Bancos acusam Parlamento de ceder ao “populismo” ao limitar comissões bancárias

Parlamento impôs limites no MB Way e aprovou o fim das comissões de processamento das prestações mensais dos empréstimos à habitação. Presidente da Associação Portuguesa de Bancos diz que decisões limitam a concorrência e ferem receitas legítimas.

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Faria de Oliveira liderou a CGD entre Janeiro de 2008 e Julho de 2011 Ricardo Lopes

Horas depois de o Parlamento aprovar uma série de iniciativas que limitam as comissões a cobrar pelos bancos em transferências digitais e nos empréstimos à habitação, o presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Fernando Faria de Oliveira, decidiu tomar posição sobre as medidas, acusando os deputados de cederem ao “populismo” e de porem em causa o “funcionamento da economia de mercado”, com limitações que, diz, penalizam a recuperação da rentabilidade do sector financeiro.

“A aprovação pela Assembleia da República de um conjunto de diplomas relacionados com comissões bancárias é uma cedência ao populismo. Este conjunto de diplomas suscita diversas questões de constitucionalidade, fere princípios fundamentais do funcionamento da economia de mercado e afronta a racionalidade, a prudência e a preparação do futuro”, contesta Faria de Oliveira, numa nota divulgada na noite de quinta-feira, na qual afirma que as medidas aprovadas “impedem a livre fixação dos preços e limitam a concorrência”.

O Parlamento aprovou limites nas comissões que os bancos podem aplicar aos pagamentos e transferências feitos através de plataformas como o MB Way, tornando obrigatório que as operações de valor mais baixas sejam gratuitas — não haverá comissões para as operações até aos 30 euros, com um limite mensal de 150 euros, ou um máximo de 25 transferências grátis por mês com esse máximo global mensal. Há bancos que já aplicam comissões pelo uso do MB Way, mas há outros que mantêm a gratuitidade. Quando um utilizador ultrapassa aqueles valores, a operação já será alvo de uma comissão (de 0,2% se tiver associado um cartão de débito ou de 0,3% se for feita a partir de um cartão de crédito).

Contra a medida aprovada com os votos do PS, BE, PCP, PEV, PAN e das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues, o presidente da APB questiona: “Qual o incentivo a investir em tecnologia e inovação, proporcionando um melhor serviço e comodidade aos clientes, quando se é impedido de poder cobrar por tais serviços? Qual o interesse, na óptica do investidor bancário, de sediar uma instituição financeira em Portugal, quando pode oferecer serviços financeiros de qualquer outro Estado-embro sem estar sujeito a todas estas limitações?”.

Além desta medida, o Parlamento aprovou ainda uma norma que elimina, para os novos empréstimos à habitação, as comissões de processamento das prestações mensais (ou seja, aquilo que os bancos cobram pela operação de retirar o dinheiro da conta todos os meses para pagar o empréstimo) e tornou gratuita a certidão de distrate dos empréstimos à habitação (a declaração que os bancos emitem quando o contrato do empréstimo chega ao fim).

É contra todo o conjunto de medidas aprovadas que Faria de Oliveira se posiciona. “É inexplicável que, numa situação em que o sector bancário é absolutamente essencial, apoiando famílias e empresas, para a recuperação de uma crise de dimensão sem precedentes, em vez de se contribuir para que a banca esteja nas melhores condições possíveis para o fazer, se adoptem medidas que a fragilizam ainda mais, aumentando custos, como o Adicional de Solidariedade, e proibindo a cobrança de receitas absolutamente legítimas, como é o caso das comissões bancárias”, considera, afirmando que “a banca não é um serviço público gratuito” e que tem de “cobrir os custos do seu funcionamento para garantir o cumprimento das suas obrigações perante os depositantes, financiar a economia e os cidadãos e prestar uma multiplicidade de serviços”.

O ex-presidente executivo da Caixa Geral de Depósitos (CGD) admite que os bancos devem ajudar na resposta à crise, mas considera que as medidas fragilizam o sistema bancário. “Se é inegável que a banca terá que ser parte da solução para a retoma, que razões podem levar à adopção de medidas que o dificultam?”.

Faria de Oliveira afirma que o Parlamento não teve em conta “alguns dos avisos das autoridades de regulação/supervisão, nem as posições, muito sustentadas, das associações financeiras.”

A APB tem como associadas 23 instituições financeiras, entre elas os principais bancos do mercado português, como a CGD, o BCP, o Novo Banco, o BPI, o Santander ou o Montepio.

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