Bolsonaro tem algo de positivo

O mundo dos que não querem acreditar na gravidade da doença, que envolve pessoas de espectros muito diferentes da sociedade, vai rezar a Deus e ao Sol para que ele seja um portador assintomático.

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"As probabilidades de infecção, de contágio, de evolução para doença grave são isso mesmo: probabilidades" Reuters/Adriano Machado

Estranho mundo em que vivemos. Como disclaimer de honestidade intelectual, assumo desde já que não gosto de rigorosamente nada da personagem Bolsonaro. Representa exactamente o oposto dos meus ideais humanitários. Considero-o um perigo para o Brasil, para a humanidade, para o planeta e como está à vista para ele próprio. Ainda assim tento observar este fenómeno com alguma distância e esforço-me (nem sempre com sucesso) por respeitar ao máximo as pessoas que o apoiam.

Ele já dividiu profundamente as opiniões por (alegadamente) ter afirmações racistas, desprezar os pobres, ser misógino, ridicularizar a protecção do planeta... Mas como se tudo isto não chegasse ainda extremou mais as posições ao ser um apaixonado negacionista da gravidade da covid-19. Chamou-lhe “gripezinha”, (quase) nunca usou uma máscara em público, foi apanhado a insultar o governador de Manaus por abrir valas comuns para a gestão dos mortos e por aí fora...

O Brasil está em segundo lugar, mas há quem diga que poderá ultrapassar os EUA em número de mortos algures em Agosto. Eu não condeno quem tem um discurso honesto ao balançar as consequências gravíssimas da doença com as consequências gravíssimas das medidas para a protecção da doença. Mas negar a comunidade científica é para mim o cúmulo das não-verdades. Ou seja, mentiras!

Mas o que é admirável é como ele agora é o ícone da prova irrefutável da gravidade da doença. O mundo dos que não querem acreditar na gravidade da doença, que envolve pessoas de espectros muito diferentes da sociedade, vai rezar a Deus e ao Sol para que ele seja um portador assintomático... E os que gritam há meses em prol de um confinamento infinito de todos os seres humanos vão querer que Bolsonaro acabe ligado a um ventilador nos Cuidados Intensivos...

Mas a ciência não ouve nenhum dos lados. As probabilidades de infecção, de contágio, de evolução para doença grave são isso mesmo: probabilidades. Despidas de cor, religião, política ou a falta delas.

Estranho mundo em que vivemos, em que se vai querer fazer ciência nas redes sociais através de um caso. Mas a ciência seremos sempre todos nós.

Saúde ao Sr. Bolsonaro e vida muito curta a todas as políticas e filosofias que não pensem numa humanidade global.

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