Estudo de Harvard sugere que o novo coronavírus poderá ter atingido a China no Outono

A investigação analisou imagens de satélite que demonstram um aumento do tráfego automóvel junto a hospitais, assim como o aumento da pesquisa de sintomas na Internet que poderão estar relacionados com a covid-19.

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Unidade de cuidados intensivos de um hospital em Wuhan, na China Reuters/CHINA DAILY

Um estudo realizado pela Universidade de Harvard (nos EUA) analisou imagens de satélite que demonstram um aumento do tráfego automóvel junto a cinco hospitais de Wuhan (na China), no final do Verão e no Outono do ano passado. A investigação também analisou a pesquisa de sintomas na Internet e coloca a hipótese de o novo coronavírus ter surgido e ter-se propagado na China antes de o surto ter sido declarado.

O SARS-CoV-2 foi detectado pela primeira vez em Wuhan, em Dezembro de 2019. No entanto, existia “claramente alguma perturbação social em curso muito antes de ser identificado o início da pandemia do novo coronavírus”, afirma John Brownstein, que participou na investigação e é epidemiologista e professor na Universidade de Harvard, em declarações à ABC News.

A equipa teve como ponto de partida a lógica de que as doenças respiratórias levam a tipos de comportamento muito específicos nas comunidades onde se estão a propagar. Analisar imagens que demonstram essas atitudes poderia ajudar a explicar o que se estava a passar. “Algo estava a acontecer em Outubro”, garante Brownstein, que também é responsável de inovação no Hospital Pediátrico de Boston (EUA).

Por isso, a equipa procurou olhar para a actividade dos hospitais através dos parques de estacionamento. “Se há mais carros num hospital, o hospital está mais ocupado, provavelmente porque algo está a acontecer na comunidade, uma infecção está a crescer e as pessoas têm de consultar um médico. Vimos isto em múltiplas instituições”, explica o investigador norte-americano.

Da análise de imagens de satélite entre 2018 e 2020, a equipa concluiu que houve um aumento da ocupação hospitalar, tendo em conta o maior número de carros nos parques de estacionamento. O aumento começou a verificar-se em Agosto de 2019, atingindo um pico em Dezembro.

Foram analisados seis hospitais situados em Wuhan. No Hospital Tianyou, por exemplo, estavam estacionados 171 carros no dia 10 de Outubro de 2018. A 17 de Outubro de 2019 contavam-se 285 carros, um aumento de 67%, de acordo com dados citados nos investigadores à ABC News.

Noutro caso, enquanto em Outubro de 2018 o Hospital Materno-Infantil de Hubei tinha 393 carros no parque de estacionamento, em Outubro do ano passado contabilizava 714.

Contudo, Brownstein considera que são necessários muitos estudos para perceber completamente o que se passou. O estudo em que colaborou faz parte de um “conjunto crescente de informações que apontam para algo que estava a acontecer em Wuhan na altura”, afirma.

Pesquisa de sintomas na Internet

Além das imagens de satélite dos parques de estacionamento dos hospitais, a equipa de investigação também analisou as pesquisas de termos relacionados com sintomas no Baidu, um dos principais motores de busca na China, entre Abril de 2017 e Maio de 2020.

Em Setembro e Outubro de 2019, o aumento do tráfego junto a cinco dos seis hospitais em análise coincide com um maior número de pesquisas dos termos “tosse” e “diarreia” no Baidu. O aumento da pesquisa pela palavra “tosse” surge nos períodos que normalmente correspondem à gripe, enquanto a palavra “diarreia” foi pesquisada maioritariamente no final de 2019.

Os sintomas mais comuns da covid-19 são febre, tosse e dificuldades respiratórias, mas há outros sintomas que têm sido associados à doença em diferentes países, como é o caso da diarreia, vómitos ou urticária.

Existem estudos anteriores que demonstram que “aquilo que as pessoas pesquisam online é um indicador da doença na população”, considera Brownstein. “Vimos pessoas a pesquisar sintomas que podem estar relacionados com a covid-19: diarreia, tosse. Isso começou no final do Verão”, diz o epidemiologista à ABC News.

A equipa de investigação refere no estudo que não confirma que o crescimento do tráfego automóvel junto aos hospitais e o aumento da pesquisa de sintomas esteja directamente relacionada com o novo coronavírus. “Não podemos confirmar a 100% o que era o vírus que estava a causar esta doença e o que estava a provocar este movimento nos hospitais”, esclarece ainda Brownstein.

Ainda assim, lê-se no estudo que o aumento das duas situações se verificou antes de o surto ter sido declarado e é também colocada a hipótese de a transmissão comunitária poder ter causado casos mais agudos, com cargas virais mais elevadas.

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