Queda a pique da receita coloca défice nos 6776 milhões

Durante os primeiros seis meses do ano, a receita fiscal caiu 14%. Um resultado explicado pelas medidas tomadas pelo Governo para aliviar o esforço financeiro imediato das empresas e pela quebra da actividade económica durante a pandemia

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LUSA/TIAGO PETINGA

Mais despesa para pagar o layoff e comprar equipamento de saúde, combinada com menos receita por causa do adiamento de obrigações fiscais e da contracção da actividade económica fizeram do passado mês de Junho um dos piores dos últimos anos para as finanças públicas portuguesas. Chegados a metade do ano e passados um pouco mais de três meses de pandemia, o défice público atingiu já os 6776 milhões de euros, quase metade do valor previsto pelo Governo para o total do ano.

Os dados da execução orçamental até ao final do mês de Junho, publicados esta segunda-feira pelo Ministério das Finanças, revelam um cenário que não é surpreendente para as finanças públicas. A crise económica trazida pela pandemia, já se sabia, não só forçou o Estado a gastar mais como afectou de forma muito acentuada a sua capacidade para cobrar impostos a empresas e famílias em sérias dificuldades.

Durante os primeiros seis meses do ano, dizem os responsáveis do ministério liderado por João Leão, o défice das Administrações Públicas cifrou-se, numa óptica de caixa (contabilidade pública), em 6776 milhões de euros. São mais 6122 milhões (ou quase 10 vezes mais) do que em igual período do ano anterior, revelando a forte derrapagem a que se assiste nas contas públicas.

A pandemia explica, directa e indirectamente, grande parte do resultado registado, mostram os números publicados pelas Finanças.

O efeito directo é aquele que resulta das medidas tomadas pelo Executivo para contrariar a crise e que, no total, atinge os 3733 milhões de euros. As medidas que resultam num aumento da despesa explicam 1310 milhões deste valor: 629 milhões por causa do contributo do Estado para o pagamento da remuneração dos trabalhadores em layoff simplificado, 270 milhões de euros pela compra de equipamentos de saúde e 247 milhões relativos a outros apoio suportados pela Segurança Social.

Em paralelo, do lado da receita, o Governo adoptou medidas de prorrogação do pagamento de impostos, que podem beneficiar as famílias e as empresas em maiores dificuldades.

Como os dados agora publicados pelas Finanças são calculados numa óptica de caixa (não conta o compromisso de receita ou despesa, mas sim se o dinheiro entrou ou não nos cofres do Estado), este adiamento na cobrança de impostos é agora registado e explica, no total, uma redução de 2423 milhões de euros na receita do Estado nos primeiros seis meses do ano face ao mesmo período do ano anterior. Entre estes adiamentos na cobrança destaca-se, segundo as Finanças, o efeito temporário de prorrogação da entrega declaração periódica de rendimentos de IRC de Junho para Julho de 2020. ​

Efeitos indirectos

Mas depois há ainda os efeitos indirectos da crise. Aqui o que está em causa é o impacto que a contracção da actividade económica tem na cobrança de impostos e nas despesas sociais, independentemente das medidas que sejam tomadas pelo Governo. Os números da execução orçamental até Junho mostram que, juntando efeitos directos e indirectos, a receita caiu 9,5% e a despesa aumentou 5,4% face ao mesmo período do ano passado. A quebra da receita fiscal atingiu os 14%.

Até ao final de Maio, a receita caía 0,4% e a despesa subia 7,4%. Nos primeiros cinco meses do ano, o défice registado tinha sido de 3203 milhões de euros, representando um agravamento de 2550 milhões de euros face ao período homólogo, números que revelam que o mês de Junho foi de particular agravamento do desequilíbrio orçamental.

No Orçamento do Estado Suplementar aprovado este mês na Assembleia da República, o Governo prevê, para a totalidade do ano, um saldo negativo das Administrações Públicas numa óptica de caixa (contabilidade pública) de 13.675 milhões de euros, um valor muito semelhante àquele que ocorreria se o défice registado durante a primeira metade do ano se repetisse no segundo semestre.

No entanto, é preciso ter em conta que, durante os primeiros três meses do ano, o Governo ainda beneficiou de uma economia em ritmos de crescimento relativamente elevado.

Na óptica do compromisso (contabilidade nacional), o método contabilístico que conta nos números do défice enviados para Bruxelas, o saldo orçamental previsto inicialmente no Orçamento Suplementar era de 6,3% do PIB, mas entretanto o ministro das Finanças já anunciou uma revisão para 7%, dando como motivo as alterações introduzidas ao documento durante a discussão na especialidade.

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