Associações ambientais não temem impacto da covid-19 na floresta

Várias associações empenhadas na prevenção dos fogos florestais tiveram de reduzir ou cortar actividades, nomeadamente as que envolviam voluntários, mas acreditam que isso não terá grande impacto no número de incêndios florestais.

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PAULO PIMENTA

No âmbito das medidas que vigoraram em Portugal suscitadas pela pandemia da covid-19, novas datas e regras foram anunciadas para os trabalhos de prevenção dos incêndios florestais. O prazo para os proprietários procederem à limpeza dos seus terrenos foi retardado, assim como as consequentes acções dos municípios, que deveriam substituir-se aos proprietários em caso de incumprimento. Simultaneamente, a proibição de queimas e queimadas em algumas localidades veio dar um tom ainda mais atípico à preparação da época de fogos, gerando preocupação e receios. A acompanhar esta dinâmica, algumas associações ambientais com operações centradas na preservação da natureza e prevenção de incêndios rurais viram-se também obrigadas a reduzir as suas acções.

Foi o caso da Quercus que previa realizar acções de plantação, integradas no projecto Criar Bosques nomeadamente em zonas atingidas por fogos. Segundo Paula Silva, representante da associação, os cancelamentos ocorreram nos casos em que a participação de “grupos de voluntários” estava prevista, de forma a evitar “ajuntamentos”. “Fizemos algumas plantações depois, com profissionais para cumprir com o objectivo, já que as plantações resultam de doações.” O mesmo destino tiveram as actividades “sessões de sensibilização” e as “acções de educação ambiental” realizadas habitualmente pela associação.

Nas operações de limpeza da floresta, “com impacto directo na prevenção dos fogos”, nenhum evento estava programado pela Quercus para o período em que vigoraram restrições resultantes do surto do SARS-CoV-2. “Fizemos essas acções, em Novembro e Dezembro, visto que elas ocorrem sobretudo no Inverno. Ainda assim, Paula Silva considera que, em alguns casos, “as intervenções que ficaram por fazer até foram uma benesse”. “A limpeza da floresta devia ser algo criterioso. Nós somos um bocado críticos em relação a alguns madeireiros ou operadores florestais que cortaram demasiada vegetação”, esclarece.

Já no caso da Montis, associação que se dedica à gestão de propriedades na zona centro do país, o planeamento de “todas as actividades” foi feito ainda “no início do ano”. Com um programa “bastante forte e intenso”, era comum a dinamização de “actividades, workshops ou oficinas” “quase todos os fins de semana”, explica Jóni Vieira, membro da associação, ao PÚBLICO. As circunstâncias impostas pela situação epidemiológica ditaram, por isso, o cancelamento, nos meses de Março, Abril e Maio, das acções de voluntariado abertas a inscrições externas”.

A excepção foi o trabalho realizado pelos integrantes do projecto Life Volunteer Escape, uma iniciativa apoiada pela Comissão Europeia que prevê o acolhimento, por parte da Montis, de “voluntários do corpo solidário europeu”. “Costumamos ter até oito voluntários que ficam connosco a tempo inteiro, ou seja, fazem cinco dias por semana entre quatro a seis horas de trabalho nas propriedades”. Trabalho esse que pode variar entre a plantação de espécies autóctones, a manutenção de caminhos ou acessos ou a identificação da fauna e flora.

A aposta da associação nos “processos naturais que estão na base da gestão dos combustíveis”, tais como o fogo controlado ou os animais, em oposição à maquinaria, assim como na gestão a “médio e a longo prazo” levam Jóni Vieira a afirmar que, apesar da “redução das actividades”, este não será um factor impactante para a floresta portuguesa e consequentemente no número de incêndios florestais. “Se estivermos a pensar à escala da paisagem - e a gestão do fogo tem que ser pensada à escala da paisagem -, estes três meses não terão assim um impacto por aí além”, resume. O mesmo não se aplica, contudo, à “criação das margens de segurança ao longo das estradas”.

Para a Amo Portugal, associação ambiental que promove actividades em todo o território nacional, a pandemia da covid-19 materializou-se num impedimento para a plantação de “um milhar de árvores”, que neste momento se encontram “em viveiro”, mas também no cancelamento de acções que visavam o “combate à flora invasora”. “Espécies como a mimosa existem na nossa área florestal e não deveria, uma vez que impedem as árvores autóctones de crescer e contribuem activamente para os fogos”, relembra Carlos Evaristo.

No conjunto de eventos promovidos que tiveram a sua realização posta em causa, incluem-se também a iniciativa “Vigilância e Prevenção de Incêndios no Parque Nacional Peneda-Gerês”, concretizada anualmente, que visa a patrulha, por parte de voluntários, “dos trilhos de montanha do parque nacional, numa lógica de vigilância, e na recolha do lixo que encontrem pelo caminho”. Perante a consciencialização de que “evitar o fogo depende de todos” é comum a associação receber contactos de voluntários residentes em outras zonas do país que questionam quais os melhores métodos para ajudar na prevenção de incêndios.

De olhos postos no futuro, Carlos Evaristo ainda alimenta a esperança que a iniciativa “Limpar Portugal”, prevista para 19 de Setembro e que coincide com o World Clean Up Day, ainda se possa realizar. Caso a realização não seja possível nos moldes habituais, a Amo Portugal pedirá aos voluntários “que se responsabilizem pelo seu metro quadrado”. “É como lhe chamamos”, brinca Carlos. “Seria uma área mais restrita, circundante à habitação, à zona de trabalho ou outra à escolha. A ideia é que façam a limpeza individualmente para que depois, no conjunto, estejamos a melhorar o ambiente e o planeta”.

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