O carpe diem europeu de Merkel e Macron

Merkel e Macron souberam, em conjunto, fazer das exigências da crise uma oportunidade.

As falhas de concertação na resposta à crise sanitária por parte da União Europeia são sobejamente conhecidas e deixaram marcas. Muitas críticas recentes sublinharam-no de forma justa. Outras, nem tanto. Ignoraram o básico: o limite do poder dos organismos europeus na área da saúde, quando o essencial obedece ao que é definido e coordenado por cada Estado-membro internamente.

Foi já quando se entrou na discussão da resposta à crise económica e financeira que a temperatura aumentou uns graus com o denominado clube dos países forretas a demonstrarem as suas reticências ao apoio maior que não tivesse a forma de um empréstimo. Entrámos agora numa nova fase em que se torna essencial e decisivo observar como reagirá a Áustria, Dinamarca, Suécia e Holanda ao anúncio desta segunda-feira de Merkel e Macron que é todo o seu contrário, propondo subsidiar os países mais afetados e necessitados pela pandemia. É também destes países e de todos os 27 que depende a execução do proposto. Virar as costas a uma Alemanha que foi sempre encarada como a peça decisiva no caminho a percorrer é, antes de mais, fazer o mesmo ao projeto europeu.

Depois de uma proposta franco-alemã verdadeiramente ambiciosa e inédita que vai até aos 500 mil milhões de euros e a fundo perdido, não se pode esperar muito mais. À proposta de financiar o fundo de reestruturação com uma emissão de divida comum gerida pela Comissão Europeia, certamente que não faltarão críticas da direita reacionária. E à obrigação de todos os Estados-membros seguirem as políticas económicas equilibradas, não faltarão as críticas da esquerda reacionária. A ver vamos nos próximos dias. Em suma, o espaço maior entre estes dois extremos diz-nos que até pode haver almoços grátis, porque os tempos assim os pedem e recomendam. Não se pode é fechar os olhos às faturas e ainda bem que assim é.

Importante é não esquecer a necessidade de equilibrar na balança as exigências sobre o défice público para os países do Sul e o superavit excessivo que é praticado por alguns países do Norte. Talvez assim, e com a proposta franco-alemã, se possa começar a desenvolver um esboço de uma União no futuro que entenda a necessidade imperativa de uma voz comum na defesa, segurança e nas políticas comerciais.

Certo é que Merkel e Macron souberam hoje, em conjunto, fazer das exigências da crise uma oportunidade, que até isso permite vislumbrar.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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