarek Bitar, que recusou a nomeação sem apresentar justificações. Em ambos os casos, dizem os media locais, especula-se que tenha sido exercida pressão política.

O processo que levou à escolha de Fadi Sawan está, de resto, envolto em polémica. Em 2010, Samer Younes, o primeiro nome apontado para liderar a investigação, envolveu-se num confronto judicial com o procurador Ghassan Oueidat no âmbito de um caso de um tiroteio entre guarda-costas de homens de negócios.

Dez anos depois, Oueidat, que na altura tentou impedir que o guarda-costas de um futuro ministro fosse interrogado, enfrentando a oposição de Younes, chegou a vice-director do Conselho Judicial Superior, precisamente o órgão que rejeitou a escolha de Samer Younes.

Além disso, antes de o caso ser transferido para o juiz Fadi Sawan, Ghassan Oueidat, o procurador-geral do Líbano, foi o responsável pela condução de uma investigação e pela elaboração de um relatório sobre o nitrato de amónio armazenado durante seis anos no porto de Beirute, relatório esse que terá sido enviado para o Presidente libanês, Michel Aoun, e para o primeiro-ministro, Hassan Diab, duas semanas antes da tragédia de 4 de Agosto.

As decisões tomadas pelo Conselho Judicial Superior e os resultados da investigação conduzida por Sawan não são passíveis de recurso, o que coloca uma maior pressão e responsabilidade em todo o processo, daí os receios de que o clientelismo político possa interferir nos resultados da investigação.

Fadi Sawan tem sido responsável, sobretudo, por julgamentos relacionados com questões militares ou de terrorismo, sobretudo contra jihadistas envolvidos na Guerra da Síria. Emitiu centenas de acusações contra militantes do Daesh e da Frente al-Nusra. Fonte próxima do juiz, sob anonimato, diz que Sawan tem “uma postura política clara nas suas decisões” nos casos que envolvem grupos opositores de Bashar al-Assad, mesmo em casos de opositores do regime que não entraram directamente em combate.

Contudo, nos media locais, diz a Al-Jazeera, Sawan “não é conhecido por visitar políticos, nem mesmo os seus colegas juízes” e não tem por hábito “participar em eventos sociais ou políticos”.

Sugerir correcção