Cara ou coroa?

Quer se goste ou não, Juan Carlos I de Borbón pode brevemente deixar de ser rei emérito em Espanha, mas, à semelhança do nosso rei Carlos I de Bragança, conhecido pela sua paixão pela oceanografia, vai também ficar no nosso imaginário marítimo, pelo menos ao longo da turística e cosmopolita linha de Cascais.

“Ah, se eu não fosse rei, perderia minha paciência” é uma frase atribuída a Luís XIV (Saint-Germain-en-Laye, 5 de setembro de 1638 – Versalhes, 1 de setembro de 1715), conhecido como “o Grande” e “Rei Sol”, que foi monarca de França e Navarra de 1643 até à sua morte e que pertencia à Casa de Bourbon (que em castelhano se escreve Borbón).

Juan Carlos I, de seu nome completo em castelhano Juan Carlos Alfonso Víctor María de Borbón y Borbón-Dos Sicilias, nasceu em Roma no dia 5 de janeiro de 1938. Foi rei de Espanha de 1975 até sua abdicação em 2014. Agora autoexilou-se devido a uma investigação num caso de corrupção. Tem agora 82 anos e está bastante debilitado em termos físicos.

A placa colocada no monumento designado por Homenagem aos Condes de Barcelona, que existe na rotunda do Estoril que ostenta o nome de Praça Condes de Barcelona, onde a Avenida dos Bombeiros Voluntários se cruza com a Avenida Dom Nuno Álvares Pereira, diz  o seguinte: “Homenagem do Município de Cascais aos Condes de Barcelona D. Juan de Borbón e Dª Maria de las Mercedes de Borbón e seus filhos Pilar, Juan Carlos, Marguerita e Alfonso que viveram no Estoril, no período de 1946 a 1977, legando aos cascalenses perene recordação de simpatia, simplicidade e humanismo” (Data: “Cascais, 12 de setembro de 2000").

Juan Carlos I de Espanha é tido por muitos Portugueses como um amigo de Portugal. Viveu grande parte da juventude no Estoril, onde a partir dos oito anos de idade foi colega de Francisco Pinto Balsemão. Parece que também foi amigo de banqueiros ligados ao grupo Espírito Santo.

Durante as férias da Semana Santa de 1956, mais precisamente na Quinta-feira Santa, 29 de março desse ano, na Vila Giralda, residência de seu pai no Estoril, ocorreu um acidente. Juan Carlos, que tinha na altura 18 anos já feitos, disparou acidentalmente um revólver que vitimou o seu irmão Alfonso, que tinha 14 anos. Segundo Josefina Carolo, empregada da mãe de Juan Carlos, este puxou o gatilho sem saber que a arma estava carregada. Este facto não é referido na sua biografia oficial e continua hoje a constituir um assunto de controvérsia.

Sempre foi conhecido o prazer de Juan Carlos em se expressar na nossa língua quando se dirigia a Portugueses. São muito raros os espanhóis que conseguem ter uma razoável pronúncia quando intentam falar a língua de Camões. Mas Juan Carlos consegue. Apesar de acharmos a monarquia uma forma anacrónica de representação de um Estado; apesar da (minha) opinião de que ser republicano em Espanha é mais ou menos como ser monárquico em Portugal, temos de reconhecer que, quando Juan Carlos passou a ser o Rei de Espanha após a morte de Francisco Franco em novembro de 1975, a grande maioria dos dirigentes políticos portugueses de então anunciou publicamente a sua alegria e quase toda a gente sentiu que Espanha passava a ir finalmente no bom caminho.

A paixão pela vela fez do jovem Juan Carlos um eterno enamorado por Cascais, pela sua baía e pelo Atlântico Português. Foi no Clube Naval de Cascais que aprendeu a velejar quando ainda era Príncipe das Astúrias. Cascais nunca mais o largou. É sócio honorário do Clube Naval de Cascais. O Troféu S.M. Rei Juan Carlos I foi instituído, em 1995. Este evento da classe Dragão tem a sua próxima edição ‒ a 25.ª ‒ anunciada para o período de 28 a 30 de agosto de 2020.

Quer se goste ou não, Juan Carlos I de Borbón pode brevemente deixar de ser rei emérito em Espanha, mas à semelhança do nosso rei Carlos I de Bragança (n. 1863 – f. 1908) conhecido pela sua paixão pela oceanografia, vai também ficar no nosso imaginário marítimo, pelo menos ao longo da turística e cosmopolita linha de Cascais ou costa de Estoril.

Cara ou coroa? Prefiro a cara. Um rosto de uma pessoa é sempre melhor que uma coroa majestática e, pelos vistos, tão efémera quanto as circunstâncias. Com todos os defeitos, a vida é republicana. Viva a República! Os tempos são outros e Guerra Civil nunca mais!

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Sugerir correcção