Alt TikTok e fãs de K-Pop uniram-se para boicotar comício de Trump?

Um grupo restrito de utilizadores da aplicação, que espalha o caos e gosta de ridicularizar outros, uniu-se aos fãs de pop coreana, e reservaram milhares de bilhetes para o comício de Tulsa. O resultado? Um pavilhão com apenas um terço da lotação.

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Apoiante de Donald Trump, no comício de sábado passado, em Tulsa Leah Millis/Reuters
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Reuters/LEAH MILLIS

O regresso à campanha de Donald Trump, com o primeiro comício em três meses, após uma pausa devido à pandemia de covid-19, era encarado com grande expectativa pela equipa do Presidente norte-americano, que esperava casa cheia em Tulsa, no Oklahoma, no sábado. No entanto, o que se viu foram milhares de cadeiras vazias. Por trás do fiasco podem estar milhares de adolescentes.

Os Bombeiros de Tulsa contaram 6200 pessoas na audiência, muito longe dos 19 mil lugares disponíveis no pavilhão. Utilizadores da rede social TikTok e fãs de pop coreana (K-pop) reivindicaram a responsabilidade pela falta de público para ouvir o Presidente do EUA.

O plano dos jovens foi muito simples: registaram centenas de milhares de lugares no comício de Donald Trump, apesar de não terem qualquer intenção de comparecer, aproveitando uma campanha da equipa eleitoral de Trump, que convidou os apoiantes do Presidente a registarem-se pelo telemóvel, para ganharem ingressos grátis.

A ideia de sabotar o comício tornou-se rapidamente viral e milhares de jovens criaram e-mails falsos e meteram números de telefone falsos na inscrição, para não serem identificados. Entretanto, os curtos vídeos em que os utilizadores do TikTok apelavam a fazer estas inscrições falsas, ou se filmam a fazê-las, desapareceram da internet, sem que ninguém da campanha de Donald Trump tenha dado conta das instruções que foram dadas ao longo da semana. O facto de a partilha funcionar em circuito fechado, impediu que a campanha de sabotagem fosse publicitada noutras plataformas, mantendo-se longe dos holofotes, mas chegando a milhares de pessoas. 

Surgido em 2017, o TikTok é, hoje, um fenómeno global, tendo acabado o ano de 2019 entre as dez aplicações mais descarregadas nos últimos dez anos. O conceito da aplicação passa por promover vídeos virais, desde danças coreografadas a vídeos de maquilhagem, passando por sugestões práticas do dia-a-dia, e é, essencialmente, utilizada por adolescentes.

No entanto, o grupo que reivindicou a sabotagem ao comício de Donald Trump autoproclama-se Alt TikTok, ou Elite TikTok. Conforme explica o The Guardian, os utilizadores do Alt TikTok pretendem espalhar o caos na aplicação, da forma mais criativa possível. Fazem-se passar por contas oficiais de grandes empresas, como a Walmart, e o objectivo é ser engraçado, ridicularizando, muitas vezes, os vídeos de outros utilizadores. 

Além disso, o grupo é restrito e não é fácil encontrar ou identificar os seus membros. Para ter acesso aos conteúdos partilhados pelos seus utilizadores, é preciso “ser-se suficientemente estranho ou cool e passar muito tempo na aplicação até que o algoritmo permita a entrada neste clube exclusivo”, explica o jornal britânico.

No plano entraram também milhares de fãs de K-pop no Twitter, utilizadores habituais do TikTok e com uma grande presença nas redes sociais, que, há algumas semanas, sabotaram uma campanha hostil ao movimento Black Lives Matter, ao inundarem as redes sociais com conteúdos aleatórios com a hashtag #WhiteLivesMatters, tornando impossível que supremacistas brancos a utilizassem para atacar as manifestações anti-racistas.

“O K-pop Twitter e o Alt TikTok têm uma boa aliança, partilham informação muito rapidamente. Eles conhecem os algoritmos e sabem como promover os vídeos para chegarem onde querem”, afirmou o youtuber Elijah Daniel, que participou na campanha de sabotagem ao comício de Donald Trump, ao The New York Times. “Estes miúdos são inteligentes e pensaram em tudo”, acrescentou.

Sem nome e sem rosto 

Depois do comício fracassado, o gestor de campanha de Donald Trump, Brad Pasrcale, desdobrou-se em explicações, acusando a comunicação social de desencorajar a participação dos eleitores falando dos riscos de transmissão da covid-19, tendo chegado a afirmar que manifestantes impediram os apoiantes do Presidente de entrarem no recinto, uma acusação rapidamente desmentida pelos jornalistas no local.

Em resposta a Brad Parscale, a congressista democrata Alexandria Ocasio-Cortez reconheceu que foram os jovens do TikTok e os fãs de K-pop os responsáveis pelo fiasco do comício. 

“Na verdade, vocês foram derrubados por adolescentes no TikTok que inundaram a campanha de Donald Trump com reservas falsas e enganaram-vos, fazendo-vos acreditar que um milhão de pessoas queria ouvir o vosso discurso supremacista branco”, escreveu Ocasio-Cortez.  “Aliados da K-pop, nós vimos e também agradecemos a vossa contribuição na luta pela justiça”, acrescentou.

Nas redes sociais, muitos opositores de Donald Trump cantam vitória e congratulam-se com o fiasco do primeiro comício da campanha eleitoral. Contudo, conforme nota o The Guardian, se, por um lado, “é uma piada” alguns adolescentes terem sabotado um comício polémico, em plena pandemia de covid-19 e numa altura em que a América debate o seu racismo estrutural e a violência policial, que Trump desvaloriza, por outro, não deixa de ser verdade que a sabotagem levanta várias questões quanto a uma possível interferência estrangeira.

 “Trata-se de um grupo sem nome e sem rosto de trolls da internet que, propositadamente, interromperam um evento da campanha eleitoral do Presidente dos Estados Unidos, sem mencionar que um grande número de contas tem origem em países estrangeiros (neste caso, a Coreia do Sul), e o TikTok é propriedade da ByteDance, uma empresa sedeada em Pequim”, escreve a jornalista Matilda Boseley.

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