A chave chamada António Costa (não o Silva)

O Interior precisa como o ar que respira de investimentos âncora, diferenciadores. Aí, ou se elege um investimento de dimensão transnacional ou será tarde demais.

O Interior do país está “fechado à chave” há muitos anos. É pelas frestas de uma porta que, como uma brisa, tem entrado o seu anorético investimento público e privado. Há uns resistentes que não se aninham, que lutam com todas as forças, que dão voltas à chave, mas a fechadura está viciada e a porta teima em não se abrir. Fora desse universo quase tudo parece inerte e muito próximo de um cemitério de memórias.

O país político não tem tido vontade para apostar numa verdadeira coesão do seu território. As áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, e algum litoral, engolem quase tudo. As diferenças são abissais e mais que conhecidas. Os sucessivos programas de valorização do Interior são mezinhas sem tração para abrir a tal porta já imensamente ferrugenta. Quem tem a chave mestra para inverter isto chama-se António Costa e é primeiro-ministro de Portugal.

O outro, o capacitado António Costa Silva, um lobo solitário que deve estar a enciumar Espanha, país que contratou mais de 100 personalidades das mais diversas áreas para preparar o seu plano de recuperação – por cá bastou uma! – esforçou-se para encontrar uma saída, mas em vez de um rasgo, de uma jogada de mestre, não fez mais do que repisar vacuidades e generalidades que no passado a nada têm conduzido.

Não há um único português que não esteja já saturado da lenga-lenga de que é preciso apostar nas “potencialidades do Interior e nos seus recursos endógenos”. Ninguém duvida disso, mas neste domínio, ou se identificam dois ou três projetos concretos para executar ou não vale a pena perder tempo com o “sexo dos anjos”. O Interior precisa como o ar que respira de investimentos âncora, diferenciadores.

A Europa prendou-nos com 15,2 mil milhões a fundo perdido e todos rejubilámos, ainda assim menos que os gregos, que com uma população próxima da nossa vai receber quase quatro vezes mais… Há agora que definir como gastar essa ‘exorbitância’ e a suprema asneira que se pode cometer é não criar um eixo destinado especificamente à coesão territorial, com gestão e dotação financeira autónoma em relação aos demais. Não gastar pelo menos 1/3 dessa verba em 2/3 do território é desperdiçar uma oportunidade de ouro e é reincidir numa irracionalidade que tem sido mortífera.

O ministro do Planeamento, comportando-se como um centralista dos “quatro costados”, já se pôs em campo com a tese de que as novas verbas devem financiar projetos na região mais rica do país (a AMLisboa). Ora aqui está um triste exemplo do enquistado pensamento português, do mais do mesmo, da desgraçada ideia de que Portugal é Lisboa e o resto é paisagem. Quem pensa um país deve ponderar a construção de aeroportos, novas linhas do metro, ferrovia moderna, produção de hidrogénio e tudo o mais que torne internacionalmente competitivas e atrativas as nossas maiores ‘metrópoles’. O que não pode é ignorar que há um outro Portugal que não anda por si e que está absolutamente refém de uma ajuda publica musculada.

Nesse outro Portugal, avulta a região centro, talvez a mais desfavorecida de todas, a par do nordeste transmontano. Numa e noutra, ou se elege um investimento de dimensão transnacional ou será tarde demais. Haverá sempre opiniões para todos os gostos. Mas no centro, para além de Fátima, já ‘auto-suficiente’ pelo que representa, a ‘marca de água’ é a Serra da Estrela. É nesta região que, a meu ver, se deve colocar o foco. A conceção e construção de um parque temático e de diversões ligado aos desportos de inverno com cariz e projeção internacional pode ser um sonho, pode exigir um arrojo inaudito, comporta riscos, mas é uma receita que transformará para sempre o país e o colocará na rota dos destinos de referência na Europa e no Mundo.

Espanha tem o Parque Warner (e, já agora, o Museu Guggenheim em Bilbao, uma região periférica), França tem a Disney, a Holanda tem a Little Holland. Não há, a meu ver, nenhuma razão para que esta ajuda europeia não seja canalizada para um projeto de vanguarda e para algo icónico, mágico e emblemático. É demasiado forte para nós? Pode ser, mas dos fracos não reza a História…

No meio da enorme competição setorial e ministerial para uso e repartição destes fundos, é ao primeiro-ministro que cabe rodar a chave do sucesso da coesão territorial, abrindo a porta do país para uma dimensão que nunca antes viveu. Está nas suas mãos ficar lembrado por isso ou desaparecer sem glória e sem saudade.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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