Quebra de 45% nas encomendas em carteira são mau prenúncio

Inquérito às empresas mostra que, no início de Junho, a produção prevista continuava longe da actividade de há um ano.

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Nelson Garrido (arquivo)

As encomendas em carteira das empresas portuguesas, no dia 1 de Junho, eram 45% mais baixas do que há um ano, o que é um mau prenúncio para a actividade económica. São más notícias para empresários e para trabalhadores, mas sobretudo para aqueles ligados à indústria, visto que este é o sector que mais trabalha com encomendas em carteira.

Num inquérito a 561 empresas nacionais, 58% dos respondentes reportaram que, a 1 de Junho de 2020, a carteira de encomendas era significativamente mais magra do que a 1 de Junho de 2019. Em média, o recuo era de 45%, segundo os dados hoje apresentados pela Confederação Empresarial de Portugal (CIP) e pelo Future Cast Lab do ISCTE, que têm vindo a medir através de inquéritos regulares os sinais da actividade empresarial sob influência da pandemia.

Tal como nas vagas anteriores, a amostra não é probabilística e, por essa razão, não permite inferências para o tecido nacional. Porém, o retrato agora apresentado não pode, mesmo assim, ser ignorado, até porque, como refere Pedro Dionísio, do ISCTE, a conclusão é clara: “A queda de negócios vai-se fazer sentir nos próximos meses, porque sem encomendas, o volume de negócios cai.”

Por outras palavras, ou o cenário muda, com uma recuperação mais rápida de clientes e de encomendas, ou muitas empresas vão continuar a sofrer as consequências da abrupta travagem económica. 

Na segunda-feira, o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, apontou que não há solução para recuperar o Produto Interno Bruto (PIB) perdido no primeiro semestre de 2020 sem as exportações. Intervindo num seminário organizado pela CIP e pelo ISCTE, o governante sublinhou que, antes da pandemia, 45% do PIB provém das exportações. “Se não conseguirmos ter acesso aos mercados externos, seja na UE seja fora dela, dificilmente vamos conseguir retomar os níveis de actividade económica que tivemos no passado”, insistiu Pedro Siza Vieira.

Sectores cruciais como o turismo, que tem grande peso nas exportações de serviços, continuam em dificuldade. E a indústria, apesar da reabertura, está a tentar reconquistar encomendas, porque, como diz Pedro Dionísio, muita indústria exportadora trabalha no regime de encomendas, sem marca própria. O número de trabalhadores no layoff "normal” atingiu o maior valor de sempre em Maio, quase 45 mil trabalhadores.

Irá haver uma transferência de trabalhadores do layoff simplificado para o “normal”, como regulado pelo Código do Trabalho? O inquérito não esclarece esta dúvida, mas João Almeida Lopes, presidente da Apifarma e vice-presidente da CIP frisa que os empresários tinham defendido a manutenção do regime simplificado até ao final do ano, antevendo que a retoma de encomendas e de produção seria lenta.

O inquérito revelou ainda um aumento de 15 pontos percentuais no número de empresas que declararam ter recorrido a crédito bancário e um aumento, na mesma dimensão, do número das que já receberam o financiamento bancário. Há duas semanas, só 47% tinham recebido o dinheiro. Agora, já são a maioria, 62%.

Há ainda 14% de empresas que declararam que pretendem recorrer ao financiamento bancário.

No layoff, 10% dos inquiridos disseram que ainda tencionavam recorrer ao layoff simplificado. As empresas que ainda não tinham pedido acesso a esse mecanismo têm até ao fim do dia de hoje para o fazerem.

A retoma da actividade, apesar da situação precária das encomendas, é agora praticamente total: apenas 3% dos inquiridos continuam encerrados. 

Nos abastecimentos, houve impactos significativos que se mantinham em Maio. Quase um terço (29%) dos respondentes disse ter tido dificuldades em adquirir produtos ou serviços essenciais à laboração nesse mês. Isso repercutiu-se numa quebra nas vendas que, em média, rondou os 32%.

Toda esta instabilidade afectou, como seria de esperar, os prazos de pagamento e de recebimento, mas de forma desigual. A maioria dos respondentes (80%) garante que manteve os prazos de pagamento, com 19% a dizerem que demoraram mais tempo a pagar (em média, mais 34 dias). O cenário não parece tão mau, disse Pedro Dionísio, porque provavelmente as empresas em pior situação estão sub-representadas. “Estão ocupadas a tentar salvar-se e talvez menos dispostas a responder a inquéritos”, admitiu.

Comparando as vendas de Maio passado com 2019, para eliminar sazonalidade, 76% das empresas garantem ter perdido vendas, com a quebra em média a rondar os 49%, o que é muito significativo, salientou João Almeida Lopes.

Neste domínio, há porém a registar que 7% declararam aumento nas vendas que, em termos médios, também é assinalável (+31%).

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