MP mantém investigação de eventual crime na reabilitação do Bolhão no Porto

As obras de requalificação do Mercado do Bolhão, cujo término estava previsto para Maio de 2020, vão ser prolongadas por mais um ano.

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Nelson Garrido

Mais de três anos após a abertura do inquérito, o Ministério Público continua a investigar um eventual crime na reabilitação do Bolhão, no Porto, estando a contestada destruição das “barracas” consumada e em análise a demolição total das galerias.

Em resposta à Lusa, a Procuradoria-Geral da República (PGR) esclareceu que o inquérito encontra-se em investigação e sujeito a segredo de justiça, numa altura em que as obras de requalificação já avançaram no interior do edifício e estão concluídas no que diz respeito às intervenções no subsolo, matéria também alvo de queixa.

Em tramitação na Direcção Regional de Cultura do Norte (DRCN) está também o pedido de alteração ao projecto de requalificação do Mercado, que implica a demolição das galerias.

Em resposta à Lusa, na quarta-feira, a entidade que tutela o património refere que “só após análise e decisão de todas as entidades envolvidas será divulgada a decisão final”.

No dia 20 de Dezembro de 2019, a Câmara do Porto anunciou que as obras de requalificação do Mercado do Bolhão, cujo término estava previsto para Maio de 2020, vão ser prolongadas por mais um ano, devido à necessidade de alterar “o método construtivo”.

Em causa está a utilização de um método construtivo diferente na contenção e construção da cave, que implica a demolição e reconstrução total das galerias superiores, cujo estado de degradação, afirmava a autarquia, em Dezembro, “era, afinal bastante mais grave do que era possível apurar a partir dos estudos preliminares”.

Numa declaração lida, o presidente da autarquia, Rui Moreira, explicou que “caso as galerias se mantivessem intactas durante toda a obra, como estava inicialmente previsto, a abordagem que agora se propõe seria impossível. E a construção da cave ficaria comprometida, mais morosa e menos segura. Seria mais cara e demoraria mais tempo, atirando a conclusão do restauro para Dezembro de 2021”.

O Ministério Público (MP) está a investigar desde Agosto de 2016 “a existência de um eventual crime no processo de reabilitação” daquela estrutura, na sequência de uma queixa que o arquitecto Joaquim Massena, autor de um projecto de requalificação de 1998, apresentou no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto.

No entender do arquitecto havia, “pelo menos, duas questões relacionadas com o projecto e o processo do mercado que violam a Lei de Bases do Património Cultural”, nomeadamente a “anunciada demolição” das barracas do terrado do mercado e a intervenção no subsolo de desvio de uma linha de água que atravessa todo o imóvel.

Neste último caso, a empreitada já foi concluída “com sucesso”, adiantava a autarquia na ocasião em resposta enviada à Lusa, onde sublinhava ainda que a previsão do arquitecto de que “o Mercado do Bolhão iria ruir caso a obra fosse realizada” não veio a concretizar-se.

Também as barracas centrais do terrado do mercado terão sido demolidas, segundo o canal V Digital, que revelou, a 19 de Julho de 2018, imagens aéreas do local.

Em 2015, à data da revelação do novo projecto de requalificação do Mercado do Bolhão, houve até uma petição para salvar estas barracas. A iniciativa partiu de uma dupla de arquitectos portuenses que consideravam que a demolição do interior do Bolhão representava uma perda de “património enorme”.

O projecto de requalificação em curso, apresentado em Abril de 2015, prevê a “reinterpretação” das bancas de venda que lá existiam, como revelou o arquitecto responsável pelo projecto, Nuno Valentim, à data da sua apresentação, preservando a “memória visual” do Bolhão.

Para além disso, “o edifício será dotado de coberturas no piso inferior, acesso directo ao metro e cave técnica com acesso para cargas e descargas a partir da rua Alexandre Braga”.

Já o piso superior, com entrada pela rua Fernandes Tomás, vai manter a parte comercial e instalar restauração, transferindo todo o mercado de frescos para o piso inferior.

No ano passado, o arquitecto Joaquim Massena avançou, entretanto, com uma acção judicial contra a Câmara do Porto por quebra de contrato, pedindo uma indemnização por danos morais e patrimoniais.

A acção, que deu entrada no dia 14 de Maio no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, visa, segundo, um pedido de indemnização por danos morais e patrimoniais pelo facto de a autarquia não ter anulado o contrato estabelecido no âmbito do concurso público internacional para a requalificação do Mercado do Bolhão ao qual concorreu e venceu.

A empreitada de restauro e modernização do Mercado do Bolhão foi adjudicada ao agrupamento Alberto Couto Alves S.A. e Lúcio da Silva Azevedo & Filhos S.A por mais de 22 milhões de euros, tendo sido “consignada oficialmente” a 15 de Maio de 2018, prevendo-se um prazo de dois para a conclusão dos trabalhos.

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