Nova dispensa de visto prévio do TdC deixa de fora menos de 10% do valor dos contratos

Actualmente, um contrato feito pelo Estado com despesa abaixo de 350 mil euros não precisa do “OK” do TdC. O Governo vai elevar este limiar para 750 mil euros. Tribunal garante que menos de 10% da despesa fica de fora deste crivo.

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Daniel Rocha

O Governo quer simplificar os processos de investimento e uma das soluções encontradas foi dispensar o visto prévio do Tribunal de Contas (TdC) nos contratos que impliquem despesa pública até 750 mil euros, elevando assim este limiar que actualmente se situa em 350 mil euros. A proposta chegou ao executivo pelas mãos do próprio TdC, que está a rever a sua lei orgânica, e de acordo com informações recolhidas pelo PÚBLICO deverá desobrigar de visto menos de 10% do total de contratos agora sujeitos a este crivo.

Esta não foi a primeira vez que Vítor Caldeira tentou convencer o legislador das vantagens desta medida: “aumentar este limiar de sujeição a visto prévio, que não é revisto há mais de 20 anos, para um valor que seja mais consentâneo com a evolução do tempo e da inflação e com aquilo que é o mercado e os preços de hoje”, explicou o próprio presidente do TdC, em entrevista ao Expresso deste sábado. 

A medida do Governo faz parte do Programa de Estabilização Económica e Social (PEES), que o primeiro-ministro apresentou na quinta-feira, e insere-se no objectivo de agilização da contratação pública. O Governo quer lançar um conjunto de pequenas obras no valor de 523 milhões de euros, entre elas a remoção de amianto das escolas e a criação de faixas de interrupção de combustível. Quando se referiu à dispensa do visto prévio do TdC para contratos até 750 mil euros, António Costa destacou a sintonia da proposta com os objectivos do Tribunal. 

Com este novo limiar (acima dos actuais 350 mil euros, o tal valor que não era actualizado há quase 20 anos) o que fica de fora da análise prévia do Tribunal? Para ter uma resposta a esta pergunta é preciso recorrer aos dados de 2018, último ano para o qual há dados fechados. Ao PÚBLICO, o Tribunal de Contas explicou que a evolução da actividade contratual pública é “demonstrativa do carácter residual dos contratos de valor inferior a 750 mil euros [são menos de 10% do valor total dos contratos submetidos a visto em 2018]”. 

Além disso, o TdC adianta outro motivo para explicar o racional da sugestão dos 750 mil euros. “A Lei do Orçamento do Estado para 2019 fixou em 750 mil euros o valor da dispensa para contratos interligados ou que aparentem estar interligados entre si”. Ou seja, contratos que tenham, por exemplo, o mesmo fornecedor ou o mesmo objectivo. Logo, Os contratos que passarem a ficar dispensados de visto prévio podem depois ser fiscalizados em momento posterior, de acordo com as regras do TdC.

Embora os detalhes ainda não sejam conhecidos, a convergência de posições entre o Governo e o Tribunal de Contas nesta matéria é uma novidade, depois de uma legislatura em que o TdC foi criticado por parte do poder executivo central e local no que toca aos processos sujeitos a visto prévio. Um dos temas que geraram mais fricção foi o projecto da Câmara Municipal de Lisboa de investimento para a construção de casas com renda acessível no Martim Moniz, na capital, que, depois de uma primeira recusa de visto prévio, recebeu entretanto “luz verde” dos juízes conselheiros. Este investimento está avaliado em 10 milhões de euros, pelo que estaria sempre abrangido pela obrigação de pedido de visto prévio.

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