Tempos de pandemia

O meu desejo, para a pós-pandemia, é que saibamos transformar as Assembleias em espaços em que possamos inscrever a frase - atribuída a um antigo presidente americano, citado de memória, “você entrou na casa de onde ninguém sai sem uma resposta””.

Escrevemos esta reflexão, em tempo de aparente retrocesso da pandemia que assolou a Europa, o país e as nossas vidas

Nos últimos trinta dias a frase “o mundo é um lugar perigoso” nunca fez tanto sentido! Tal como nunca pudemos perceber tão bem, tal frase, nos tempos das nossas vidas. Na verdade éramos, todos, incapazes de prever o que estamos a viver há quase quatro semanas. Mantemos a esperança de dias melhores em que acreditamos vir a ter a capacidade e o engenho de realizar, no exercício prático das nossas responsabilidades políticas, tudo o que pudermos ter aprendido nestes momentos, porque todos aprendemos. Uns mais do que outros, como é natural. Enquanto presidente de Assembleia Municipal apre(e)ndi, também, uma nova dimensão do cargo para que fui eleito.

Reforcei a ideia, creio que comum à generalidade dos meus colegas, de que somos, muitas vezes, uma espécie de Provedor dos Cidadãos munícipes. Uma última porta a que o cidadão bate na expectativa de que o seu problema - para cada um, compreensivelmente, é o maior problema do mundo - possa ser resolvido, acompanhado, encaminhado.
O meu desejo, para a pós-pandemia, é que saibamos transformar as Assembleias em espaços em que possamos inscrever a frase - atribuída a um antigo presidente americano, citado de memória, “você entrou na casa de onde ninguém sai sem uma resposta””! Já o fazíamos assim, aliás, muitas vezes! E por vários meios - utilizando o email e as novas tecnologias - em quase todos os municípios.

Longe vai o tempo em que era só no espaço público, no café, na rua que éramos interpelados pelos cidadãos. Já há algum tempo que, para além da interacção pessoal que diariamente fazíamos com os nossos cidadãos - eles chama(va)m a nossa atenção para os mais variados problemas, ou situações concretas que os preocupam; são dezenas de emails, a solicitar a nossa mediação, julgando os cidadãos munícipes, em alguns deles, que era só a sua questão a mais importante que tínhamos para responder - como devemos encaminhar para as soluções que o critério do executivo municipal vier a escolher!

Nos tempos que correm esse contacto virtual, também ele explodiu, por imperativo da nova sociedade em rede!

Gostava de partilhar que, nesse papel central de representante de todos os cidadãos do município, ganha relevância a parceria de excelência, entre a Assembleia Municipal e a câmara municipal, dando sentido ao todos iguais todos diferentes! Na verdade, cumprindo ambos o sagrado objectivo de representar e de servir quotidianamente o município, tivemos muitas surpresas agradáveis e pedagógicas que importa registar!

Muitas vezes o que parecia ser um problema irresolúvel deixou de o ser quando o interlocutor passava a ser o adequado, seja pela mediação seja pela arbitragem dos presidentes em sintonia de princípios e fins. Na verdade, várias vezes, quando havia queixa de serviços, a causa prendia-se com a dificuldade de compreender as mútuas idiossincrasias entre as pessoas envolvidas. Outras vezes, poucas, mas é preciso dizê-lo, o problema tinha mais a ver com o proverbial desejo de se ser todo-poderoso - algo felizmente em regressão - nas pequenas parcelas de decisão administrativa que integram os municípios. Também essas se ultrapassam na permanente, discreta, mas efectiva ligação entre os dois órgãos - deliberativo e executivo - dos municípios.

Este papel do presidente das Assembleias Municipais, bem como de todos os seus eleitos, é cada vez mais visível, é cada vez mais exigido pelos cidadãos e é cada vez mais exigente. É esse, temo-lo constatado por todo o país, nas reuniões a que chamamos ANAM em DIÁLOGO, o esforço de valorização que todos estamos a fazer no exercício quotidiano do Poder Local da parte dos presidentes das Assembleias.

Neste momento sabemos que o Poder Local integra também as nossas instituições, todas sem excepção, pois que a rede que apoiamos e ajudamos a desenvolver em cada município é a que está sempre na linha da frente para alargar o potencial de eficácia das políticas públicas.

Como esclareceu e lembrou o presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, é agora que nos é pedido este esforço de dizer Presente! Estaremos presentes em todos os munícipes perante todos os cidadãos! Estar presente, estar atento, estar solidário, estar disponível, é muitas vezes uma missão que passa pela máxima discrição, passa por não estarmos na fotografia, no palco. Espaço que pertence, por legitimidade democrática, ao poder executivo! É, também, estarmos onde estamos - confinados aos nossos lares - nem sempre onde seríamos úteis presencialmente, mas presentes quando somos precisos - a ouvir, a indicar caminhos, ou a apoiar na solução das solicitações que nos chegam, das mais variadas índoles! Mais do que nunca, se calhar como sempre, mas com outra forma de o expressar, uma total solidariedade e apoio ao executivo municipais e aos presidentes de câmara.

Sairemos todos, como teremos e devemos sair: mesmo todos! Deste inesperado combate, ou sairemos mais fortes, resilientes, conscientes do nosso papel na nossa sociedade, no nosso concelho, no nosso país, ou sairemos ainda mais pobres, porque o egoísmo, como alertou o Papa Francisco, não nos salvará! É um imperativo ter Assembleias Municipais valorizadas que discutam e avaliem a disponibilidade e o estado dos equipamentos municipais que, em tempo e de forma adequada, saibam validar as melhores escolhas de políticas públicas concelhias, em especial na Saúde, nomeadamente aproveitando para esse fim a trégua nos limites de endividamento municipal, incluindo também as indispensáveis melhorias das redes sociais. Assembleias temáticas, com debates abertos aos sectores sociais, económicos e culturais que estimulem a participação cívica permanente e que intervenham no dia-a-dia do Município, serão cada vez mais necessárias. Quando fazemos a discussão e preparamos as decisões de caráter mais geral, não estamos a meter a foice em seara alheia. Esta seara é de todos! Todos temos de plantar bem para colher de acordo com essa plantação. Era o que estávamos a preparar em todas as dimensões possíveis e com recurso aos meios mais adequados para este ano de 2020. Continuaremos a preparar esse avanço, com trabalho no recato dos nossos lares, escutando activamente todos os nossos colegas de todos os municípios. E, quando for possível e necessário, diremos, mais uma vez, estamos presentes, activos e, bem assim, criativos!

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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