“Dois Juízes em risco de punição disciplinar por queixas cruzadas”

Direito de Resposta de Maria Clara Sottomayor ao jornal PÚBLICO sobre o artigo publicado no dia 25 de junho de 2020, intitulado “Dois Juízes em risco de punição disciplinar por queixas cruzadas”.

O jornal PÚBLICO, em texto de 25 de junho de 2020, intitulado “Dois juízes em risco de punição disciplinar por queixas cruzadas”, da autoria de Mariana Oliveira, volta a mencionar a minha saída do TC, e a referir, a propósito de um artigo de opinião publicado pelo presidente da ASJP em 31 de julho, “Militâncias e Justiça”, que eu comparei violência doméstica e terrorismo no projeto de acórdão por mim apresentado sobre a constitucionalidade da lei dos metadados.

Afirma-se, no escrito publicado em 25 de junho de 2020, que:

 “Tudo começou com um artigo de Manuel Ramos Soares publicado no PÚBLICO a 31 de Julho de 2019 intitulado ‘Militâncias e Justiça’, em que o juiz partia do caso da renúncia de Clara Sottomayor do Tribunal Constitucional, ocorrida uns dias antes, para questionar se era lícito a um magistrado envolver-se ‘activamente como militante de causas sociais, políticas, ideológicas ou religiosas’.”

Manuel Ramos Soares escrevia que, “segundo veio a público”, Clara Sottomayor “ter-se-á recusado a retirar do projecto de acórdão sobre a constitucionalidade da lei dos metadados uma consideração lateral, com que outros juízes não concordavam, que equiparava a violência doméstica ao terrorismo”, o que esta veio a desmentir publicamente mais tarde”.

 Mais adiante prossegue o artigo:

“No caso de Clara Sottomayor estava em causa o facto de ter feito declarações públicas sobre o processo que levou à sua renúncia (e que acabou por ser declarado inconstitucional) após terem sido divulgadas informações que a juíza considerou porem em causa a sua honra e bom nome.”

O jornal PÚBLICO omitiu que os textos que deram origem ao meu desmentido foram publicados pelo próprio jornal PÚBLICO, nos dias 25, 26 e 27 de julho, com base em fontes judiciais anónimas, e omitiu o teor do meu direito de resposta publicado pelo próprio jornal PÚBLICO a 13 de agosto. Por outro lado, qualifica as inverdades divulgadas nesses textos como “informações que a juíza considerou porem em causa a sua honra e bom nome”.

Ora, é um facto notório e do conhecimento público, desde a publicação do meu direito de resposta às notícias divulgadas pelo jornal PÚBLICO nos dias 25, 26 e 27 de julho de 2019 sobre a minha renúncia ao Tribunal Constitucional, que “Não é verdade que o projeto de acórdão que apresentei ao Plenário sobre a lei dos metadados contivesse qualquer comparação entre terrorismo e violência doméstica”.

É um erro, portanto, qualificar essas notícias falsas, divulgadas pelo jornal PÚBLICO e já por mim desmentidas, em 13 de agosto de 2019, no próprio jornal PÚBLICO​, como “informações que a juíza considerou porem em causa a sua honra e bom nome”. Designar uma notícia, desmentida pela pessoa visada, como “informações” é abusivo e tecnicamente errado. Há uma diferença substancial entre publicar uma notícia ofensiva ao bom nome, mas que é verdadeira ou que é um juízo de valor ofensivo, mas não factual, ou divulgar um facto falso, que nunca ocorreu, como se fosse verdadeiro, e assim informar erradamente os leitores. Ora, foi isto que fez o jornal PÚBLICO, nas notícias dos dias 25, 26 e 27 de julho de 2019: revelou que eu teria comparado violência doméstica e terrorismo no projeto de acórdão por mim apresentado no TC, o que nunca sucedeu, conforme o meu direito de resposta de 13 de agosto de 2019.

Quero, por isso, reafirmar o seguinte, por respeito pelo direito dos cidadãos à informação:

– A notícia divulgada pelo jornal PÚBLICO​, nos dias 25, 26 e 27 de julho, de que eu teria comparado, num projeto de acórdão apresentado no TC, violência doméstica e terrorismo não consiste numa mera ofensa ao bom nome, figura sempre de contornos subjetivos e não consensuais, mas numa notícia que não é verdadeira porque relata um facto que nunca ocorreu.

–​ O jornal PÚBLICO, que tem obrigação legal de corrigir este erro, persiste em continuar a divulgá-lo como se fosse uma questão subjetiva e omite a sua responsabilidade na divulgação de uma campanha de desinformação, com base em notícias falsas, que lhe foram comunicadas por fontes judiciais anónimas, acerca dos motivos da minha renúncia ao TC.

–​ O aproveitamento que terceiros fazem de uma notícia falsa para ofender o meu bom nome e os danos que isso me causa são também, por isso, da responsabilidade do jornal PÚBLICO.

Maria Clara Sottomayor

Nota da Direcção: O texto que está na base deste Direito de Resposta diz exclusivamente respeito a queixas cruzadas entre Manuel Ramos Soares, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, e Clara Sottomayor, juíza do Supremo Tribunal de Justiça. A factualidade das queixas, bem como a averiguação disciplinar por comentários feitos na rede social Facebook a propósito da morte de Valentina, não são postas em causa. O que é posto em causa é o destaque dado ao desmentido feito nas páginas do PÚBLICO por Clara Sottomayor às notícias que lhe atribuíam a comparação entre a violência doméstica e o terrorismo no projecto de acórdão sobre metadados. Na notícia objecto do Direito de Resposta, o PÚBLICO refere que a juíza Clara Sottomayor as desmentiu mais tarde e que em causa estavam “informações que a juíza considerou porem em causa a sua honra e bom nome”. O PÚBLICO admite que deveria ter dado mais ênfase a este desmentido. Mas nota que o que estava em causa nesta notícia não eram esses factos objecto de desmentido, mas a polémica subsequente e as queixas cruzadas que acabaram por suscitar.

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