Covid-19: Directora-Geral da Saúde de Israel demite-se culpando Governo de falhanço

Israel passou de “país inteligente” na gestão inicial da pandemia para uma situação descontrolada que incluiu ter de voltar a impor medidas mais restritivas.

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Benjamin Netanyahu: o Governo israelita perdeu o controlo da pandemia Reuters/POOL New

A directora-geral da Saúde de Israel demitiu-se nesta terça-feira com uma crítica ácida e bem fundamentada sobre o que o Governo de Benjamin Netanyahu fez mal na gestão da pandemia do vírus SARS-CoV-2: um dos países que melhores resultados conseguiu no confinamento tornou-se um dos que pior geriu o desconfinamento.

De 20 novos casos de infecção por dia em Maio, e uma gestão que lhe valeu a inclusão num grupo de “países inteligentes”, promovido pela Áustria, com outros países de sucesso na luta contra a covid-19 como a Nova Zelândia, Israel passou a ter, desde a semana passada, dias com mais de mil novos casos de infecção.

A carta de demissão da directora-geral de Saúde, Siegal Sadetzki, que é epidemiologista de formação, foi mais do que isto, nota a jornalista Noga Tarnopolsky: “Demitiu-se com uma carta precisa, incandescente, uma acusação de 8000 palavras de como o Governo falhou na gestão da crise do coronavírus e que servirá de primeiro capítulo num potencial inquérito sobre o que correu mal”, disse a jornalista no Twitter.

A demissão acontece um dia depois de o Governo de Benjamin Netanyahu ter voltado a impor uma série de restrições, incluindo o encerramento de bares, ginásios e salas de concertos.

O aumento de casos foi inédito, disse o especialista Ran Balicer numa entrevista à televisão pública Kan: “Nenhum país no mundo teve um aumento da morbilidade [casos de doença em relação à população] como em Israel.”

Sadetzki disse que decidiu demitir-se porque os seus avisos sobre o regresso demasiado rápido ao normal foram ignorados. “Os ganhos conseguidos ao lidar com a primeira onda [de infecções] foram cancelados pela abertura geral e rápida da economia”, que em Israel foi feita a um ritmo muito mais apressado do que noutros países, disse numa publicação no Facebook, citada pela Reuters.

Apenas 37% dos israelitas confiam na gestão que o Governo está a fazer da pandemia, contra 59% que não confiam. Enquanto isso, o Parlamento aprovou, às 5h da manhã e com 53 dos 120 deputados presentes (29 votaram a favor, 24 contra), uma lei para que o Governo possa tomar medidas em relação à covid-19 de modo imediato, sem supervisão parlamentar.

Netanyahu, que tem um novo governo de unidade com o seu antigo rival Benny Gantz, graças em boa parte à ameaça do coronavírus e de ser preciso gerir a crise, acusou entretanto Gantz de ser a razão do actual estado de coisas.​ Durante a primeira fase da pandemia, foi a cara do Governo, com briefings frequentes. Agora já não é.

O primeiro-ministro anunciou novas restrições na segunda-feira, “acções limitadas” para evitar, acrescentou, um novo confinamento que poderia ter graves consequências na economia quando o país está já com uma taxa de desemprego de 20%.

Israel, que tem nove milhões de habitantes, tem mais de 31 mil casos de infecções e 338 mortos. Esta terça-feira foi o pior dia em que há registo para o país, com 1137 novos casos (e cinco mortes).

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