China pede que Reino Unido acabe com “fantasia colonial” em relação a Hong Kong

Pequim e executivo de Hong Kong acusam Londres de interferir nos assuntos internos da China, depois de o Reino Unido ter suspendido o acordo de extradição com Hong Kong. Dominic Raab e Boris Johnson reuniram-se com o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo.

Foto
Lei de segurança nacional entrou em vigor no final do mês de Junho TYRONE SIU/Reuters

Na sequência da suspensão do acordo de extradição entre Londres e a região administrativa especial de Hong Kong, a China acusou o Reino Unido de violar a lei internacional e de interferir nos assuntos internos de Pequim.

“A China urge ao Reino Unido que desista da fantasia de continuar a sua influência colonial em Hong Kong e que corrija imediatamente os seus erros”, afirmou Wang Wenbin, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China, em conferência de imprensa em Pequim, citado pela Reuters. Caso Londres não recue quanto à suspensão do acordo de extradição, continuou, “a China vai contra-atacar as acções erradas do Reino Unido”.

No mesmo sentido, o embaixador da China em Londres, Liu Xiaoming, acusou o Reino Unido de “interferir descaradamente nos assuntos internos da China e de violar a lei internacional e as normas básicas que regem as relações internacionais”.

“A China nunca interferiu nos assuntos internos do Reino Unido. O Reino Unido deveria fazer o mesmo com a China. Caso contrário, terá de lidar com as consequências”, escreveu Liu Xiaming no Twitter, remetendo para um comunicado divulgado pela embaixada chinesa em Londres.

As críticas e ameaças de Pequim surgem no dia seguinte ao ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido, Dominic Raab, ter anunciado na Câmara dos Comuns a suspensão do acordo de extradição com Hong Kong, na sequência da entrada em vigor da lei de segurança nacional imposta por Pequim na região administrativa especial, que os opositores vêem como uma tentativa de a China silenciar os opositores em Hong Kong e pôr termo ao princípio “um país, dois sistemas”, que deveria estar em vigor até 2047.

Entre outras medidas, a nova legislação, que entrou em vigor no final de Junho, prevê prisão perpétua para os culpados de crimes como “secessão”, “subversão”, “terrorismo” e “conluio com forças estrangeiras” e abre a porta ao julgamento de dissidentes na China continental.

O anúncio de Raab coincidiu também com a chegada do secretário de Estado norte-americano a Londres. Mike Pompeo reuniu-se esta terça-feira com o primeiro-ministro, Boris Johnson, e com o ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, e a China, a rede 5G e a situação em Hong Kong foram temas em cima da mesa. “Falaram sobre segurança conjunta e questões de política externa, incluindo as acções da China em Hong Kong e Xinjiang, bem como a situação no Irão e o processo de paz no Médio Oriente”, afirmou Downing Street em comunicado.

Na semana passada, os Estados Unidos puseram fim ao estatuto especial de Hong Kong, uma decisão que foi fortemente criticada por Pequim, e impuseram sanções à China devido à violação dos direitos dos uigures, uma minoria muçulmana, na província chinesa de Xinjiang. 

"Manipulação política" 

A suspensão do acordo de extradição significa que os suspeitos de cometerem crimes em Hong Kong a viverem no Reino Unido não são automaticamente entregues pelas autoridades britânicas para serem julgados na região administrativa. Assim sendo, Hong Kong passa a ter tratamento semelhante à China, que não tem acordo de extradição com o Reino Unido.

O Executivo de Hong Kong, liderado por Carrie Lam, fez eco das críticas de Pequim à decisão britânica e acusou o Reino Unido de “manipulação política”. Além disso, o Governo teme que a suspensão da extradição abra uma brecha para que criminosos fujam à justiça.

“A suspensão unilateral do acordo de extradição por parte do Reino Unido para fins políticos, utilizando a promulgação por parte da China da lei de segurança nacional, é uma absoluta manipulação política”, afirmou um porta-voz do Executivo ao South China Morning Post. “Além disso, é uma grande interferência nos assuntos internos da China e uma grave violação do direito internacional, permitindo que, conscientemente, criminosos evitem a justiça.” 

A decisão Reino Unido surge depois de Canadá e Austrália terem tomado decisões semelhantes, sendo expectável que a Nova Zelândia e os Estados Unidos façam o mesmo em breve. Além de suspender o acordo de extradição com Hong Kong, Camberra prorrogou os vistos temporários de residência para os habitantes da região a viverem no país, que a passam a poder ficar no Austrália mais cinco anos, abrindo a porta à obtenção da residência permanente no final desse período.

Já o Governo dirigido Boris Johnson prometeu abrir caminho à atribuição de nacionalidade britânica para cerca de três milhões de cidadãos de Hong Kong.

O diferendo em relação à região administrativa constitui mais um episódio de tensão entre Londres e Pequim, que se agudizou nas últimas semanas. O Reino Unido decidiu afastar a Huawei da sua rede 5G e tem denunciado o tratamento da minoria muçulmana uigure na província chinesa de Xinjiang, o que tem levado a trocas de acusações entre os dois países.

Sugerir correcção