O que nos mostram os outros países sobre a reabertura das creches e escolas?

Em Portugal, as creches irão reabrir a partir da próxima segunda-feira, mas muitos são os países que já permitiram o regresso das crianças e jovens aos estabelecimentos de ensino.

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O regresso à escola na Suíça GIAN EHRENZELLER/EPA

As creches irão reabrir em Portugal, a vários tempos, a partir da próxima segunda-feira e, perante alguma incerteza sobre o papel das crianças na transmissão do novo coronavírus, há quem mostre algum receio em relação ao regresso dos mais novos aos estabelecimentos de ensino. Mas o que nos mostram os outros países que já reabriram as creches?

A Dinamarca foi o primeiro país europeu a promover faseadamente o regresso aos estabelecimentos de ensino — após um mês de confinamento devido à pandemia de covid-19 —, tendo começado pela reabertura das creches e escolas primárias em meados de Abril, estando a reabertura das escolas secundárias prevista para 18 de Maio. Ao permitir que centenas de crianças se voltassem a reunir nas escolas um pouco por todo o país, o governo dinamarquês deu um passo “arrojado”, que seria tomado como exemplo e analisado por vários líderes do mundo, escrevia o diário New York Times.

A reabertura dos níveis de ensino mais baixos, em primeiro lugar, na Dinamarca — que, de acordo com os dados divulgados pela Universidade Johns Hopkins, conta esta segunda-feira com mais de 10 mil casos confirmados de covid-19 e 533 mortes — deveu-se ao facto de as crianças mais pequenas serem as que alegadamente apresentam um menor risco de infecção pelo novo coronavírus e, ao mesmo tempo, serem as mais dependentes dos pais.

Regresso com regras apertadas

Mas o regresso a uma certa normalidade nas escolas dinamarquesas foi também acompanhado de uma série de regras: os pais não podem entrar na escola; os professores não se podem reunir nas habituais salas de convívio; cada criança tem direito à sua secretária e cada aluno deve estar a pelo menos dois metros de distância dos vizinhos. As turmas habituais foram reduzidas em duas ou três, cada qual com a sua sala e professor designado. Os alunos são obrigados a lavar as mãos pelo menos uma vez a cada hora e, durante o recreio, só podem brincar em grupos pequenos (que incluam apenas crianças da sua turma). O chão está marcado com as distâncias de segurança que os alunos devem respeitar e as superfícies, como os assentos das sanitas e as maçanetas das portas, são desinfectadas pelo menos duas vezes por dia, em linha com as directivas do governo dinamarquês. Além disso, os educadores devem privilegiar o ensino ao ar livre e as crianças estão proibidas de levar para a creche brinquedos de casa.

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A reabertura das escolas na Dinamarca Ritzau Scanpix/REUTERS

A Noruega, por sua vez, começou a reabrir as creches a 20 de Abril e, passado uma semana, foi a vez das escolas primárias, embora seja desaconselhado o regresso à escola das crianças de grupos de risco. À semelhança do que aconteceu na Dinamarca, o regresso às escolas na Noruega também se fez com regras apertadas, incluindo a desinfecção regular de superfícies, equipamentos e brinquedos, a lavagem frequente das mãos por parte das crianças e educadores, a preferência por actividades no exterior e a divisão das crianças em grupos mais pequenos. Além disso, nas creches norueguesas, não é permitida a entrada dos pais no edifício escolar, estando ainda definidos os horários de chegada e saída das crianças, destaca o Guardian.

A justificação apontada pelos governos e especialistas que defendem a reabertura das escolas é simples: o regresso aos estabelecimentos de ensino é essencial para garantir a reabertura da economia e para que os pais possam também eles próprios regressar ao trabalho. Além disso, há quem defenda que as crianças são menos susceptíveis a serem infectadas pelo novo coronavírus e a desenvolverem quadros graves da doença, não havendo ainda consenso científico sobre o seu papel na transmissão do vírus.

Alemanha dá prioridade aos mais velhos

Na Europa, precisamente devido à falta de consenso, as estratégias adoptadas pelos vários países para a reabertura das escolas são diversas. Na semana passada, contrariamente ao que aconteceu na Dinamarca e na Noruega, a Alemanha anunciou que iria começar a reabrir uma grande parte da sua economia, passando a permitir que os alunos mais velhos do ensino secundário fossem os primeiros a regressar à escola. A razão: além da preparação para os exames finais, as crianças mais velhas e jovens têm uma maior capacidade de cumprir regras relativamente ao uso de máscaras e ao distanciamento social.

As turmas foram reduzidas a metade e, nos corredores, apenas se pode circular num único sentido, de forma a minimizar o contacto entre as pessoas. Os intervalos são intercalados, os professores usam máscaras e as portas e janelas das salas mantêm-se abertas para que o ar possa circular, sendo que a prática de desporto em espaços interiores continua proibida. Além disso, segundo a BBC, as salas apenas podem ter dez pessoas no máximo, os alunos devem utilizar máscaras nas áreas comuns e as aulas presenciais são intercaladas com aulas online.

Na escola secundária de Neustrelitz, na Alemanha, foi ainda implementado um projecto-piloto que implica que os alunos realizem testes de autodiagnóstico à covid-19. Se o resultado for negativo, os estudantes podem circular sem máscara no recinto escolar. Os testes são grátis (tendo sido oferecidos por uma empresa de biotecnologia local) e realizados por professores e alunos duas vezes por semana, sendo que há quem defenda que a reabertura das escolas dever-se-á fazer acompanhar pela realização massiva de testes.

Porém, embora a Alemanha tenha conseguido manter os números de novos casos e mortes por covid-19 relativamente estáveis, o R0 — o número médio de contágios causados por cada pessoa infectada — aumentou, no sábado, para 1.13, nota o New York Times.

As autoridades alemãs esperam que este aumento tenha correspondido apenas a um episódio esporádico e que não tenha tido qualquer relação com o levantamento das medidas de restrição e o regresso das crianças à escola.

França reabre creches e escolas primárias

O Presidente francês, Emmanuel Macron, decidiu levantar algumas medidas de restrição depois de o número de novos casos de covid-19 e de pacientes internados em unidades de cuidados intensivos em França ter vindo a diminuir. Esta segunda-feira, França retomou as aulas presenciais do ensino pré-escolar e básico, sendo que, por enquanto, os alunos do ensino secundários permanecerão a ter aulas à distância.

O New York Times avança que o número de alunos por sala será limitado a dez, no caso das creches, e a 15 estudantes nas restantes escolas e que a ida à escola não será, desde já, obrigatória, podendo os pais manter os filhos em casa se o pretenderem. Não obstante, o ministro da Educação francês, Jean-Michel Blanquer, estima que 80 a 85% das 50.500 creches e escolas primárias francesas irão reabrir esta semana. Os alunos entre os 11 e os 15 anos das regiões francesas com menos casos de covid-19 deverão regressar às escolas a 18 de Maio, não havendo ainda uma data para a reabertura das escolas secundárias. Os professores e funcionários são obrigados a usar máscaras e os alunos devem manter o distanciamento social e lavar as mãos várias vezes ao dia, embora as crianças não necessitem de usar máscara.

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Educadores assinalam marcas no chão para garantir que as crianças respeitam o distanciamento social, em França ERIC GAILLARD/REUTERS

No entanto, alguns mayors franceses rejeitaram reabrir as escolas locais para já, enquanto outros limitaram o acesso às escolas a crianças filhos de trabalhadores de sectores essenciais, como filhos de polícias ou profissionais de saúde, ou de famílias carenciadas.

Escolas também reabriram na Holanda e Suíça

A emissora France 24 nota que as escolas primárias reabriram também parcialmente, esta segunda-feira, na Holanda e na Suíça (com turmas reduzidas). No caso holandês, as escolas apenas poderão ter, ao mesmo tempo, metade do número habitual de alunos, sendo que as crianças apenas têm aulas de manhã ou à tarde ou, noutros casos, poderão frequentar a escola em dias alternados, segundo a RFI.

Na Áustria, os alunos do 12.º ano regressaram à escola a 4 de Maio, seguindo-se um retorno gradual para os restantes alunos e, nas próximas semanas, retomar-se-ão ainda as aulas, para determinados anos escolares, na Finlândia e Grécia, enquanto Espanha e Itália já anunciaram que não irão reabrir as escolas pelo menos até Setembro. 

Na Bélgica, as creches reabriram a 4 de Maio e o regresso fez-se acompanhar de uma série de novas regras, sendo que cada sala pode ter no máximo dez crianças e deve ser sempre o mesmo pai/mãe a levar a criança à creche. Por sua vez, na Croácia, as creches e escolas para crianças entre os seis e dez anos também já reabriram, mas o regresso à escola é opcional, segundo a RFI, à semelhança do que aconteceu na Sérvia.

Medição da temperatura na China

Na China, por sua vez, várias escolas têm vindo a reabrir gradualmente ao longo das últimas semanas, com várias medidas de segurança que incluem a medição da temperatura antes de os alunos entrarem nas escolas, o uso obrigatório de máscaras e o distanciamento social. De acordo com o Guardian, os alunos das escolas de cinco distritos de Pequim começaram também, esta segunda-feira, a utilizar pulseiras que medem a temperatura corporal. Estes aparelhos recolhem dados em tempo real, que podem ser monitorizados pelas escolas e pelos pais através de uma aplicação. Se a temperatura de um estudante aumentar para mais de 37,2ºC, a pulseira emite um alerta.

Suécia: um caso de sucesso?

Por sua vez, a Suécia nunca chegou a encerrar as escolas, embora tenha implementado regras de higiene e distanciamento social. Christian Wejse, cientista do departamento de doenças infecciosas da Universidade de Aarhus (Dinamarca), diz à Reuters compreender as preocupações de alguns pais, depois de terem passado “um mês a tentar evitar o contacto”. Mas defende que, mesmo que se registem novos casos com a reabertura das escolas, tal não deverá ser problemático numa faixa etária em que “poucos ficam doentes” e, os poucos que ficam, não desenvolvem quadros graves da doença, afirmou, sublinhando que, tendo em conta o caso da Suécia, ao que tudo indica, as crianças não serão as principais transmissoras do vírus.

Os resultados são ainda preliminares, uma vez que os dados sobre o impacto da reabertura das escolas são recentes. No entanto, a reabertura das escolas nalguns países não tem mostrado ter, pelo menos por agora, um impacto muito negativo. Citado pelo New York TimesFlemming Konradsen, director da Escola de Saúde Global da Universidade de Copenhaga, destaca que a Dinamarca — depois de ter permitido o regresso das crianças mais pequenas às escolas há mais de três semanas — revelou, na semana passada, que o R0 no país permanece abaixo de 1.

As autoridades de saúde norueguesas também garantem, três semanas depois da sua reabertura, que o regresso às creches e escolas não levou a um aumento significativo do número de casos de covid-19 no país. “Até agora, não observamos que a abertura das creches e escolas tenha tido um efeito negativo na propagação da infecção”, afirmou esta segunda-feira Frode Forland, director do instituto norueguês de Saúde Pública, citado pelo site The Local. “Se a abertura tivesse tido um efeito negativo, teríamos começado a ver isso [um aumento progressivo] no número de infecções”, acrescentou.

Porém, Frode Forland destaca que pode ser ainda demasiado cedo para avaliar o impacto da abertura destes sectores na evolução da pandemia de covid-19 na Noruega. Segundo dados da Universidade Johns Hopkins, a Noruega contava esta terça-feira com 8132 casos confirmados e 224 mortes por covid-19.

Notícia actualizada a 12 de Maio com declarações das autoridades de saúde da Noruega

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