A Grécia guarda um “segredo sujo”

Em Ptolemaida, 100 quilómetros a Oeste de Salónica e debaixo de uma constante nuvem de pó negro, jaz a maior mina de carvão da região dos Balcãs. Anna Pantelia criou um documento fotográfico revelador do impacto nefando da acção desta indústria sobre os trabalhadores, os habitantes da região e o meio ambiente.

Os olhos de Kostas estão vermelhos devido ao pó de carvão e à poluição atmosférica. Os trabalhadores e a população da mina enfrentam problemas de saúde, incluindo cancro. ©Anna Pantelia
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Os olhos de Kostas estão vermelhos devido ao pó de carvão e à poluição atmosférica. Os trabalhadores e a população da mina enfrentam problemas de saúde, incluindo cancro. ©Anna Pantelia

Existe, a cerca de 100 quilómetros a Oeste de Salónica, na Grécia, uma cidade que guarda um “segredo sujo”. Em Ptolemaidadebaixo de uma constante nuvem de pó negro, jaz a maior mina de carvão da região dos Balcãs — a mesma cuja exploração e conversão assegura 30% do consumo de energia do país. "A maioria das pessoas não tem noção de que existe exploração de carvão no país", assegura a fotógrafa grega Anna Pantelia, em entrevista ao P3. "Muito menos desta dimensão", remata. 

O Governo grego fez, recentemente, um dos maiores investimentos da história recente – 1,57 mil milhões de euros – na construção de duas novas centrais eléctricas na região da Macedónia Ocidental. A mina de carvão de Ptolemaida, um cenário "apocalíptico" de mais de 1600 quilómetros quadrados, é uma enorme fonte de poluição que coloca em risco a saúde dos habitantes da região, não raramente forçados a abandonar as aldeias e vilas para evitar morte prematura. Centenas de trabalhadores da mina e das centrais "sacrificam a sua saúde por tão pouco quanto 680 euros por mês", "enquanto outros são forçados a abandonar as terras e as casas que são 'engolidas' pelo crescimento da exploração", sublinha Anna, em entrevista. "Desde 1976, mais de quatro mil residentes de cinco aldeias que estavam em área agora pertencente à mina foram desalojados", acrescenta.

Quando Anna Pantelia visitou Ptolemaida pela primeira vez, o homem que a conduziu através da larga extensão da mina confessou ter perdido o pai, trabalhador da mina, aos 12 anos. "E quatro dos seis colegas de turno também morreram com cancro", lamentou. "Quase todos os trabalhadores, ou familiares, têm ou tiveram problemas de saúde relacionados com o trabalho. Esta história tinha de ser contada." Anna não teve dificuldade em obter acesso à mina. Mas após a sua entrada, e sobretudo após a publicação do trabalho, a entrada a jornalistas foi barrada. "No dia que se seguiu ao artigo num meio de comunicação social relevante, a direcção da empresa [que foi privatizada durante a última crise financeira] apresentou queixa judicial contra mim, contra o meu trabalho." Greece's Dirty Secret incomodou, mas Anna tenciona dar seguimento ao projecto.

As minas nasceram ainda durante os anos 50, altura em que foram criados cerca de 10 mil postos de trabalho numa zona onde havia escassez de emprego. "Durante mais de 60 anos, foi decrescendo a importância de outros sectores económicos na região", explica Anna. A dependência ecomómica desta indústria, por parte da população, é quase total. "E apesar dos rígidos regulamentos da União Europeia [no que concerne a exploração de carvão e da emissão de CO2] (...), a Grécia, em conjunto com a Alemanha, a Polónia e a República Checa, é responsável por mais de um terço da produção de carvão em todo o mundo." O tipo de carvão que está na base da produção energética de Ptolemaida, o lignito, "está entre as piores fontes de poluição atmosférica do mundo". A Grécia, conclui a fotógrafa grega, "não se resume, afinal, a cenários idílicos, à crise financeira ou de refugiados"

Kostas é um dos trabalhadores mais jovens da mina. Todos os dias limpa a cinza que é produzida pela mina para manter a produção de energia eléctrica. A mina funciona 24 horas por dia, sete dias por semana.
Kostas é um dos trabalhadores mais jovens da mina. Todos os dias limpa a cinza que é produzida pela mina para manter a produção de energia eléctrica. A mina funciona 24 horas por dia, sete dias por semana. ©Anna Pantelia
Kostas supervisiona a escavação de carvão na zona norte da mina de Ptolemaida.
Kostas supervisiona a escavação de carvão na zona norte da mina de Ptolemaida. ©Anna Pantelia
Vista aérea sobre a mina de carvão de Ptolemaida.
Vista aérea sobre a mina de carvão de Ptolemaida. ©Anna Pantelia
Retrato de um dos trabalhadores da mina. Ao todo, são mais de 10 mil os que trabalham nesta indústria, na região.
Retrato de um dos trabalhadores da mina. Ao todo, são mais de 10 mil os que trabalham nesta indústria, na região. ©Anna Pantelia
Um dos trabalhadores recolhe uma amostra de carvão para análise
Um dos trabalhadores recolhe uma amostra de carvão para análise ©Anna Pantelia
Dois trabalhadores limpam as cinzas que rodeiam os tapetes de transporte de carvão.
Dois trabalhadores limpam as cinzas que rodeiam os tapetes de transporte de carvão. ©Anna Pantelia
Retrato de trabalhador da mina.
Retrato de trabalhador da mina. ©Anna Pantelia
Trabalhador da mina transporta cinza de carvão.
Trabalhador da mina transporta cinza de carvão. ©Anna Pantelia
Retrato de Giannis, trabalhador na mina, onde os acidentes são comuns e, não raramente, fatais. As regras de segurança nem sempre são cumpridas. Morreram 106 pessoas, desde 1970, em acidentes de trabalho.
Retrato de Giannis, trabalhador na mina, onde os acidentes são comuns e, não raramente, fatais. As regras de segurança nem sempre são cumpridas. Morreram 106 pessoas, desde 1970, em acidentes de trabalho. ©Anna Pantelia
Retrato de um trabalhador da mina.
Retrato de um trabalhador da mina. ©Anna Pantelia
Há uma igreja abandonada no meio da mina de carvão. É tudo o que resta de Charavgi, uma aldeia que foi expropriada e cujos habitantes foram "expulsos" para a mina poder aumentar de extensão.
Há uma igreja abandonada no meio da mina de carvão. É tudo o que resta de Charavgi, uma aldeia que foi expropriada e cujos habitantes foram "expulsos" para a mina poder aumentar de extensão. ©Anna Pantelia
Anna foi conduzida por um trabalhador cujo pai, também funcionário da mina, morreu de cancro devido à exposição à poluição.
Anna foi conduzida por um trabalhador cujo pai, também funcionário da mina, morreu de cancro devido à exposição à poluição. ©Anna Pantelia
Vista aérea sobre uma vila prestes a ser "engolida" pela mina.
Vista aérea sobre uma vila prestes a ser "engolida" pela mina. ©Anna Pantelia
Vista aérea sobre Ptolemaida.
Vista aérea sobre Ptolemaida. ©Anna Pantelia
A mina da Macedónia Ocidental é a maior da região dos Balcãs e a sexta maior do mundo.
A mina da Macedónia Ocidental é a maior da região dos Balcãs e a sexta maior do mundo. ©Anna Pantelia
O cenário pós-apocalíptico de Ptolemaida.
O cenário pós-apocalíptico de Ptolemaida. ©Anna Pantelia