PS, BE e PCP demarcam-se de cartazes contra polícias na manifestação anti-racista

Deputada bloquista recusou que as regras de ajuntamento de pessoas tenham sido desrespeitadas.

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Beatriz Gomes Dias lamentou o arquivamento generalizado das queixas de racismo Nuno Ferreira Santos

As manifestações anti-racistas do passado sábado voltaram a ganhar vida na discussão desta segunda-feira à tarde no Parlamento. A deputada do BE Beatriz Gomes Dias saiu em sua defesa e foi confrontada pela direita com a presença nessa iniciativa de cartazes contra a polícia, o que levou a própria parlamentar e outros deputados à esquerda a condenar as mensagens.

Numa declaração política no plenário da Assembleia da República, Beatriz Gomes Dias considerou que “as pessoas saíram à rua contra um sistema, contra uma cultura de opressão, que desprotege as pessoas racializadas”, aludindo às manifestações em Portugal no passado sábado contra o racismo em homenagem à morte do norte-americano George Floyd.

A deputada insurgiu-se contra os números de arquivamento dos processos na comissão pela Igualdade e contra a Discriminação Racial (entre 2006 e 2016, foram arquivados 80% dos processos instruídos” e “75% de queixas” de racismo contra as forças de segurança).

No período de interpelações, o líder da bancada do CDS, Telmo Correia, assumiu a condenação do racismo, mas desafiou a deputada condenar os cartazes exibidos por alguns manifestantes que diziam “polícia bom é polícia morto”. André Ventura, do Chega, apontou outro exemplo captado noutro cartaz – “o Diabo veste farda” – e insistiu que a deputada se demarcasse das mensagens, o que aconteceu. “É evidente que o BE se demarca de afirmações que têm aquele teor mas que não traduzem de forma nenhuma o espírito e o compromisso daquelas pessoas”, afirmou, criticando os deputados mais à direita por escolherem em “milhares” de cartazes dois exemplos para tentarem “retirar toda a legitimidade da manifestação”. 

A mesma leitura foi feita pela socialista Isabel Moreira, considerando que os cartazes são “absolutamente condenáveis”. Já António Filipe, do PCP, foi mais longe e saiu em defesa das forças de segurança – “temos de contar com eles na luta contra o racismo” – além de sublinhar a inequívoca condenação dos cartazes em causa.

A deputada do PSD Catarina Rocha Ferreira juntou a condenação a “alguns participantes” da manifestação com mensagens “que incentivam ao ódio” à questão do risco para a saúde pública por causa do ajuntamento de pessoas desaconselhado pela DGS. A esta pergunta, a deputada do BE respondeu rejeitando que as regras tivessem sido desrespeitadas. “Reitero que foi uma manifestação pacífica, ordeira. O número de pessoas que se mobilizaram foi superior àquela que os organizadores pensavam, tiveram todos os cuidados – distribuição de máscaras e gel para quem não tinha. Por isso, não podemos dizer que as regras foram desrespeitadas”, afirmou.

A polémica com os cartazes viria, de novo, a ser aflorada na sequência da declaração política de André Ventura em que rejeitou a existência de “racismo estrutural” em Portugal. “O racismo estrutural é um fantasma que nos querem trazer para esconder outros temas como Novo Banco, afirmou, questionando uma alegada dualidade de critérios: “Como é que podemos chorar a morte de George Floyd e não chorar a morte de um são-tomense aqui no Seixal?”

Em jeito de desafio, a intervenção terminou com o próprio deputado a assumir que diria uma frase racista “talvez a mais racista dita no Parlamento”: “Digam-me um distrito onde não exista um problema com a comunidade cigana”. Logo depois a líder da bancada do PAN insurgiu-se. “O que acabámos de ouvir é uma irresponsabilidade, porque o racismo mata”, disse Inês Sousa Real, condenando um discurso que “não tem consideração pelas pessoas que morrem por racismo” A deputada desafiou André Ventura a avançar com “respostas” e não dar apenas “discursos fáceis e populistas”.

A socialista Catarina Marcelino qualificou o estilo de Ventura como radical e o discurso como “extremista”. “É lamentável que o Parlamento defenda a igualdade e o senhor deputado vem defender discurso de ódio. Sim, somos contra a morte numa situação de crime, todas as mortes, o senhor é só contra as mortes de alguns. O senhor tem problemas com o sistema democrático”, disse a deputada, desafiando Ventura a definir o que entende por IV República. O líder (demissionário do Chega) recusou que seja “um terceiro Reich”, mas sim um regime só com 100 deputados, em que se paga metade dos impostos e que não tem um “Presidente fantochada”, mas sim “um Presidente que decide”.

PAN quer passageiros de avião sujeitos a teste prévio à covid

A questão da saúde pública e mais precisamente o reforço do controlo sanitário nos aeroportos nesta fase de desconfinamento foi o alvo da declaração do PAN. André Silva mostrou preocupação com a falta de controlo sanitário nos aeroportos. “Ao não impor um reforço de controlos nos aeroportos, esquecemo-nos que um abrandamento na frente da saúde pública pode significar uma antecipação da segunda vaga, que, se surgir demasiado cedo, poderá constituir a machadada final na economia e em particular no turismo e na restauração, de forma totalmente contraproducente”, disse o deputado. 

O porta-voz do PAN anunciou a entrega de uma proposta que “passe a ser exigida à chegada que os passageiros apresentem uma declaração de saúde comprovativa de teste negativo da covid-19 realizado 48h antes do embarque”. “Só assim podemos dar a confiança necessária a quem cá está, mas também a quem nos queira continuar a visitar”, sustentou. A medida teve, pelo menos, um apoio no hemiciclo. O BE, pela voz de Moisés Ferreira, defendeu que “a realização de inquéritos epidemiológicos à entrada no país é uma boa prática”.

PSD diz que o PCP parece o filho que detesta os pais mas lhes pede dinheiro

Na sua declaração política, o PCP criticou a “falta de resposta adequada” da União Europeia à covid-19: Paula Santos argumentou que a pandemia mostrou a necessidade de apostar na soberania alimentar e industrial, de recuperar o controlo sobre sectores estratégicos e de recusar a submissão às regras europeias e renegociar a dívida pública. Criticou o “foguetório” em torno do programa de 750 mil milhões de euros e o “deslumbramento” do Governo perante os 26 mil milhões destinados a Portugal que são, disse a deputada, “claramente insuficientes” – e deveriam chegar totalmente sob a forma de subvenções e não em parte de empréstimo – tendo em conta as contribuições que os cofres nacionais já fizeram.

Nas interpelações, a social-democrata Isabel Meireles criticou o PCP por não querer regras nem condicionamentos mas exigir muito mais fundos do que aqueles que estão previstos – “parecem os filhos que detestam os pais e os vilipendiam mas estão sempre de mão estendidas para ter a sua mesada”. O centrista João Almeida também criticou o “discurso negacionista da UE” e defendeu que o importante é saber as condições exigidas a Portugal para receber os apoios implicam co-pagamentos e condições. Já o socialista Capoulas Santos elogiou e defendeu o plano da Comissão Europeia e a mutualização da dívida. A bloquista Fabíola Cardoso quis saber se o PCP concorda que todas as ajudas deviam ser a fundo perdido e o ecologista José Luís Ferreira defendeu que os apoios não abranjam o sector energético e petrolífero.

Na resposta, a comunista Paula Santos acusou PS, PSD e CDS de “falarem sempre numa lógica de subalternização de Portugal” perante Bruxelas, de não olharem para os impactos negativos da integração monetária e de não admitirem que, “entre o deve e o haver”, o país já pagou mais do que recebeu. “O dinheiro não é suficiente e as regras impedem o investimento onde consideramos que ele é necessário (…) Devem existir contribuições nacionais mas de acordo com o princípio de que os países mais ricos devem contribuir mais”, defendeu a deputada acrescentando que o PCP defende a possibilidade de financiamento directo do BCE através de compra de títulos da dívida.

CDS e Bloco trocam acusações de demagogia sobre a Saúde

Numa espécie de antecipação dos argumentos que serão esgrimidos na terça-feira no debate sobre a apreciação parlamentar do decreto-lei sobre as PPP na Saúde, a centrista Ana Rita Bessa escolheu para tema da sua declaração política o sector da Saúde para defender que em vez de andar a cancelar consultas e cirurgias para poder responder à pandemia, o Estado deve contratualizar com os sectores privado e social. A centrista lembrou os adiamentos devido à pandemia: 540 mil consultas nos hospitais, 51 mil cirurgias, 400 mil episódios de urgência, 840 mil consultas de medicina geral e familiar. E criticou a resposta “insuficiente” do programa de recuperação do Governo: o novo orçamento não pode servir apenas o “acerto de contas da covid”, tem que reforçar o investimento na saúde em geral.

O bloquista Moisés Ferreira atacou a “narrativa” do CDS que tenciona chegar à conclusão de que é preciso dar mais dinheiro aos privados; o socialista Luís Soares recordou que os centristas fizeram parte do Governo que cortou 2 mil milhões de euros ao SNS. A centrista acusou o Bloco de demagogia e lembrou que foi na anterior legislatura (a primeira do PS) que o sector privado mais cresceu em facturação – “porque se não houver investimento as pessoas não têm outro remédio se não ir aos privados”.

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