Empresas que não adiem investimento têm desconto de 20% no IRC

São elegíveis despesas até cinco milhões de euros em activos tangíveis e intangíveis produtivos. Porém, tudo o que seja passível de uso pessoal fica de fora.

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LUSA/ANTONIO PEDRO SANTOS

Mais de 80% dos empresários inquiridos em Maio num painel de mil gestores afirmaram que tencionavam adiar parcial ou totalmente investimentos nas empresas por causa da recessão económica. Para tentar cativar alguns desses empresários, o Governo incluiu na proposta de Orçamento Suplementar um Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento II (CFEI II) que permitirá deduzir na colecta do IRC 20% das despesas em activos produtivos e que não ultrapassem os cinco milhões de euros. 

Segundo o Orçamento Suplementar apresentado esta terça-feira e entregue no Parlamento, podem beneficiar do CFEI II empresas comerciais, industriais ou agrícolas, sujeitas a IRC e que tenham contabilidade organizada, cujo lucro tributável não seja determinado por métodos indirectos, não tenham dívidas ao fisco nem “cessem contratos de trabalho durante três anos, contados da data de produção de efeitos” do crédito fiscal, nem “ao abrigo do despedimento colectivo” nem do “despedimento por extinção do posto de trabalho”, tal como definidos no Código do Trabalho.

O incentivo, que segundo o secretário de Estado do Orçamento, e futuro ministro das Finanças, João Leão, visa premiar as empresas que não adiem investimentos, “corresponde a uma dedução à colecta de IRC no montante de 20% das despesas de investimento em activos afectos à exploração”. Essas despesas têm de ser feitas entre 1 de Julho de 2020 e 30 de Junho de 2021. E o montante acumulado máximo das despesas de investimento elegíveis é de cinco milhões de euros, por empresa.

“A dedução será feita na liquidação de IRC respeitante ao período de tributação que se inicie em 2020 ou 2021, até à concorrência de 70% da colecta deste imposto, em função das datas relevantes dos investimentos elegíveis”, lê-se no documento.

Nas empresas cujo período de tributação não seja coincidente com o ano civil e com início após 1 de Julho de 2020, “as despesas relevantes para efeitos da dedução são as efectuadas em activos elegíveis desde o início do referido período até ao final do décimo segundo mês seguinte”.

Há um tecto na dedução, já que “não pode ultrapassar, em relação a cada sociedade e por cada período de tributação, o limite de 70% da colecta que seria apurada pela sociedade que realizou as despesas elegíveis, caso não se aplicasse o regime especial de tributação de grupos de sociedades”.

Mas “a importância que não possa ser deduzida pode sê-lo, nas mesmas condições, nos cinco períodos de tributação subsequentes”.

No caso de haver fusões, cisões, entradas de activos e permutas de partes sociais que resultem na reorganização da empresa, o benefício pode manter-se válido, mas como determina o Estatuto dos Benefícios Fiscais, terá de haver autorização do Ministério das Finanças, que terá de verificar os pressupostos do benefício e se “fica assegurada a tutela dos interesses públicos com ele prosseguidos”. 

Entre o investimento elegível, incluem-se “activos afectos à exploração, activos fixos tangíveis e activos biológicos que não sejam consumíveis, adquiridos em estado de novo e que entrem em funcionamento ou utilização até ao final do período de tributação que se inicie em ou após 1 de Janeiro de 2021”. Além disso, podem ser elegíveis activos intangíveis, sujeitos a depreciação no mesmo prazo (entre Julho de 2020 e Junho de 2021) como projectos de desenvolvimento, patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo.

Acrescentos a investimentos em curso, desde que correspondam a acrescentos de activos podem também ser candidatados a este benefício. Pelo contrário, as transferências de investimento em curso para o período do benefício não serão aceites. 

O Governo exclui também todas as “despesas de investimento em activos susceptíveis de utilização na esfera pessoal”. Estas abarcam “viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, barcos de recreio e aeronaves de turismo, excepto quando tais bens estejam afectos à exploração do serviço público de transporte ou se destinem ao aluguer ou à cedência do respectivo uso ou fruição no exercício da actividade normal” das empresas. 

Ficam igualmente de fora “mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo quando afectos à actividade produtiva ou administrativa”, bem como despesas “incorridas com a construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afectos a actividades produtivas ou administrativas”.

“São igualmente excluídas do presente regime as despesas efectuadas em activos afectos a actividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do sector público.”

Nos activos intangíveis, não são consideradas “as despesas de aquisição que resultem de actos ou negócios jurídicos do sujeito passivo beneficiário com entidades com as quais se encontre numa situação de relações especiais”. Por exemplo, empresas do mesmo grupo que transfiram activos intangíveis entre si não podem candidatar essas despesas a este regime.

Os terrenos não são activos adquiridos em estado de novo e, por isso, também não fazem parte das despesas admissíveis.

Outra regra é que os activos “devem ser detidos e contabilizados por um período mínimo de cinco anos ou, quando inferior, durante o respectivo período mínimo de vida útil” ou “até ao período em que se verifique o respectivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização”.

O CFEI II não é cumulável, relativamente às mesmas despesas de investimento elegíveis, com quaisquer outros benefícios fiscais da mesma natureza. Mesmo assim, para João Leão, que tomará posse, na próxima segunda-feira, como ministro de Estado e das Finanças, é “uma medida muito poderosa”.

Para operacionalizar este regime, o Governo isenta as empresas que recorram a ele de cumprir o limite mínimo do imposto líquido de 90% do montante que seria apurado se não houvesse benefício fiscal.

Em caso de incumprimento, a empresa terá de devolver o montante de imposto que não foi liquidado, “acrescido dos correspondentes juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais”.

O Governo já tinha mexido no Código Fiscal do Investimento, que é de 2014 (do tempo do Governo PSD/CDS), através do Orçamento do Estado (OE) 2020, pelo qual permite uma dedução de 10% de IRC, mas que não é cumulativo face às mesmas despesas que venham a ser apresentadas ao CFEI II.

No OE 2020, o executivo fez na altura duas alterações relevantes: alargou de três para quatro o número de anos incluídos no prazo em que as empresas podem deduzir até 10% dos lucros retidos e que sejam reinvestidos em “aplicações relevantes”; e elevou de dez milhões para 12 milhões o montante máximo dos lucros retidos e reinvestidos em cada período de tributação.

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