Um momento de publicação independente: Coreia

Fanzines, edições de autor, livros de artista — nesta rubrica queremos falar de publicação independente. O director João dos Santos Martins apresenta Coreia.

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João dos Santos Martins

Apresenta-nos a tua publicação.
Coreia é um projecto editorial iniciado em 2019, de carácter discursivo e experimental, a propósito das artes em geral, firmado numa relação umbilical com a dança. A publicação tem regularidade semestral e está focada no discurso produzido pelas obras e pelos artistas, preocupando-se em divulgar formatos vários como partituras, manifestos, entrevistas, crónicas, ensaios, críticas e reflexões em língua portuguesa.

Quem são os autores?
Os autores variam de edição para edição. Em geral, há um texto de arquivo inédito que serve de espinha dorsal. Até agora foram textos de Tatsumi Hijikata, Valeska Gert, Sergei Eisenstein e Hélio Oiticica. Depois há uma série de encomendas e propostas originais de artistas, investigadores e espectadores que vão construindo a dramaturgia da edição. Uma das preocupações é garantir uma diversidade alargada de autores, géneros, gerações e cosmovisões de forma a expandir e multiplicar sempre as perspectivas. 

Com três publicações publicadas, contámos com contribuições de Ana Jotta, Ana Pi, Ana Rita Teodoro, Clara Amaral, Christophe Wavelet, Cyriaque Vilemaux, Carlos Azeredo Mesquita, Carlos Manuel Oliveira, Christophe Wavelet, Dasha Birukova, Diego Bagagal, Duarte Amado, Eros404, Felipe Ribeiro, Filipe Pereira, Joana Sá, Luísa Saraiva, Marcelo Evelin, Moriah Evans, Miguel Castro Caldas, Poorna Swami, Rita Natálio, Sílvia Pinto Coelho, Sorour Darabi, Takashi Morishita, Teresa Castro, Tom Engels, Vânia Doutel Vaz, Vânia Rovisco, Zeina Hanna.

A direcção editorial é do artista coreógrafo João dos Santos Martins, o design gráfico de Isabel Lucena, a edição, produção e distribuição da Associação Parasita e Circular Associação Cultural e o site de Sara Orsi. 

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João dos Santos Martins

Do que quiseram falar?
Mais do que falar sobre uma coisa em particular, quisemos, em primeiro lugar, que houvesse um maior intercâmbio entre a produção de conhecimento artístico e o discurso que o acompanha, tanto por parte de quem faz, como de quem experiencia, de forma a fazer dialogar aquilo que é produzido, aquilo que se vê e aquilo que se pensa sobre o que se vê. 

Por outro lado, tínhamos o desejo de publicar escritos de artistas de dança (e não só) que raramente são publicados em Portugal e ainda uma vontade de interseccionalidade dos suportes artísticos, já que a dança continua a ser excluída do circuito das artes visuais e está geralmente circunscrita aos nichos do teatro e da música.

Questões técnicas: quais os materiais usados, quantas páginas tem, qual a tiragem e que cores foram utilizadas?
O Coreia tem uma média de 20 páginas e uma tiragem de 3000 exemplares por edição, a preto e branco, mas não exclusivamente. Decidimos imprimi-lo em papel de jornal não só porque nos permite uma grande tiragem a custo reduzido, mas também porque permite que o objecto possa ser permeável a diferentes usos. Pode ser amachucado e dobrado quanto mantido na sua integridade física. Como não tem “valor” material, o jornal pode ser recortado e riscado, passado em mãos, emprestado, mas também cuidado. Isso é essencial.

Onde está à venda e qual o preço?
Como temos apoio público, fazemos questão de que a distribuição do jornal seja gratuita e extensível a todo o território nacional. Tentamos fazê-lo chegar a todos os distritos do continente e ilhas. No nosso site, encontram-se os pontos de distribuição. Neste momento, e dadas as extraordinárias circunstâncias, disponibilizamos a última edição do Coreia para envio gratuito ao domicílio. Para isso basta preencher este formulário.

Porquê fazer e lançar edições hoje em dia?
As edições são tão relevantes hoje como em qualquer outro momento. Se a democratização do acesso à Internet possibilita publicar e lançar todo o tipo de materiais a qualquer momento, se permite que cada leitor possa ser o próprio “editor” daquilo que quer ver e ler, uma edição obriga sempre o leitor a confrontar-se com o que não sabe ou não quer saber. E isso é essencial para uma sociedade em constante transformação. 

Pensando na questão dos formatos, também é importante considerar que a materialidade do digital não substitui a do papel. São complementares. E são diferentes experiências de leitura e de relação com os objectos. A forma de pensar para digital e analógico também é diferente. Às vezes, há quem que não queira escrever para papel porque a impressão fica para sempre e, portanto, exige mais tempo de reflexão, mais dedicação à escrita. É um preconceito, mas esta projecção de que o objecto ficará materialmente para sempre também é indicativa de uma maneira de pensar e escrever, e tem uma tradição distinta. Por oposição, há quem não queira publicar nada online para que não possa ser ilimitada e descontroladamente partilhada.

Recomenda-nos uma edição de autor recente lançada em Portugal.
A chancela  ed.______, do Teatro Praga e da Sistema Solar, acaba de lançar Curta introdução a um catálogo sem autor, um catálogo encontrado e prefaciado pelo coreógrafo francês Cyriaque Villemaux que é uma preciosidade.

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