Lipedema: 11 diagnosticaram-me obesa, um enxergou a minha angústia

De lá para cá, depois das diversas cirurgias e de muito pesquisar e lutar por um atendimento digno e responsável, chego à conclusão que a minha luta foi maior pela falta de informação.

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Oleg Ivanov/Unsplash

Aceda ao endereço electrónico do Sistema Nacional de Saúde (SNS) e nada encontrará sobre o tema. Pesquise no Google, “pai dos burros”, e esteja preparado para treinar o inglês. Recorra à Wikipédia, a enciclopédia virtual, e assuste-se a pensar que aquelas pernas podem ser as suas.
Essa é a angústia da falta de informação sobre o lipedema, uma patologia que chega a afectar 12% da população feminina global, mas que ainda é pouco conhecida por cá.

No mês de Junho, lembrámo-nos da importância de se consciencializar sobre o tema, que muitos vivem e nem sequer têm consciência disto.
Convivo com o meu lipedema há seis anos, quando fui diagnosticada. Sobreviver a ele, e apesar dele, no entanto, é algo que faço desde que nasci.
O percurso que trilhei até falar abertamente sobre isso e ser capaz de ajudar outras mulheres a vencê-lo e enfrentá-lo todos os dias não foi e não é nada fácil. 

Como consultora de estética e directora técnica de uma clínica de estética avançada, olhava-me no espelho todos os dias e questionava o que havia de errado comigo. “Mas como é possível? Conseguir resultados fantásticos nos outros e não me conseguir ajudar a mim mesma?”

Uma vida de dietas e rotinas regradas e exercícios físicos não pareciam bastar. A conclusão a que cheguei? Tinha de haver algo mais. Percorri onze especialistas em cirurgia vascular. Uma sucessão de exames que nada diziam. Mas as frases dos médicos ecoavam como um sino na minha mente: “A senhora precisa de emagrecer, se continuar com esta gordura acumulada nas pernas é óbvio que vai continuar a sentir dores e desconfortos. Se fizesse mesmo o que diz que faz, desculpe, mas não estaria assim!”

Eu comia menos a cada dia, nada de álcool, nada de tabaco, nada de nada... Desesperante. Com todo o meu percurso, a balança ainda lá estava a registar os mais de 100 quilogramas. Mas, de quê? No auge do meu desespero, recorri a mais um outro especialista. Também me pesavam imenso as frustrações e as palavras. Como não, se somado ao que já carregava no meu corpo físico, havia dias em que a carga parecia insuportável.

“Dispa-se da cintura para baixo”, pediu-me ele. Vergonha é um sentimento que não cabe aos desesperados. E ouvi a frase que mudaria todo o meu percurso: “Você tem um lipedema nível 3”. Eu não sabia o que era, nunca tinha ouvido falar sobre aquilo, mas soava-me como um alívio. 

Era o começo de uma longa caminhada e de uma difícil batalha. Agora já podia enxergar o meu inimigo, olhos nos olhos. Agora o meu inimigo tinha nome. O lipedema é uma patologia maioritariamente feminina que atinge as células gordas, causando uma acumulação anormal de gordura. Ancas e pernas são as áreas mais afectadas, mas braços também podem ser atingidos. Fui sorteada, tenho em ambas as zonas do corpo. A patologia, já no nível em que eu estava, além de poder causar inúmeras comorbidades (fibromialgia, depressão, etc.) também pode levar à imobilidade dos pacientes — igualmente o meu caso.

De lá para cá, depois das diversas cirurgias e de muito pesquisar e lutar por um atendimento digno e responsável, chego à conclusão que a minha luta foi maior pela falta de informação.

Hoje, escrevo para que vocês, através da minha história, através do meu testemunho de superação diária, já não precisem de passar pelo que eu passei. Sigam em frente, esta luta é nossa, não precisam de ficar sozinhos. Aproveito para deixar aqui o meu agradecimento e a minha eterna admiração a este especial profissional, que enxergou o meu dilema. Conviver com o lipedema é possível.

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