Sob o signo dos oceanos

Dedicamos todos os nossos esforços, todo o nosso tempo e energias a entupir as águas e todos quantos nelas habitam com milhões de toneladas de plástico. E, entupidos pela nossa soberba, de bom grado comemos esse mesmo plástico meses mais tarde à nossa mesa entre votos de bom proveito.

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PAULO PIMENTA

Nascemos sob o signo do oceano, no nosso caso o Atlântico. Passámos, e passamos, a vida inteira a contemplar as suas águas, azuis, infinitas, a fazer cócegas ao céu, a rir, o céu a rir, eu e tu a rir no topo da duna de mãos dadas, no Verão e no Inverno, ao sol e à chuva sem nunca nos cansarmos e não sabemos porquê.

Ou melhor, sabemos muito bem porquê, sentimo-lo em cada centímetro de pele e imediatamente reconhecemos o seu canto de sereia.

Como um íman, caminhamos irremediavelmente na sua direcção e de bom grado voltamos aos braços de Iemanjá, para sempre nas planícies abissais do Atlântico.

Somos os seus filhos, também nós feitos de água e um pouco de terra, e portanto é natural, para não dizer inevitável, o desejo imenso de devolver toda esta água e placidamente regressar às nossas origens.

Partindo deste pressuposto, o respeito e o cuidado por quem nos deu, e dá, vida seriam reflexos naturais no dia-a-dia dos homens deste mundo, do Atlântico ao Índico, do Pacífico ao Árctico e Antárctico.

Ao invés, dedicamos todos os nossos esforços, todo o nosso tempo e energias a entupir as águas e todos quantos nelas habitam com milhões de toneladas de plástico. E, entupidos pela nossa soberba, de bom grado comemos esse mesmo plástico meses mais tarde à nossa mesa entre votos de bom proveito.

Ao invés, despejamos nos oceanos todo o género de químicos, dejectos e lixo, alegre e inconscientemente criando ilhas de detritos com milhares de quilómetros quadrados de extensão em pleno oceano Pacífico. Mas como o Pacífico é lá longe, não nos preocupamos e, sossegadamente, dormimos. Outros não dormem, já não podem.

Sempre mais preocupados em comer, pela pesca excessiva dizimamos populações inteiras, habitats inteiros, por arrasto ou então à bomba. E não, não nos passa pela cabeça esperar pela recuperação das espécies em nome de uma pesca sustentável. Até ao último peixe. 

Vítimas da ganância, dedicamo-nos à queima de combustíveis fósseis à velocidade da luz, acidificando e aquecendo os oceanos, criando um caldo mortal para toda a fauna e flora marinhas. 

Ora, sendo os oceanos responsáveis pela produção de 70% do oxigénio da Terra, mais não é preciso dizer. Basta estar na praia a contemplar as ondas depois de passarmos a duna. O seu movimento não é senão o de um corpo a respirar, até ao último suspiro, até à última onda.

No Dia Mundial dos Oceanos fica aqui este apelo: por favor, passem a palavra, todas as palavras são poucas. 
 

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