O colo e a maldita culpa

O toque, ou seja o colo, é a ferramenta mais poderosa que um pai ou mãe podem usar para ajudar a acalmar um bebé ou criança pequena.

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Muitas vezes, na consulta, ouço pais que admitem envergonhados que andam com os seus bebés ao colo, ou que os deixam ir para as suas camas, dormir a meio da noite porque, de facto, um pouco por todo o lado, inclusive entre os profissionais de saúde, ouvimos coisas como “os bebés têm de aprender a acalmarem-se sozinhos”, “não se deve dar colo a mais, porque depois eles habituam-se”, “devem ir dormir para o quarto deles o mais cedo possível” ou um milhão de outras coisas do género que, basicamente, transmitem a mensagem de que responder aos bebés de forma imediata e consistente é mau ou lhes vai fazer mal.

É muito importante desmistificar essa ideia e mostrar o quão cientificamente está tão errada. Os bebés não conseguem acalmar-se sozinhos! Quando nascem, o nervo vago ventral, que é responsável por ajudá-los a acalmarem-se, não se encontra ainda mielinizado (e, por isso, não está totalmente funcional até o fim da adolescência). Os bebés aprendem a regular-se através da co-regulação numa relação segura com o seu cuidador principal, normalmente os pais. O toque, ou seja o colo, é a ferramenta mais poderosa que um pai ou mãe podem usar para ajudar a acalmar um bebé ou criança pequena.

Muitas vezes vejo “consultores do sono” a anunciar os seus serviços apesar de não terem formação científica em áreas como psicologia clínica, de trauma, de apego ou de desenvolvimento infantil. A sua profissão não é regulamentada de forma alguma, e ainda assim é-lhes confiada imensa responsabilidade clínica! Os pais muitas vezes estão desesperados, em privação de sono, e esperam cuidados de saúde e não de conselhos prejudiciais à saúde do seu bebé.


For Babies Brain by Clementina é um parceiro do Pares do Ímpar. Os conteúdos publicados são da responsabilidade da autora. Pares do Ímpar é um projecto de parceria entre o PÚBLICO e criadores independentes de conteúdos em áreas especializadas, complementares ao alinhamento editorial do Ímpar.

Os pais merecem descanso, merecem apoio e também merecem informações precisas e clínicas de pessoas que têm formação, por exemplo, acerca do desenvolvimento do sistema nervoso, dos impactos das vivências traumáticas de infância e de desenvolvimento psicológico infantil.

Os bebés dependem dos seus pais para obterem respostas, independentemente da hora do dia, tanto no turno A (dia) como no turno B (noite). Mesmo que o bebé não tenha fome, não precise de mudar a fralda ou não esteja doente, tem uma infinidade de outras necessidades que requerem atenção e resposta de um adulto. O choro é a única forma de os bebés nos dizerem que precisam de conforto, de atenção e de colo.

As exigências constantes de um bebé mexem com muitas feridas da nossa infância, que podem ser activadas ou exacerbadas, por exemplo pela privação do sono. Na consulta do sono precisamos de entender todos esses factores para se conseguir ajudar toda a família.

(In)felizmente, um bebé não pode ser treinado a dormir, mas consegue aprender que chorar é inútil para pedir ajuda e deixa de o fazer. Isso pode desencadear uma resposta de “desligar/desconectar”, já que os bebés não têm possibilidade de desencadear uma resposta psicofisiológica (e de sobrevivência) de “luta ou fuga”. Qualquer pessoa que atende bebés deve ter pleno conhecimento destes factores.

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