Provedoria de Justiça: queixas sobre prisões baixam e aumentam as relacionadas com saúde

Maria Lúcia Amaral apresentou na Assembleia da República o relatório anual das actividades da provedoria de justiça. Com as 51.313 solicitações através dos diversos canais à disposição dos cidadãos, um novo recorde foi atingido em 2019 à semelhança do que já tinha acontecido em 2018.

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Rui Gaudêncio

As queixas junto da provedoria de justiça, relacionadas com a saúde, aumentaram de 262 para 357 em 2019. Houve mais 95 queixas nesta área do que em 2018, de acordo com o relatório da provedora referente a 2019 apresentado esta quinta-feira na Assembleia da República. O documento está disponível para consulta na página deste órgão independente do Estado, criado em 1975 para defender as pessoas que se sintam prejudicadas.

Na educação, direitos dos estrangeiros ou nacionalidade e ainda sistema prisional, que são as áreas mais expressivas que também compõem a unidade que trata as queixas relacionadas com direitos, liberdades e garantias, o número diminuiu, lê-se no documento de mais de 200 páginas da responsabilidade de Maria Lúcia Amaral, Provedora de Justiça desde Novembro de 2017.

Em 2019, a provedora de Justiça recebeu 51.313 solicitações através dos diversos canais à disposição dos cidadãos (mais 6,6% do que em 2018). E desse universo, foram abertos 9823 procedimentos por queixa, o que se traduz um aumento de 5% face a 2018.

Comparando com 2017, o crescimento dos novos procedimentos de queixa é de 26%; tomando por referência 2016, o aumento é ainda mais acentuado e cifra-se em 42%. “Os indicadores de actividade voltaram, portanto, em 2019 a atingir um novo recorde”, que já tinha sido atingido no ano passado, lê-se no comunicado enviado. 

Ainda segundo o comunicado, “voltaram a predominar as reclamações em matéria de Segurança Social, que em 2019 representaram 36% do total de queixas instruídas, após um crescimento de 21%, que se seguiu a subidas de 39% e de 37% em 2018 e 2017, respectivamente”.

Assim, e desde 2016, “o número de procedimentos de queixa sobre questões relativas aos regimes de protecção social mais do que duplicou”. Manteve-se em 2019, a predominância das reclamações sobre atrasos no processamento e pagamento de pensões.

Dificuldades na Saúde

O aumento de 38% na saúde foi “significativo”, considera Maria Lúcia Amaral, e deveu-se essencialmente a quatro questões: o acesso ao SNS por cidadãos estrangeiros e nacionais; o funcionamento dos subsistemas, em particular com situações de atraso no pagamento de comparticipações; o transporte não urgente e ainda a demora na emissão de atestados médicos de incapacidade multi uso.

No que diz respeito ao acesso ao SNS por cidadãos estrangeiros, não titulares de autorização de residência, a provedora destaca “o conjunto de intervenções” que tiveram de ser desencadeadas “quer junto dos próprios interessados, quer dos serviços de saúde, em geral agrupamentos de centros de saúde, para clarificação do alcance e operacionalização do acordo existente entre Portugal e Brasil”.

Este acordo “garante igualdade de tratamento nos respectivos sistemas públicos, mesmo de não residentes”. Aqui sobressaiu “a falta de informação a respeito destes instrumentos particulares”. O relatório refere ainda as situações em que “há falta de médico de família e de recusa de inscrição em unidade de saúde familiar (USF) por esse mesmo motivo”.

Ainda na temática dos Direitos, Liberdades e Garantias, a queda mais acentuada no número de queixas registou-se nas prisões: de 242 em 2018 para 156 queixas em 2019. Como no ano anterior, a maioria deveu-se ao acesso a cuidados de saúde (em 36 casos) mas, mesmo por essa razão, o número desceu para quase metade relativamente a 2018: de 61 para 36.

Aqui, o documento que apresenta a situação vivida em 2019 realça que “muitas dificuldades se devem a constrangimentos das próprias unidades de saúde, a combinação das mesmas com as dificuldades próprias dos serviços prisionais, como a falta de recursos humanos e de veículos para garantir todas as deslocações previamente programadas”.

"Danos” para os reclusos

A conjugação destes factores “produz resultados particularmente danosos”, resume a provedora que salienta que nem sempre “prevalece o princípio da igualdade de tratamento, entre quem se encontra ou não em liberdade”.

Isso deve-se ao facto de os adiamentos provocados pela não comparência, no caso dos reclusos, serem mais penalizadores, porque são fruto de constrangimentos que lhes são alheios e por isso que não lhes são imputáveis, como por exemplo, quando faltam a uma consulta por não haver veículos ou guardas prisionais que os possam acompanhar nesse dia e nessa hora.

 “Na verdade, em meio livre é mais raro que ocorra não comparência por motivos não imputáveis ao próprio utente. Deste modo, o efeito decorrente da necessidade de se aguardar por novo prazo é distinto, num e noutro cenário”, conclui. E essa distinção deve ser tido em conta no momento de ser marcada nova consulta, alerta Maria Lúcia Amaral. 

No sistema educativo, o número de queixas permaneceu mais ou menos no mesmo patamar, embora este ano, uma das questões prevalecentes, relacionadas com o alargamento da universalidade da educação pré-escolar, deveu-se à dificuldade em garantir essa universalidade “em regiões com oferta insuficiente, em particular nas zonas periféricas das grandes áreas metropolitanas”.

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