Big Brother e a homofobia em canal aberto

A TVI escolheu mediatizar a presença de uma pessoa abertamente homofóbica no Big Brother. A homofobia e a violência contra pessoas LGBTI+ deve passar à história e não ser o mote para programas de estações televisivas que emitem em sinal aberto e que têm obrigações acrescidas de serviço público.

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ADRIANO MIRANDA/ADRIANO MIRANDA

Com a pandemia causada pela covid-19, todas e todos nós fomos obrigados a reorganizar as nossas prioridades e o nosso quotidiano. Pelos vistos, a prioridade da TVI foi lançar o tão aclamado reality show Big Brother.

Mesmo vivendo em tempos de pandemia, o canal decidiu manter o seu programa televisivo, assim como o arrendamento do hotel e do casarão na Ericeira, e gastar 54 testes ao novo coronavírus com os seus 18 concorrentes.

Sejamos realistas, em tempos tão estranhos como este em que vivemos, teria a TVI tanta necessidade de lançar um programa televisivo que envolvesse o desperdício de testes que poderiam ser utilizados em casos urgentes? Tudo isto não passa de uma desesperada tentativa de ganhar a grande guerra das audiências, com o acréscimo de um plot twist como uma das razões para assistir ao programa: a presença de concorrentes assumidamente homossexuais e outro declaradamente homofóbico.

No passado domingo, dia 26 de Abril, foi apresentada aos telespectadores portugueses uma espécie de “experiência social em directo’’ que consiste em ver como se comportariam estes concorrentes quando se encontrassem juntos na mesma casa. Ora, não é de estranhar que a Televisão Independente fosse servir de palco a polémicas. A estação televisiva tem já um historial de servir de palco a personalidades de extrema-direita (quem não se lembra da presença do mais conhecido nazi português no programa do Goucha?). Escolher mediatizar a presença de uma pessoa abertamente homofóbica num reality show e servir de plataforma à violência gratuita em canal aberto parece apenas ser mais um passo na mesma direcção.

Em 2018, a Associação ILGA Portugal (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero) recebeu um total de 186 queixas por discriminação, das quais 59 constituíam denúncias de crimes contra pessoas LGBTI+ (dados provenientes do Observatório da Discriminação contra as Pessoas LGBTI+ correspondentes ao ano de 2018). A estes dados, acresce um  elevado número de ameaças de cariz homofóbico e de crimes de violência não reportados.

‘’Sou um bocadinho homofóbico’’ foi a descrição que o novo concorrente deste ‘’circo’’ fez de si próprio. A isto, junta comentários como “até há uns anos, os homossexuais não estavam tão presentes na nossa sociedade’’ e ‘’hoje em dia são mais comuns’’, terminando a sua afirmação justificando que lhe é estranho ver demonstrações públicas de afecto por parte de casais homossexuais.

Com isto podemos perceber que a TVI nada mudou até agora, continuando a arranjar novas formas de disputar audiências seja de que maneira for. A comunidade LGBTI+ não é um instrumento para ganhar audiências. Permitir que este tipo de programas televisivos contenham concorrentes com posições como esta contribui de forma directa para a normalização da homofobia.

O medo que todos os dias é sentido na pele por quem não se sente seguro ao andar na rua de mãos dadas com o seu parceiro não pode ser apresentado ao público como uma forma de entretenimento. A homofobia e a violência contra pessoas LGBTI+ deve passar à história e não ser o mote para programas de estações televisivas que emitem em sinal aberto e que, por isso, têm obrigações acrescidas de serviço público.

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