Pedrógão Grande: Relação de Coimbra decide que Valdemar Alves não vai a julgamento

Decisão do Tribunal da Relação de Coimbra dá provimento aos recursos de Valdemar Alves e do Ministério Público. Ricardo Sá Fernandes, advogado de familiares de duas vitimas mortais, diz que não concorda mas que não vai contestar a decisão. Lembra que é possivel que Vlademar Alves seja julgado num processo autónomo.

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Valdemar Alves Daniel Rocha

O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu hoje que o presidente da Câmara de Pedrógão Grande não vai a julgamento no processo sobre as responsabilidades no grande incêndio de 2017, ao dar provimento aos recursos de Valdemar Alves e do Ministério Público (MP).

Valdemar Alves e o Ministério Público tinham apresentado recurso para a Relação de Coimbra, no sentido de o autarca não ir a julgamento neste processo, como pediu, na fase de instrução, uma assistente familiar de vítimas do incêndio.

Agora, a Relação de Coimbra decidiu que Valdemar Alves, que inicialmente não tinha sido acusado pelo Ministério Público, não vai a julgamento no processo que procura aferir as responsabilidades no grande incêndio de Junho de 2017, que vitimou 66 pessoas.

O Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) considerou que o requerimento da assistente para Valdemar Alves ser constituído como arguido padecia de “legitimidade”.

Para isso, os juízes desembargadores sustentam-se no facto de os familiares da assistente terem morrido na estrada nacional 236-1, cuja gestão de faixa de combustível é da responsabilidade da Ascendi e não do município de Pedrógão Grande (que responde por mortes em estradas municipais).

“Não tendo a assistente relação com as vítimas mortais por cujos homicídios por negligência pretende ver pronunciado o recorrente [Valdemar Alves], carece de legitimidade para requerer a instrução”, justificam, no acórdão hoje proferido.

Segundo o TRC, a assistente “não foi admitida para toda a matéria de investigação e objecto de acusação, mas apenas para a matéria relevante para os crimes que vitimaram os seus ascendentes”.

Antigo autarca de Pedrógão vai a julgamento

No mesmo despacho, o Tribunal da Relação de Coimbra determinou ainda que José Graça, antigo vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, vai a julgamento. O antigo autarca tinha sido acusado pelo Ministério Público, mas o juiz da Instrução de Leiria tinha decidido retirá-lo do processo.

O acórdão, assinado pelos juízes Vasques Osório e Helena Bolieiro, concluiu que José Graça “coordenava a actividade desenvolvida por trabalhadores municipais, tendo por objecto a gestão de combustíveis”, nomeadamente nas estradas municipais do concelho onde morreram sete pessoas.

Já relativamente ao comandante distrital de operações de socorro de Leiria à data dos factos, Sérgio Gomes, e ao segundo comandante distrital, Mário Cerol, que tinham sido acusados pelo Ministério Público, mas retirados do processo na fase de instrução, o TRC confirmou a última decisão, decidindo não os levar a julgamento.

Os juízes desembargadores consideraram que Sérgio Gomes não terá “inobservado qualquer regulamento” no que toca ao combate ao fogo, tendo feito consideração semelhante relativamente a Mário Cerol.

No dispositivo, a Relação de Coimbra nega o recurso do Ministério Público para estes dois responsáveis regionais da Protecção Civil irem a julgamento, notando, porém, que a não-pronúncia deve-se “a razões não completamente coincidentes”.

A decisão foi lida à comunicação social pelo escrivão da Relação de Coimbra, Gil Diz.

Assim, vão a julgamento os então presidentes dos municípios de Castanheira de Pêra e Figueiró dos Vinhos, Fernando Lopes e Jorge Abreu (que se mantém no cargo), respectivamente; o na altura vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, José Graça, e a engenheira florestal do município Margarida Gonçalves; o comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Augusto Arnaut; o subdirector da área comercial da EDP, José Geria, e o subdirector da área de manutenção do Centro da mesma empresa, Casimiro Pedro; e três responsáveis com cargos na Ascendi Pinhal Interior: José Revés, António Berardinelli e Rogério Mota.

Autarca pode ser julgado num processo autónomo

 Em declarações ao PÚBLICO, Ricardo Sá Fernandes, advogado de familiares de duas vitimas mortais, que pediram a constituição do Presidente da Câmara Municipal de Pedrógão Grande, Valdemar Alves, como arguido, diz que não está de acordo com a decisão do Tribunal da Relação de Coimbra e sublinha que continua a entender que  a primeira instância decidiu bem quando admitiu a legitimidade da sua representada para o efeito.

“Todavia,  reconheço que é uma questão controversa  e susceptível de diferentes interpretações, pelo que se aceita a decisão da Relação que assim não vai ser por nós contestada, disse acrescentando que, “esta situação não afasta a possibilidade de Valdemar Alves ser submetido a julgamento, como se julga que acontecerá, no âmbito de processo autónomo”.

Segundo o advogado, o Ministério Público já declarou que iria extrair certidão destes autos para efeitos de instaurar esse processo autónomo, uma vez que reconhece a existência de indícios suficientes para o efeito em face da prova documental que, em nome da sua representada, juntou aos autos.

“O Presidente da Câmara de Pedrógão não será assim julgado no âmbito deste processo, mas deverá sê-lo num outro que o Ministério Público já anunciou ir instaurar, como é de elementar justiça”, sublinhou.

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