PS abandona exigência de dois anos de residência a sefarditas

A exigência de dois anos de residência em Portugal para descendentes de judeus sefarditas portugueses foi contestada por socialistas e pelo CDS, partido que com o PS esteve na origem da lei.

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Constança Urbano de Sousa têm representado o PS nas alterações à lei da nacionalidade LUSA/MÁRIO CRUZ

O grupo parlamentar do PS abandonou a exigência de dois anos de residência em Portugal para atribuir nacionalidade portuguesa aos descendentes de judeus sefarditas, confirmou ao PÚBLICO a vice-presidente da bancada socialista Constança Urbano de Sousa.

De acordo com a nova proposta de alteração já entregue pelo PS no Parlamento e noticiada pelo Observador, a lei da nacionalidade determinará que o Estado reconhece como portugueses os descendentes de judeus sefarditas que façam “demonstração da tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa, com base em requisitos comprovados de ligação a Portugal, designadamente apelidos, idioma familiar, descendência directa ou colateral e que possuam efectiva ligação à comunidade nacional”.

A regra que entrará em vigor a 1 de Janeiro de 2022, se for aprovada pela Assembleia da República, é assim “igual à que existe para todos os netos de portugueses”, na mesma lei, explicou Constança Urbano de Sousa, justificando a alteração de posição do PS com o argumento de que “a mudança é para permitir que o legislador estabeleça critérios de ligação relevantes, pode ser residência, viagens a Portugal, domínio da língua”. A ideia é a de que os candidatos a atribuição de nacionalidade portuguesa demonstrem “uma efectiva ligação ao Portugal de hoje”, sublinhou a vice-presidente da bancada do PS.

A anterior proposta do PS, avançada pelo PÚBLICO, previa a concessão de nacionalidade aos “descendentes de jud

O intuito de apertar os critérios de atribuição de nacionalidade deve-se ao crescimento exponencial que estes pedidos têm tido. Em 2016 houve 5100 pedidos, em 2017 atingiram 7044, em 2018 entraram 13.872 e em 2019, chegaram aos 25.199.

A proposta anterior do PS foi contestada pelos ex-deputados e ex-dirigentes do PS José Vera Jardim, Manuel Alegre, Alberto Martins e Maria de Belém Roseira, numa carta aberta divulgada pelo PÚBLICO. Nesse documento, os históricos do PS afirmavam: “Não pode, pois, deixar de merecer a nossa pública e essencial discordância qualquer alteração desta lei no sentido de obrigar os requerentes a um período de residência mínima em Portugal, o que, na prática, corresponde a revogar a lei de 2013 e a alterar estruturalmente o seu alcance.”

A exigência de dois anos de residência foi também contestada pelo grupo parlamentar do CDS, cujo líder parlamentar, Telmo Correia, declarou ao PÚBLICO que ela vinha “destruir uma lei que atribuiu aos judeus sefarditas, à semelhança do que existe, por exemplo, para várias comunidades lusófonas e até em relação ao Brasil, a possibilidade de os seus descendentes adquirirem a nacionalidade portuguesa”.

Telmo Correia reivindicava a manutenção de um princípio de “fazer justiça histórica a uma comunidade de pessoas que eram portuguesas de origem e foram expulsas de Portugal em função das perseguições” nos séculos XV e XVI, que foi reconhecido por lei em 2013, elaborada pelo PS e pelo CDS.

Então, a lei não foi regulamentada, voltando a ser aprovada pelo Governo do PSD e do CDS em 2015, ano em que o mesmo princípio de concessão de nacionalidade a descendentes de sefarditas foi aprovado em Espanha. Continuando a não ser regulamentada, só o seria em 2017, pelo primeiro Governo socialista de António Costa.

eus sefarditas portugueses, através da demonstração da tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa, com base em requisitos objectivos comprovados de ligação a Portugal, designadamente apelidos, idioma familiar, descendência directa ou colateral e que tenham residido legalmente em Portugal pelo período de dois anos”.

“É pior”, diz Ribeiro e Castro

O ex-líder do CDS José Ribeiro e Castro declarou ao PÚBLICO que “esta solução é pior”, pois “retira uma proposta de dois anos para impor uma condição que pode significar exigência maior de residência”, e afirma: “Não faz sentido dar com uma mão e tirar com outra.”

Segundo Ribeiro e Castro, “o requisito da ligação efectiva à comunidade nacional foi introduzido recentemente noutros casos que não são de aquisição por efeito de vontade”, como tem de ser no caso dos descendentes de sefarditas. “Isso está no decreto-lei que regulamenta a lei da nacionalidade”, defende Ribeiro e Castro lembrando que aí “esse requisito está regulamentado em termos de exigência de um mínimo de três ou cinco anos de residência e também de prova de conhecimento do português, além de outras exigências”.

Daí que o ex-líder do CDS defenda que “o que deve ser feito é trabalhar com base no que já está na lei hoje” e que em relação aos sefarditas “exige ‘demonstração de tradição de pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa’ e ‘requisitos objectivos comprovados de ligação a Portugal’”. Ribeiro e Castro considera que há “na lei exigências suficientes que podem ser accionadas no quadro regulamentar para prevenir abusos que possam ocorrer e não fantasias ou fobias”.

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