Fenprof acusa tutela de violar a lei, mas tribunal dá razão ao ministério

Em causa estão os horários postos a concurso para os professores do quadro. Pode haver um “ou” no caminho dos sindicatos.

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Fenprof lembra que está em causa uma lei da Assembleia da República LUSA/NUNO FOX

A Federação Nacional de Professores (Fenprof) acusou, nesta segunda-feira, o Ministério da Educação (ME) de violar “o quadro legal em vigor” por ter decidido que, a partir do próximo ano, passarão apenas a ser disponibilizados horários completos (22 horas de aulas de um total de 35) nos concursos destinados aos professores do quadro.

Esta decisão foi divulgada através de uma nota que o ME enviou na passada semana à comunicação social para dar conta de um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCA Sul) datado de Abril. Este acórdão tem na base o chamado concurso de mobilidade interna dos professores, um procedimento que se realiza todos os anos para que os docentes do quadro possam tentar aproximar-se de casa, já que muitos estão colocados longe da sua área de residência.

A Fenprof reservou uma tomada de posição para o início de Setembro, adiantando que aguarda também “uma reacção dos grupos parlamentares” a esta decisão do ME que antes já tinha sido “vetada” pelo Parlamento. Só que o acórdão do TCA Sul veio dar razão à opção adoptada pelo ministério no concurso de 2017/2018 de disponibilizar apenas horários completos — o que aconteceu pela primeira vez e levou a que centenas de professores fossem colocados ainda mais longe de casa. Esta decisão, aplicada sem aviso prévio, motivou protestos e recursos aos tribunais por parte de professores. E esteve até na origem de uma guerra entre o Governo e o Parlamento, com os deputados de todos os partidos, à excepção do PS, a posicionarem-se ao lado dos professores. Desta coligação negativa resultou uma alteração ao diploma que regulamenta a colocação de docentes, especificando-se que “no âmbito do concurso de mobilidade interna são considerados todos os horários completos e incompletos recolhidos pela Direcção-Geral da Administração Escolar”.

É pelo facto de este diploma aprovado pelo Parlamento, e promulgado pelo Presidente da República, continuar em vigor, que a Fenprof considera que a decisão agora comunicada pelo ME “viola o quadro legal em vigor”, uma vez que esta deliberação “se aplica ao regime em geral” e não apenas a um concurso. Este não é, contudo, o entendimento do Tribunal Central Administrativo Sul, como já antes também não tinha sido o do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, que decidiu “julgar totalmente improcedentes” as pretensões de quase 200 professores que contestaram judicialmente os resultados do concurso de 2017/2018.

Uma questão de gramática e não só

Desta decisão foram apresentados vários recursos que o TCA Sul também deu como improcedentes em Abril passado, apontando sete razões para tal. Para este tribunal não sobram dúvidas de que a lei aprovada pelo Parlamento, no que à mobilidade interna diz respeito, é “apenas aplicável ao ano lectivo de 2018/2019”, quando o ME se viu obrigado a repetir este concurso, não podendo por isso ser entendida como uma “norma interpretativa” do que se encontra estipulado no regulamento geral dos concursos de docentes.

E sobre este regulamento o tribunal trouxe à liça a importância da gramática, como já aconteceu noutras vezes em que estiveram em causa pretensões dos professores. No caso em apreço trata-se de duas conjunções: “ou”, “e”. Argumenta o TCA Sul que “não se pode concordar que a utilização da expressão ‘ou’ seja inócua” quando no regulamento dos concursos se determina que as necessidades temporárias das escolas são estruturadas em “horários completos ou incompletos” e que compete ao director-geral da Administração Escolar definir o “procedimento de recolha” daquelas necessidades.

“Assim é de concluir que se estabelece uma área de discricionariedade, conferindo-se à administração uma margem de livre apreciação no exercício daquele poder de definição e disponibilização de horários (…), tendo em vista a optimização dos recursos humanos existentes”, frisa-se no acórdão. Onde se aponta a propósito que este “ou” transforma-se em “e” quando estão em causa as reservas de recrutamento, concursos que estão abertos todo o ano lectivo para substituir professores em falta.

No geral, e como já tinha sido defendido pelo Governo, a decisão de começar por colocar professores de carreira apenas em horários completos, “obviando a uma maior despesa na contratação de docente extra-quadro”, revela-se “adequada” e “necessária” por “garantir uma correcta utilização dos recursos humanos e dos dinheiros públicos.

Apesar de existir uma quebra na confiança depositada na administração, o TCA Sul argumenta que “o interesse público deve prevalecer” sobre os “interesses particulares desfavoravelmente afectados pela alteração”, como é o caso da conciliação entre vida familiar e profissional, “pelo que não se mostram violados os princípios da boa-fé e da tutela da confiança”.

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