O normal deste futebol é mau

O normal deste futebol é mau. É preciso repeti-lo. É preciso que não nos habituemos.

Não é muito fácil encontrar num outro sector da sociedade portuguesa uma nuvem tão negra de negócios estranhos e de suspeita de ilegalidades graves, como a que foi traçada por Paulo Curado na investigação publicada neste jornal.

Nos artigos sobre a relação entre o Benfica e o Desportivo das Aves e sobre a gestão deste clube, é possível encontrar suspeitas de: contratos de legalidade discutível ou de clara ilegalidade, lesivos e injustos para o trabalhador; violações ao regime jurídico do contrato de trabalho do praticante desportivo; violação do princípio da FIFA de permitir a um clube liberdade para a negociação de um jogador; falsas declarações; possíveis empréstimos de futebolistas encapotados; violação dos regulamentos da Liga de futebol para a participação de um clube na competição; contratos com cláusulas lesivas para uma das partes; irregularidades fiscais e contabilísticas; destruição de registos contabilísticos; violação da lei sobre o branqueamento de capitais, estranhos negócios imobiliários. Não é pouco e cresce exponencialmente se lhe acrescentarmos os fios que ligam a outros casos sob investigação. 

Mas também não é muito fácil encontrar outro sector da sociedade em que a revelação destes factos tenha dado lugar, pelo menos até agora, a tão ruidosa manifestação de silêncio por parte das autoridades reguladoras e entidades públicas a quem compete fiscalizar os actos cometidos. Como se fosse normal.

Mas num mundo normal, uma figura como Paulo Gonçalves suspeito de vários crimes, seria material radioactivo para a entidade para quem trabalhava quando terá cometido os crimes de que é suspeito. Como o PÚBLICO revelou, ele continua a ser referenciado como secretário da SAD do Benfica e a participar em negócios que envolvem o clube. Num mundo normal, alguém como Luís Duque ligado a um clube como o Desportivo das Aves sobre o qual pairam tão graves indícios, dificilmente pensaria em ser candidato ao lugar da presidência do organismo organizador da prova máxima do futebol nacional. Mas ele admite a hipótese. E, certamente, num mundo normal, um clube com a importância do Benfica há muito que teria procurado afastar-se de todas as suspeitas sobre actuação dos seus dirigentes, que mancham a instituição e lançam fortes suspeitas sobre a verdade desportiva. Mas os casos, que se arrastam há tempo de mais, multiplicam-se.

O normal deste futebol é mau. É preciso repeti-lo. É preciso que não nos habituemos. O fora do normal tem de acontecer dentro do campo, graças à perícia dos jogadores, fora isso o futebol tem de se reger pelas mesmas regras do resto da sociedade. É preciso repeti-lo. O normal deste futebol é mau.

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