Peritos defendem sistemas de vigilância mais robustos e reforço da saúde pública para vigiar a pandemia

Mensagem passada no webinar do Conselho Económico e Social. Ex-secretário de Estado da Saúde defendeu que esta pode ser uma oportunidade para o SNS definir melhor a complementaridade com os sectores privado e social.

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Paulo Pimenta

O presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública (ANMSP) defendeu que são precisos sistemas de vigilância mais robustos e eficazes e um reforço da saúde pública para responder à evolução da pandemia. Ex-secretário de Estado da Saúde Francisco Ramos defendeu que esta pode ser uma oportunidade para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) definir melhor a complementaridade com os sectores privado e social.

“É fundamental ter sistemas de informação que suportem a recolha e análise de dados. O que fazemos hoje tem repercussões daqui a dez dias. Houve dificuldades importantes no sistema de informação, tem sido notório na divulgação da informação, até dos próprios boletins, que é difícil corrigir a informação e apresentá-la de forma robusta”, afirmou Ricardo Mexia, presidente da ANMSP, no webinar organizado pelo Conselho Económico e Social, que se realizou esta quarta-feira.

Por isso deixou um alerta: “Precisamos de ferramentas mais robustas. Espero que fique a mensagem de repensar e montar sistemas para responder a situações deste género.” “Um desafio importante nas próximas semanas será a nossa capacidade de decidir na incerteza. Temos de tomar decisões o mais fundamentadas possível. Daí a importância de ferramentas ágeis que possam ser alicerçadas a factos”, defendeu o médico de saúde pública.

Ricardo Mexia afirmou ainda que “é fundamental ter recursos humanos de saúde pública”. “A saúde pública tem um papel importante na identificação, no isolamento e seguimento de casos. Com a retoma da actividade assistencial temos de pensar como vamos investir na saúde pública para fazer esse acompanhamento”, afirmou, defendendo a criação de “equipas rápidas” para intervir em locais de grande disseminação da covid-19 como lares ou hosteis.

O ex-secretário de Estado da Saúde Francisco Ramos disse que reforçar a saúde pública “é uma medida urgente face ao risco de novas vagas que possam surgir”. São recursos indispensáveis para termos uma resposta eficaz”, afirmou o também organizador do webinar dedicado ao Serviço Nacional de Saúde.

A directora da Escola Nacional de Saúde Pública, Carla Nunes, referiu que Portugal “está no bom caminho”, os números de novos casos “a descer”, mas ainda “com oscilações nos últimos 15 dias”. “Temos de ter indicadores muito sensíveis para apertar alguma medida porque o impacto do encerramento leva tempo a fazer efeito”, disse, lembrando que a cada medida se alteram padrões da doença.

Olhando para esta nova fase, Carla Nunes disse que “é preciso fazer a monitorização dos novos casos, dos óbitos, dos internados e recuperados para ver se o perfil destes grupos se está a alterar”. “Este é um indicador muito precoce”, acrescentando que na cenarização se simulam aumentos do índice de transmissibilidade (Rt), de mobilidade e se fazem comparações com outros países.

Relação público e privado

Olhando para os desafios, Francisco Ramos falou do facto de profissionais de saúde trabalharem ao mesmo tempo em unidades públicas e privadas. Para o antigo governante, esta é uma oportunidade de se fazerem recomendações às administrações hospitalares públicas para não se autorizarem acumulações e de uma eventual “alteração legal de excluir de financiamento público as entidades com profissionais de saúde em acumulação, apenas com excepções muito justificadas”.

O ex-secretário de Estado da Saúde afirmou que uma das lições que ficaram da pandemia é que “o SNS é a base do sistema”. E defendeu que é preciso “aumentar ou, no mínimo, não reduzir o investimento público”. Mas também “não ostracizar os sectores privado e social nesta altura em que todos são necessários”. Considerou que vale a pena aproveitar o momento “para acentuar a complementaridade que está definida na lei” entre os vários sectores e que o SNS “deve antecipar-se e definir qual o quadro operacional dessa complementaridade”.

“Há muitos aspectos a considerar. Terá de ser um trabalho feito ao longo do tempo com muita negociação”. Admitiu, como exemplo, o critério territorial. “Nos distritos onde a oferta pública é mais abundante, provavelmente, não há nenhuma boa razão para que aí haja financiamento público do sector privado. Mas, provavelmente, há outros territórios em que o sector público não foi ainda capaz de chegar de uma forma completa e, portanto, deveria ser proporcionado ao sector privado e social um quadro sustentável e garantido de substituição do sector público”, sugeriu.

Orador no encontro, Óscar Gaspar, presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, lembrou que as novas regras impostas pela pandemia criam condicionalismos no acelerar da retoma, logo por ser preciso maior intervalo entre actos médicos, testes e equipamentos de protecção individual. Um “novo normal” que trouxe “custos muito substanciais”.

“O Governo publicou uma proposta de programa de estabilidade na semana passada e constata-se que o SNS está a gastar, neste momento, qualquer coisa como 155 milhões de euros por mês com equipamentos de protecção individual. Ou seja, em Março e Abril ter-se-ão gasto 310 milhões de euros nestes equipamentos”, disse.

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