Teremos a “geringonça” que Costa quiser

Na sua ziguezagueante estratégia de resistência e sobrevivência, e num contexto orçamental complexo, António Costa vai enviando sinais equívocos em todas as direcções.

O PS e o PSD não têm peste. Aproximam-se e distanciam-se num jogo ora delicado, ora desbragado de esgrima. Os dois partidos estão mais distantes nas sondagens, o que é uma proeza para ambos. Por um lado, o Governo não está a sofrer o desgaste da pandemia, do Serviço Nacional de Saúde ou dos layoffs e, por outro, o modelo de oposição seguido por Rui Rio nem aquece nem arrefece. O que nos dizem as sondagens é que o melhor é que as coisas continuem como estão. É este o estado da nação.

O problema é que, como diz o primeiro-ministro, as circunstâncias mudaram. E bastante. Na sua ziguezagueante estratégia de resistência e sobrevivência, e num contexto orçamental complexo, António Costa vai enviando sinais equívocos em todas as direcções. O primeiro-ministro tanto pode contar com o principal partido da oposição para aprovar um acordo suplementar e resolver num ápice a arrastada escolha do presidente do Conselho Económico e Social como é capaz, a seguir, de afastar qualquer cenário “empobrecedor” de bloco central com bastante contundência e dizer que o “PSD é o partido dos velhos do Restelo”.

Há que manter as aparências. O bloco central é quando Costa quiser e não terá de o formalizar. Rui Rio lá estará com as juras de amplo consenso e de oposição cívica e consciente. Quanto mais não seja, para concordar com a diminuição da visibilidade e escrutínio do primeiro-ministro no Parlamento, libertando-o dessa tarefa inútil, para se dedicar ao trabalho que realmente interessa.

De forma elíptica, Costa vai, ao mesmo tempo, transmitindo sinais de aproximação aos partidos de esquerda com os quais fez o acordo parlamentar que lhe assegurou uma tranquila legislatura. Neste tempo de “vacas magras”, o melhor é mesmo poder contar com todos. Para o PS, a pestilência parlamentar não tem assento à esquerda. E, para António Costa, as “vacas até podem continuar a voar”.

A pensar no Orçamento do próximo ano, o primeiro-ministro quer seduzir BE e PCP-PEV, que enjeitou após as eleições, num jogo simulado de aproximações e recuos, com promessas de reforço do serviço público e recusa de austeridade, novas políticas de habitação e combate à precariedade. E voltou a fazê-lo esta sexta-feira no Parlamento. Pode ser verdade que a maioria da população até prefira reeditar a “geringonça” com um PS mais forte, mas foi Costa quem não o quis. Se correr mal, o líder do PSD, que assumiu em Abril passado ter “latitude” para aprovar um Orçamento Suplementar e os Orçamentos dos próximos anos, pode ser a solução. Teremos a “geringonça” que Costa quiser, com quantos parceiros quiser, desde que não tenham a peste. Não é arrependimento, é equilibrismo.

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