Reabertura de escolas em Israel foi factor no regresso em força do coronavírus

O país tinha controlado a transmissão, até reabrir demasiado depressa, com as escolas a ter um papel fundamental na disseminação do vírus. Exemplos de outros países mostram que não tem de ser assim.

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Netanyahu reabriu as escolas depois de uma experiência com "aulas cápsula" Reuters
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Protesto em Jerusalém contra a forma como Netanyahu gere a pandemia ABIR SULTAN/EPA
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Israel estava confiante de que a pandemia da covid-19 estava controlada. Com 20 casos diários de infecção em média em meados de Maio, e depois de uma experiência com “aulas cápsula”, em que tudo correu bem, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, anunciou uma série de medidas de desconfinamento, entre elas, a reabertura das escolas. 

A experiência das aulas cápsula incluía ter menos alunos em cada sala, apenas do primeiro, segundo e terceiro anos do ensino básico, em grupos que não se cruzavam. O que se seguiu foi a reabertura total das escolas ao mesmo tempo, o que foi visto como um sinal político de confiança e de que a pandemia estava sob controlo. A decisão foi no entanto, tomada contra o conselho dos peritos, mais cautelosos.

O que aconteceu de seguida foi “totalmente previsível”, comentou num artigo no site Daily Beast o epidemiologista Hagai Levine, da Universidade Hebraica de Jerusalém e presidente da Associação Israelita de Médicos de Médicos de Saúde Pública. 

O número de casos diários de infecção tem vindo a aumentar, e chegou mesmo a ultrapassar os 2000 esta semana em dois dias, quarta e quinta-feira, uma subida imensa comparando com os 20 de há pouco mais de dois meses.

Nesses dias, subiram de tom os protestos nas ruas contra a forma como o primeiro-ministro gere a pandemia, com manifestantes a concentrarem-se em várias cidades, como Jerusalém - e o Governo a dispersá-los com canhões de água. Na subida de tom da contestação, exigiu-se a demissão de Netanyahu.

As escolas parecem ter tido um papel significativo: há duas semanas, um artigo do Wall Street Journal dizia que havia um total de 1335 alunos e 691 professores e outros funcionários infectados. Dados de inquéritos epidemiológicos do Ministério da Saúde mostram, diz ainda o jornal, que após a abertura das escolas houve um pico de infecções entre os jovens, que depois passou para a comunidade.

Segundo dados da direcção geral de saúde divulgados numa audiência parlamentar, no mês passado, entre os locais onde foram registadas as 1400 transmissões do coronavírus, estavam casamentos (185), hospitais (128), sinagogas (116), locais de trabalho (113), restaurantes, bares ou discotecas (108). E escolas: 657, ou seja, 47% do total de novas infecções.

O problema não foi da decisão, mas sim como foi concretizada, dizem vários especialistas. “Não havia uma única escola preparada”, disse Mohammad Khatib, professor de saúde pública no Zefat Academic College em Safed (Norte) ao Daily Beast. 

Os alunos do ensino médio foram os mais problemáticos, disse Khatib. “Os mais novos eram mais obedientes e era mais fácil controlá-los num ambiente de sala de aula, também tinham mais respeito pelos professores”, contou. Os do secundário, mais velhos, tinham mais compreensão. Mas os do ensino médio “têm na sua natureza ser rebeldes, não obedecer ao professor, não usar máscaras ou manter a distância”, comentou.

Piorando a situação, houve uma onda de calor que levou as autoridades a decidir que não era preciso usar máscara nas salas de aula, com turmas que chegavam a 40 alunos por sala.

Inevitabilidade de surtos

“É inevitável que haja surtos nas escolas”, declarou à Science Otto Helve, especialista em doenças infecciosas do Instituto Finlandês de Saúde e Bem-Estar. 

Mas a revista vê “padrões encorajadores” em vários países que recomeçaram aulas após o confinamento, já que o papel das crianças na transmissão do vírus é ainda desconhecido e vários estudos não conseguiram ainda lançar luz sobre a questão.

Em conjunto, estes padrões “sugerem que uma combinação de manter os grupos de estudantes reduzidos e instituir obrigatoriedade de máscaras e alguma distância social ajuda a manter seguras as escolas e as comunidades”. Um dos estudos, feito na cidade de Crépy-en-Valois, arredores de Paris, sugere ainda que as crianças mais pequenas raramente transmitem o vírus umas às outras, ou às suas famílias.

A questão, sublinham, não é entanto apenas essa. “Abrir as escolas com segurança não depende só dos ajustamentos feitos pela escola. Depende também de quanto é que o vírus está a circular na comunidade, que afecta a probabilidade de estudantes e funcionários trazerem a covid-19 para as suas salas de aula.”

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