Morreu o escritor António Bivar, nome da “nova dramaturgia” do Brasil

Cordélia Brasil, de 1967, foi a sua peça de estreia, e, no ano seguinte, Abre a Janela e Deixa Entrar o Ar Puro e o Sol da Manhã, conquistou o Prémio Molière.

Foto
No programa do Jô, em 2013 cortesia TV Globo

O dramaturgo brasileiro António Bivar, autor de Alzira Power, um dos protagonistas da “nova dramaturgia”, morreu no domingo, em São Paulo, aos 81 anos, por complicações respiratórias resultantes de covid-19, informou o hospital Sancta Maggiore, onde estava internado.

“Neste domingo o Brasil perdeu um de seus grandes escritores”, escreve a imprensa brasileira, recordando títulos de António Bivar, que o site G1 da Globo define como “clássicos do teatro nacional”, como Cordélia Brasil, de 1967, a sua peça de estreia, e Abre a Janela e Deixa Entrar o Ar Puro e o Sol da Manhã, que lhe garantiu o Prémio Molière, no ano seguinte.

Antonio Bivar Battistetti Lima, nascido em Ribeirão Preto, estado de São Paulo, em 1939, faz parte do grupo de jovens dramaturgos, da chamada “geração de 1969”, surgido no final da década de 1960, que opôs o absurdo ao realismo tradicional, inspirado nos movimentos “contra-cultura” da época.

“Dramaturgo, biógrafo, jornalista, contista, romancista, tradutor, actor, guionista, cronista, director e produtor musical”, como o define a Enciclopédia Itaú Cultural, António Bivar frequentou a Fundação Brasileira de Teatro e o Conservatório Nacional, onde se formou como actor.

A ditadura militar (1964-1985) afastou-o do país. Fixou-se no Reino Unido, em 1970, mas continuou a escrever para os palcos do seu país, peças como Longe Daqui, Aqui Mesmo e Alzira Power, a única obra do escritor até hoje representada em Portugal, por iniciativa da coreógrafa Águeda Sena (1927-2019), no âmbito do trabalho de pesquisa que levou a cabo na década de 1980, com a Associação Cultural Teatro Espaço, centrado num ciclo de farsas brasileiras, contemporâneas.

Os títulos de Bivar estendem-se ao ensaio, em obras como O que é punk?, sobre o movimento que viu emergir no Reino Unido, à biografia, em títulos como Yolanda, à análise literária, como Bivar na Corte de Bloomsbury, sobre a obra da escritora britânica Virginia Woolf, e às memórias ou relatos de viagens, como em Verdes Vales do Fim do Mundo, de carácter autobiográfico.

Produziu espectáculos de Maria Bethânia e de Rita Lee, criou a comédia Gente Fina é Outra Coisa, com Alcyr Costa, escreveu Quarteto, em homenagem ao encenador polaco Zbigniew Ziembinski, e foi um dos organizadores do festival O Começo do Fim do Mundo, marco do movimento punk no Brasil.

A biografia do dramaturgo no site do Instituto Itaú destaca as opções formais assumidas por Bivar, inspiradas nas dramaturgias-chave do teatro moderno, de August Strindberg (1849-1912) a Samuel Beckett (1906- 1989), passando pelo francês Jean-Paul Sartre (1905-1980), Eugène Ionesco (1909-1994) e Edward Albee (1928-2016).

Dramas curtos, muitas vezes num único cenário, poucas personagens, muitas vezes marcadas pelo humor e pela estética pop marcam a intensidade da obra de Bivar, de acordo com o perfil disponível na Enciclopédia Itaú Cultural online.

“Gostaria de ser lembrado pelos meus livros”, disse Bivar, numa entrevista recente que é esta segunda-feira citada pela imprensa brasileira, “porque não falo só de mim. Falo das pessoas, do convívio com elas, dos lugares, dos costumes. (...) Meu prazer é falar sobre esses encontros e colocar um pouco de humor, mostrar o lado engraçado da vida. O humor, o absurdo, as situações... Gosto disso, e gostaria de ser lembrado por isso”.

Sugerir correcção