O fantasma da renacionalização da TAP a voar alto

Ainda nos lembramos do que era a TAP pública, com o seu cortejo de greves, a sua frota obsoleta, a sua dívida crónica e a sua legião de comissários políticos.

Entre a profecia e o poema, o primeiro-ministro prometeu na semana passada na Assembleia da República que, “haja o que houver”, a TAP “continuará a voar com as cores de Portugal”. Ninguém duvida que a transportadora é um activo crucial para o país. Poucos discutem a necessidade de haver por parte do Governo medidas que a salvem da crise, a exemplo aliás do que acontece noutros países europeus. O problema pode, porém, estar “no haja o que houver”. Ou, por outras palavras, na forma como o Estado vai salvar a companhia e nas contrapartidas que vai exigir. É neste domínio da discussão, completamente dominada pelos argumentos do Governo, que vale a pena reflectir.

A TAP passou a ser um patinho feio depois da polémica dos prémios para os seus gestores. A opinião pública lida mal com remunerações chorudas, e ainda mais numa empresa participada pelo Estado que registou anos seguidos de resultados líquidos negativos. A partir daqui, o argumento de que os accionistas privados vampirizam a companhia num prato servido pelos impostos dos portugueses tornou-se irresistível para a propaganda do Bloco e do PCP e para os ataques do ministro Pedro Nuno Santos. Um empréstimo garantido pelo Estado tornou-se impossível. E o fantasma de uma renacionalização, uma possibilidade. É aqui que está o perigo.

Qualquer cêntimo investido pelo Estado que no futuro não seja devolvido com juros pela empresa deve ser transformado em capital. Os impostos não servem para pagar luxos de David Neeleman e Humberto Pedrosa. Mas não chegámos ainda a esse ponto, pelo que pôr neste momento em causa a gestão privada da TAP ou a sua recomposição accionista é extemporâneo. Porque os resultados dos privados são positivos em termos de investimento, de criação de emprego, de volume de negócios ou de actividade operacional (rotas e passageiros). E porque nos lembramos do que era a TAP pública, com o seu cortejo de greves, a sua frota obsoleta, a sua dívida crónica e a sua legião de comissários políticos. É por isso bom que se reequilibrem os termos da discussão: o Estado não pode cair na cilada de salvar os privados; mas deve também afastar o mito de que um assalto ao controlo da TAP será bom para Portugal.

P.S. – No editorial de ontem escreveu-se que “um cidadão estrangeiro pode em teoria obter a nacionalidade por naturalização não percebendo uma palavra de português”. Não é isso que consta na proposta do PS. Nem o que se lia no texto da manchete de ontem. À bancada parlamentar do PS e aos leitores as nossas desculpas.

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